Economia

A periferia da Europa na pior

A União Europeia e o FMI prometeram ajudar no resgate da Grécia - mas os problemas que afligem o continente são muito mais profundos

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Da Redação

Publicado em 10 de outubro de 2010 às 04h10.

Nas primeiras horas depois do anúncio da promessa de ajuda da União Europeia para a Grécia, fechado no domingo 11 de abril, muitos respiraram aliviados. A vaquinha de 30 bilhões de euros (cerca de 40 bilhões de dólares), mais a promessa de outros 10 bilhões de euros à disposição no Fundo Monetário Internacional, trouxe uma aguardada sensação de conforto na segunda-feira, quando os mercados voltaram a operar. Mas, tão rapidamente quanto surgiram, os sinais positivos começaram a se dissipar. O dinheiro está apalavrado, mas a princípio os gregos querem buscar financiamento privado. Caso seja preciso recorrer a esse fundo, vai ser necessário obter aprovação parlamentar para que aconteça o desembolso. A expectativa é que, ainda que com choradeira, a ajuda seja aprovada. Mas a percepção generalizada no continente é que a operação de resgate costurada pelos integrantes da UE é apenas um primeiro passo em uma longa caminhada para consertar o estrago causado pelo endividamento do grupo de países conhecido pela sigla Piigs, por causa de suas iniciais em inglês (e pela conotação pejorativa, que remete a porcos, é claro). Portugal, Itália, Irlanda, Grécia e Espanha sofrem com grandes desequilíbrios em suas contas públicas, com diferentes graus de periculosidade. O que preocupa os europeus - e o resto do mundo - é um efeito dominó. Uma quebra de confiança em qualquer um dos países pode ter consequências desastrosas para o futuro da moeda única europeia e para a economia mundial.

A situação mais delicada é a da Grécia. O país tem uma conta de 8,2 bilhões de euros para pagar no próximo dia 20 e outra, de 8,7 bilhões, com vencimento em 19 de maio. Os gregos devem conseguir reunir os recursos de que precisam com investidores privados. Apesar do interesse demonstrado pelos papéis, as taxas de juro exigidas, de acordo com as primeiras indicações, não serão nada atraentes. Ou seja: mesmo com a rede de segurança conjunta oferecida pela UE e pelo FMI, os investidores não estão lá muito confiantes nas promessas de arrumação da casa oferecidas pelo governo de centro-esquerda de George Papandreou. Se as tentativas de rolar a dívida com bancos americanos e asiáticos não derem certo, ou se as taxas de juro forem altas demais, não vai restar à Grécia alternativa senão usar o dinheiro dos vizinhos. O custo do dinheiro não é o único problema grego. O país corre sério risco de enfrentar uma recessão, o que complicaria ainda mais as perspectivas de arrecadação do governo. A possibilidade de a Grécia entrar nessa espiral negativa - recessão, baixa arrecadação e possivelmente deflação - ainda enche de terror os mercados mundiais.


Nas últimas semanas, ganhou força a tese de que Portugal estaria rapidamente se transformando numa nova Grécia. No final de março, a agência de classificação de risco Fitch rebaixou a nota dos títulos da dívida do país. A Moody's também colocou Portugal numa perspectiva negativa, o que indica um possível rebaixamento a caminho. "Os portugueses não têm um programa ambicioso para reequilibrar suas contas em 2010", diz Kristin Lindow, analista da Moody's, em Nova York. O país enfrenta a falta de competitividade, resultado do excesso de burocracia, da baixa escolaridade e de uma legislação trabalhista complexa (problemas que o Brasil herdou e ainda conseguiu ampliar). Os portugueses até inventaram o seu PEC, Programa de Estabilidade e Crescimento, que prevê uma redução do déficit orçamentário a 2,8% do PIB para 2013. A questão é que reequilibrar as contas públicas num ambiente econômico sem dinamismo é uma tarefa bem complicada - e tende a encolher ainda mais a atividade econômica. Nos últimos anos, Portugal alternou PIBs negativos com crescimentos inferiores a 2%. A expectativa para 2010 é de crescimento de 0,3%, seguido de 1% para 2011.

A Itália enfrenta problemas parecidos. A porção norte do país, mais rica e industrializada, continua financiando o sul, onde a taxa de desemprego é o dobro da do resto do país. Quase um terço dos jovens do sul da Itália está desempregado, o que cria novas distorções para a economia (leia na pág. 132). Mas, depois da Grécia, quem enfrenta a situação mais dramática no momento é a Espanha, país que até pouco tempo atrás era saudado como um dos maiores casos de sucesso do bloco. Em 2009, a economia espanhola encolheu 3,6%. As projeções indicam uma nova queda de 0,8% do PIB, enquanto países como Alemanha e França já apontam algum crescimento. A taxa de desemprego, de 20%, é a mais alta de toda a Europa. O estouro da bolha imobiliária, setor que embalou por anos a economia espanhola, vem cobrando seu preço. As execuções hipotecárias já somam 180 000 desde o começo de 2010 - no ano passado todo foram 114 000. E a tendência é que esses números ainda cresçam muito. "Todo esse crescimento recente foi fictício. Ele não estava baseado na demanda real", diz o economista Rolf Campos, professor da escola de negócios Iese, em Madri. Do consumo desenfreado, os espanhóis passaram para um estado de letargia. Para reverter o humor dos consumidores (e fazê-los voltar a gastar), as câmaras de comércio de várias cidades se juntaram a grandes empresas espanholas, como a Telefónica, o banco Santander e o varejista El Corte Inglés, para criar a Fundação Confiança - que patrocinou uma campanha publicitária com o seguinte tema: "Só a gente pode consertar isso".


Os primos ricos da UE que o digam. Embora todos estejam dispostos a arcar com parte do plano de emergência, existe o consenso de que as operações de salvamento não podem se repetir, sob o risco de estimular ainda mais a irresponsabilidade fiscal. Os países enforcados, por sua vez, dizem que não podem ser culpados por tudo. Eles apontam a entrada dos países do Leste Europeu na UE como um dos motivos para a piora de sua economia. Nações como Polônia, Hungria e Bulgária absorveram indústrias e empregos dos Piigs. As economias grandes também são alvo de crítica. Alemães e finlandeses, por exemplo, há muito exportam mais do que importam. Sem a demanda desses países, e sem condições de desvalorizar a moeda para ganhar competitividade no exterior, fica difícil inverter a situação. A solução não vai ser simples nem indolor - tampouco pode esperar. O mundo está de olho nos Piigs.

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