Márcio Pochmann: "Essas empresas, na verdade, o tema sob o qual elas estão inseridas, não nos permite avaliar apenas e tão somente pela ótica empresarial" (Elza Fiúza/ABr/Agência Brasil)
Reuters
Publicado em 24 de julho de 2018 às 16h06.
Última atualização em 24 de julho de 2018 às 18h20.
São Paulo - O recente acordo entre Embraer e Boeing e eventuais vendas de ativos da Eletrobras e da Petrobras que saírem do papel serão revistos num governo do PT a partir de 2019 por questões estratégicas, ao mesmo tempo que um fundo com parte das reservas internacionais será montado para financiamento de projetos de infraestrutura.
As informações foram dadas à Reuters por um dos coordenadores da campanha de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à Presidência, o economista Márcio Pochmann, que definiu o acordo atual entre as duas gigantes da aviação como "inviável".
"O acordo com a Boeing significa o desaparecimento da Embraer, não tem garantia alguma que ela vai ficar no Brasil, pelo contrário, e toda a tecnologia militar tende a desaparecer", afirmou o economista em entrevista, no final da tarde de segunda-feira.
No início do mês, Embraer e Boeing anunciaram um acordo prévio sob o qual a norte-americana vai assumir o controle da divisão de aviação comercial da empresa brasileira por meio da criação de uma joint-venture de 4,75 bilhões de dólares. A nova empresa visa fazer frente à parceria da Airbus com a Bombardier.
Ao comentar a intenção do governo do presidente Michel Temer de privatizar a Eletrobras, Pochmann fez a avaliação de que a complexidade do sistema elétrico nacional e a importância das estatais para investimentos públicos exigem que não sejam tratadas "como uma empresa como qualquer outra".
O governo Temer pretende vender seis distribuidoras da Eletrobras neste ano, sendo que o leilão da Cepisa está marcado para quinta-feira.
"Essas empresas, na verdade, o tema sob o qual elas estão inseridas, não nos permite avaliar apenas e tão somente pela ótica empresarial."
O primeiro ano de eventual terceiro mandato de Lula --que lidera as pesquisas de intenção de voto para a Presidência, mas deve ser declarado inelegível de acordo com a Lei da Ficha Limpa-- também seria marcado pela criação de um fundo de investimentos, composto por cerca de 10 por cento das reservas internacionais, contribuição de bancos públicos e debêntures, para financiamento de projetos de infraestrutura e retomada do crescimento.
Com o nível atual das reservas, na casa de 380 bilhões de dólares, o fundo teria inicialmente cerca de 38 bilhões de dólares, ou 140 bilhões de reais.
"A ideia é que tenha um fundo de investimento que esteja imune às regras fiscais, porque é investimento e não é gasto e nem custeio", disse Pochmann.
Sem dar muitos detalhes, o economista assinalou que o fundo seria criado por uma composição entre bancos públicos e debêntures de empresas". "É uma engenharia para gerar um grande fundo para a retomada do investimento."
Ele reiterou ainda os planos de uma reforma tributária progressiva e de tributar os bancos que não diminuírem o spread bancário, como disse à Reuters o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad, outro coordenador da campanha petista.
O PT, que governou o país entre 2003 e 2016, tem afirmado que insistirá na candidatura de Lula, preso há mais de 100 dias em Curitiba cumprindo pena por corrupção e lavagem de dinheiro, e Pochmann disse que, caso Lula não possa ser candidato, seu substituto será um petista e um "preposto" do ex-presidente.
Com Lula, ou com um outro nome petista, Pochmann afirma que o PT aprendeu com seus "erros e acertos" no poder, que o partido está "mais maduro" e se tornou um "PT 3.0".
O economista argumentou ser "mais mito que verdade" a irresponsabilidade fiscal associada pelos mercados financeiros a um eventual governo Lula, lembrando dos resultados fiscais obtidos na gestão do ex-presidente.
Indagado se a política econômica de um novo mandato presidencial seria mais próxima à adotada por Lula ou por sua sucessora Dilma Rousseff, Pochmann disse que "foram mandatos que responderam à realidade ali encontrada" e que o objetivo agora é "mudar radicalmente o sistema produtivo e de consumo no Brasil", em busca de maior sustentabilidade ambiental.
Contrário ao teto dos gastos públicos, que limita a expansão das despesas da União à variação da inflação no ano anterior e uma das medidas mais comemoradas pelo atual governo, o PT defende a convocação de uma Constituinte para revogar a emenda constitucional que criou a restrição, mas não gastaria o capital político do primeiro ano de gestão petista com a questão.
Isso exigirá uma negociação com o Congresso, já que o teto poderia ser descumprido no início do mandato.
"De fato há restrição do gasto, se não for modificado criará constrangimentos e problemas de natureza jurídica", afirmou Pochmann.
"Seja quem for o governo, uma iniciativa dessa natureza vai se apresentar... temos que ter um pacote de negociação do que o governo quer fazer. No início, o presidente tem muita força."
Pochmann defendeu ainda que o Banco Central deve perseguir, ao mesmo tempo, uma meta de inflação e outra de desemprego, mas ressaltou que ainda não há decisão sobre isso no âmbito da campanha petista.
(Com reportagem adicional de Christian Plumb)