VAREJO: setor projeta um movimento menor para o Natal deste ano, tanto nas vendas quanto na contratação de temporários / Alexandre Battibugli (Alexandre Battibugli/Exame)
Da Redação
Publicado em 21 de outubro de 2016 às 12h57.
Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h04.
Thais Folego
Após dez trimestres consecutivos de recessão, o quarto trimestre deste ano deve marcar o começo da saída da economia brasileira do fundo do poço. Economistas esperam que o PIB dos últimos meses do ano mostre estabilidade ou um pequeno crescimento. Mas o caminho rumo à luz promete ser longo, pois a velocidade e robustez da recuperação dependem muito da política — um componente sempre imponderável.
“Estamos flertando com o fundo do poço. Alguns setores mostram algum sinal de recuperação e outros ainda estão no negativo, caso da indústria automotiva, em que a queda ainda não estancou”, diz Bruno Rezende, economista da 4E Consultoria. Ele observa que o país tem limitações de crescimento no curto prazo: do lado do investimento, a indústria tem uma grande capacidade ociosa para ser usada antes de expandir a produção; o setor público está sem capacidade de investimento, ainda no início de um ajuste fiscal; e do lado do consumo das famílias, o desemprego e a alta taxa de juros barram os gastos. “Na margem, o quarto trimestre deve ser melhor do que o anterior. Mas o processo de recuperação é muito frágil e sujeito a solavancos.”
O Monitor do PIB, indicador mensal de atividade estimado pela Fundação Getulio Vargas (FGV), com informações até agosto deste ano, mostrou retração de 0,35% no trimestre móvel de junho a agosto, em comparação ao trimestre de março a maio, a melhor taxa em seis trimestres consecutivos. “Apesar desta melhora na taxa trimestral, a taxa mensal de agosto (-1,61%) indica cautela quanto a velocidade de recuperação da atividade econômica”, afirma Claudio Considera, coordenador do Monitor do PIB.
Grande parte dos economistas estima um avanço entre 0,3% e 0,5% do PIB do quarto trimestre, em relação ao trimestre anterior. O Instituto Brasileiro de Economia, da FGV, avalia que a economia está com a recuperação em marcha, mas tem uma posição divergente da maioria dos analistas de mercado quanto à sua velocidade. Por isso, ainda projeta uma retração de 0,3% do PIB no último trimestre e avanço de 0,3% apenas no primeiro trimestre do ano que vem. “Os últimos resultados de serviços e de indústria ajudaram a esfriar um pouco as expectativas de recuperação já no quarto trimestre”, diz Mauro Rochlin, professor de economia da FGV.
O IBGE) divulgou nesta semana que o volume de serviços prestados em agosto caiu 1,6% em relação a julho, o pior resultado para o mês da série histórica do indicador, que começou em 2012. O forte recuo da indústria em agosto, de 3,8%, explica em parte o resultado de serviços. O principal afetado foi o transporte terrestre, pois reduz o volume de produção a ser escoado. Com base nesses dados, Roberto Saldanha, analista do IBGE, avaliou que os sinais de estabilidade ainda não estão muito claros.
Papai Noel magro
O último trimestre do ano costuma ser sazonalmente mais forte, devido à injeção de recursos na economia com o pagamento do 13º salário e de 1/3 de férias. Mas o comércio já projeta um movimento menor para o Natal deste ano, tanto nas vendas quanto na contratação de temporários. A Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo prevê um recuo de 3,5% nas vendas do varejo no Natal, após já ter caído 5% no ano passado. Isso deverá frear a demanda por trabalhadores temporários, com menos 2,4% de postos ofertados em relação a 2015.
O varejo é muito impactado pela disponibilidade de renda das famílias. Os segmentos com itens de menor valor tendem a se recuperar mais rápido e os de maior, que dependem de crédito, demoram mais tempo. As vendas dos supermercados, produtos alimentícios, bebidas e fumo já mostrou avanço de 0,8% em agosto, ante uma queda de 0,7% no mês anterior, segundo dados do IBGE. Esse desempenho ajudou a segurar a queda das vendas no comércio brasileiro naquele mês, que foi de 0,6%.
As perspectivas para a renda das famílias ainda são negativas, uma vez que o desemprego deve continuar avançando até o fim do próximo ano. O indicador costuma ser o último a entrar na crise e o último a sair. “Além disso, as famílias estão endividadas. O bom é que esse endividamento não vem crescendo, o que mostra que as pessoas estão pagando suas dívidas e não fazendo novas”, diz Paulo Gomes, economista da Azimut Welth Management.
Como o crecimento via consumo interno está esgotado, os economistas esperam que a recuperação venha do lado do investimento. E o ciclo de queda de juros iniciado esta semana pelo Banco Central será importante para canalizar recursos para a economia real. O mercado estima uma queda da Selic para 11% no fim de 2017, mas os mais otimistas já projetam juros em um dígito. Com isso, o Santander estima um avanço de 6% dos investimentos no próximo ano, após uma queda acumulada de 25 pontos percentuais desde 2014. “O avanço dos investimentos virá principalmente pela melhora dos fundamentos: queda da taxa de juros, menor percepção de risco sob o cenário de maior estabilidade política e medidas fiscais e melhora da confiança do empresariado”, avalia Rodolfo Margato, economista do Santander.
Política
Um consenso entre os economistas é de que o ponto de partida para a recuperação é o ajuste das contas públicas. O mercado financeiro vê como fundamental a aprovação da PEC 241, que impõe um teto para os gastos públicos, e aguarda o início da tramitação da reforma da Previdência para ainda este ano. “A articulação do governo no Congresso está sendo bem vista pelos investidores, tanto que o Ibovespa ultrapassou a barreira dos 62 mil pontos esta semana”, diz Gomes, da Azimut. Ele observa que o governo é visto como pró-investimento e que está fazendo road shows no exterior para promover o país. “Os remédios estão na direção certa, mas demoram um tempo para surtir efeito”, diz.
O cenário ainda muito incerto para as eleições presidenciais de 2018 também representa um risco grande à retomada do crescimento. Para Rochlin, da FGV, uma possível eleição do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) é um risco aos olhos do mercado. “O discurso do Lula hoje não é paz e amor. Ele volta a ser aquela ameaça que deixou de ser em 2002 com o [Antonio] Palocci na Fazenda”, diz o professor. Segundo ele, isso pode atrapalhar a volta do investimento pelo setor privado, pois traz o fantasma da insegurança jurídica.
Pesquisa da CNT/MDA divulgada nesta quarta-feira mostra que Lula aparece como primeiro colocado em todos os cenários de primeiro turno se a eleição para Presidência fosse hoje. Ele só venceria no segundo turno, porém, caso o adversário fosse o atual presidente Michel Temer (PMDB). “2018 está totalmente em aberto. Por isso, até lá, o país não deve ver uma grande enxurrada de investimento estrangeiro, até que o cenário político e econômico se estabilize”, diz Rezende, da consultoria 4E. Ele lembra que o país está, dessa forma, perdendo uma janela de oportunidade em um mundo com alta liquidez e taxas de juros próximas a zero ou negativas. Mas esse cenário externo ainda deve se manter por mais alguns anos, diz o economista, mesmo após os Estados Unidos subirem os juros. Assim, se conseguir arrumar a casa até 2018, o Brasil ainda poderá atrair parte desse capital externo e participar de uma parte da festa.