Economia

Para Banco Central, austeridade já ajuda na inflação

Presidente do BC admite, porém, que as medidas recentes anunciadas pela equipe econômica devem elevar ainda mais a inflação no curto prazo.


	Alexandre Tombini, presidente do Banco Central, em conferência em Davos, na Suíça
 (Denis Balibouse/Reuters)

Alexandre Tombini, presidente do Banco Central, em conferência em Davos, na Suíça (Denis Balibouse/Reuters)

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Da Redação

Publicado em 24 de janeiro de 2015 às 12h36.

Davos - A política fiscal mais rigorosa ajudará o Banco Central no esforço de levar a inflação de volta à meta. A afirmação foi feita na sexta-feira, 23, pelo presidente do BC, Alexandre Tombini.

Ao ressaltar a complementaridade das políticas monetária e fiscal, ele admite que as medidas recentes anunciadas pela equipe econômica devem elevar ainda mais a inflação no curto prazo. O rigor fiscal, porém, tira um peso das costas do BC ao colaborar com o trabalho de estabilidade de preços em horizonte mais amplo.

"As políticas fiscal e monetária são independentes, mas elas têm complementaridade. Naturalmente, uma política fiscal consistente implementada de maneira rigorosa acaba por ajudar no processo de convergência da inflação para a meta", disse durante entrevista no Fórum Econômico Mundial em Davos, na Suíça.

Após meses de direções opostas das políticas fiscal (expansionista) e monetária (restritiva), o discurso sinaliza que a chegada de Joaquim Levy ao Ministério da Fazenda deverá aliviar a carga de trabalho do BC no esforço de conter a inflação.

Dias após aumentar o juro para 12,25%, Tombini ficou longe de comentar qualquer influência do "efeito Levy" na taxa Selic, mas destacou positivamente a queda das previsões de mercado para a inflação de médio e longo prazos. "Temos visto algum impacto na expectativa de inflação de médio prazo com leve recuo para 2016, 2017, 2018 e 2019. Esse recuo não víamos há muito tempo", disse Tombini.

As séries históricas da pesquisa Focus mostram que o recuo mais significativo nas previsões para a mediana do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ocorre no cenário para 2018. A mediana para a inflação do último ano do governo Dilma caiu de 5,5% em 8 de janeiro para 5,2% oito dias depois, em 16 de janeiro. Para 2019, a aposta dos analistas caiu de 5,06% em 9 de janeiro para 5%.

As quedas, porém, pararam por aí. As expectativas de 2017 não caíram ainda, e estão no pico de 5,5% desde maio de 2014. As expectativas de 2016 também estão praticamente estáveis. Eram de 5,56% no início de novembro, subiram para 5,7% e continuaram nesse nível, com exceção de dois dias, 9 e 10 de dezembro, quando tiveram uma pequena alta, para 5,75%.

Petróleo

Tombini também disse que a queda do preço do petróleo vai provocar impacto positivo no curto prazo. "O Brasil será importador líquido do combustível até 2018. Portanto, no curto prazo, os preços têm impacto positivo na balança comercial", disse Tombini. Após "cálculo rápido", ele disse que "o Brasil teria uma economia de até US$ 12 bilhões no ano".

Nos seus compromissos em Davos, uma das principais mensagens de Tombini tem sido a de que a maioria dos países da América Latina está bem mais preparada hoje para um novo ciclo de elevação de juros nos Estados Unidos - que se combina com uma queda do preço de commodities e cria pressões de desvalorização cambial - do que esteve em eventos similares no passado. O presidente do BC tratou do tema em almoço do Fórum ontem sobre as perspectivas da América Latina, e voltou ao assunto em entrevista à imprensa.

"As perspectivas para a América Latina este ano são desafiadoras, mas eu me mantenho cautelosamente otimista", disse Tombini. Segundo ele, boa parte dos países latino-americanos exibe hoje arcabouços de política econômica mais sólidos, indicadores fiscais preservados, câmbio flutuante para absorver choques e reservas para evitar volatilidade excessiva nos movimentos cambiais.

"Ajustes antes de ser atingido por uma turbulência não são um comportamento típico da América Latina - desta vez as autoridades estão muito conscientes e isso é muito louvável, elas estão se antecipando, tomando medidas antes do evento", analisou Tombini. Para ele, o baixo crescimento atual da região se deve em parte ao processo de ajuste em economias-chave, como a brasileira.

Tombini considera que a economia global tende a se beneficiar de maior previsibilidade à medida que decisões cruciais em economias centrais sejam tomadas, aliviando as ansiedades que a expectativa produz. Ele citou o anúncio do programa de afrouxamento quantitativo na zona do euro como um evento desse tipo, e o próximo será o início da elevação da taxa básica de juros americana.

O presidente do Banco Central comentou que não só México, América Central e Caribe se beneficiam com a retomada dos Estados Unidos, mas também a América do Sul, da qual a maior economia do mundo é uma tradicional parceira comercial e de investimentos. Ele notou ainda que a queda das commodities afeta menos as commodities agrícolas, que ainda têm perspectiva de preços acima da média histórica.

"No Brasil, estamos fazendo a nossa parte de forma muito resoluta desta vez; combinando flexibilidade, qualidade do arcabouço de política econômica e determinação das autoridades, países latino-americanos como o Brasil podem tirar vantagens (do processo de ajuste) e esperar crescimento maior e mais sustentável a partir de 2016", resumiu o presidente do Banco Central.

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Tanto Tombini quanto Levy passaram os últimos dias em Davos tentando vender a imagem de uma nova política econômica a empresários no Fórum Econômico Mundial.

Nenhum dos dois criticou a política seguida nos últimos anos, mas ambos falaram sobre o esforço de arrumação da casa, disse um dos participantes do encontro de ontem à tarde. Tanto as reuniões bilaterais quanto as conversas com grupos foram fechadas à imprensa.

Um empresário estrangeiro, contou o mesmo participante, perguntou ao ministro da Fazenda se ele estava certo do apoio da presidente Dilma Rousseff ao ajuste das contas públicas. O ministro, segundo o informante, contornou o assunto e evitou responder.

A discussão passou tanto por assuntos de conjuntura - como as oscilações do real em relação ao dólar - quanto por questões estruturais - como o sistema tributário. Um dos investidores mostrou-se preocupado com as regras variáveis do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), o principal tributo estadual. Esse detalhe foi mencionado pelo próprio ministro, ao sair da reunião.

Empresários mostraram familiaridade com os problemas da economia brasileira e com os desafios da política econômica. Os expositores, segundo a mesma fonte, procuraram ser claros quanto aos objetivos das políticas fiscal e monetária.

Contas externas

A reunião com os empresários coincidiu com a divulgação, no Brasil, do resultado final das contas externas do ano passado. O déficit em conta corrente, US$ 90,95 bilhões, correspondeu a 4,19% do Produto Interno Bruto (PIB) estimado.

O investimento estrangeiro direto, US$ 62,49 bilhões, foi mais uma vez insuficiente para cobrir o déficit em transações correntes e, além disso, foi inferior ao projetado pelo BC (US$ 63 bilhões). A diferença foi fechada com financiamentos de outros tipos, menos produtivos e mais sujeitos a movimentos especulativos.

Os empresários provavelmente ainda ignoravam esses dados. Mas esses números podem ter sido um incentivo a mais para a caça ao investidor estrangeiro. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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