Economia

Os destaques do PIB 'estagnado' da China e o que dizem sobre o Brasil

PIB da China cresceu 0,4% no segundo trimestre em meio aos lockdowns no país. Uma desaceleração chinesa aumenta riscos para o Brasil, mas leitura é de que o pior pode já ter passado

China: PIB cresceu 0,4% no segundo trimestre, abaixo das expectativas (Qilai Shen/Getty Images)

China: PIB cresceu 0,4% no segundo trimestre, abaixo das expectativas (Qilai Shen/Getty Images)

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Carolina Riveira

Publicado em 15 de julho de 2022 às 13h25.

Última atualização em 18 de julho de 2022 às 12h58.

A retomada da economia mundial — que mal tinha começado — está balançando de vez. Um dos sinais mais fortes vêm da China, que divulgou nesta sexta-feira, 15, seu pior crescimento desde o começo da pandemia da covid-19, em 2020.

O PIB chinês cresceu 0,4% no segundo trimestre, entre abril e junho, em relação ao mesmo período do ano passado. O resultado ficou muito abaixo das projeções do mercado, de 1,2%, e muito aquém dos 4,8% registrados no primeiro trimestre.

O freio na "fábrica do mundo" tem impactos generalizados na economia global e também no Brasil.

VEJA TAMBÉM: Sob a sombra da covid-19, economia da China desacelera e cresce apenas 0,4% no 2º trimestre

"O resultado veio abaixo das expectativas, e como o Brasil tem uma exposição grande para China, acaba preocupando mais", diz Luca Mercadante, economista da Rio Bravo.

O principal ponto no PIB estagnado veio do efeito dos lockdowns para conter casos de covid-19, como na metrópole Xangai, fechada por dois meses a partir de abril.

Por outro lado, Mercadante aponta que setores importantes para o Brasil e consumidores de minério de ferro, como a indústria, caminham para sair do pior momento, sobretudo com números melhores em junho.

"Serviços foi um grande ponto de desaceleração na economia chinesa com os lockdowns, o que, olhando para o Brasil, talvez não seja uma preocupação tão grande. Mas também impacta em renda, demanda, o quanto vão gastar. Por isso o crescimento da China como um todo é sempre importante em relação às exportações brasileiras."

Tela em Xangai mostrando resultado do PIB do primeiro trimestre: expectativas mais baixas a partir de agora (Hugo Hu)

O comércio com a China foi grande responsável por segurar parte da economia brasileira nos anos de crise, mas a pauta concentrada em poucos produtos também é um risco no caso de uma desaceleração chinesa.

O Brasil vendeu para a China quase US$ 88 bilhões no ano passado, muito à frente dos US$ 31 bilhões vendidos aos EUA e dos US$ 12 bilhões à Argentina. Só soja e minério de ferro responderam por mais de 60% das exportações brasileiras para a China em 2021 e igualmente no primeiro semestre deste ano.

Crescimento menor na China será realidade

Apesar das perspectivas de melhora para o resto do ano, a meta do governo chinês de crescimento de 5,5% soa cada vez menos viável - embora mesmo esse número já fosse o menor crescimento em três décadas na China.

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Uma série de agentes do mercado têm cortado as projeções para 2022. Em junho, o Banco Mundial já havia revisado sua estimativa de crescimento chinês de 5,1% (em dezembro) para 4,3%, afirmando na ocasião que era esperado um forte estímulo do governo chinês no segundo semestre para reverter os impactos do lockdown.

As expectativas podem ficar ainda mais baixas com o resultado de hoje. O Goldman Sachs, que tinha uma das estimativas mais altas, puxou a fila e cortou sua projeção de crescimento para a China em 2022 de 4% para 3,3%.

Comércio em Suzhou, na China: projeção do governo é crescer 5,5% (Wang Jiankang/VCG/Getty Images)

Para o futuro próximo, embora tenha havido reabertura em várias cidades, novas ondas de covid-19 seguem sendo um desafio, uma vez que o governo parece disposto a manter a política de "covid zero" que tenta combater a disseminação de novos casos.

Mais de 200 milhões de pessoas estão atualmente em locais com restrições na China, incluindo em grandes cidades.

Outro foco vem do mercado imobiliário. A venda de casas caiu 22% em junho, embora os dados estejam aos poucos melhorando (ante o auge de 42% de queda em abril).

Com atrasos em entregas e algumas empresas sem recursos para terminar as obras, famílias têm demandado paralisação nos pagamentos de hipotecas. Qualquer problema nessa cadeia pode afetar sobretudo construtoras com dívidas mais arriscadas, em um setor que estima-se responder por um quarto da economia chinesa.

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Bancos chineses anunciaram que há 2,1 bilhões de iuanes (mais de US$ 300 milhões) em empréstimos de risco relativos a casas não finalizadas.

"Na atual desaceleração do mercado imobiliário, a suspensão do pagamento de hipotecas pode exacerbar o problema de liquidez enfrentado por promotores imobiliários pressionados, resultando em mais inadimplências e atrasos nas entregas de projetos daqui para frente", descreveu o banco suíço UBS em relatório nesta semana. No entanto, os analistas citam que a maioria do sistema bancário chinês não está sob risco.

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A raiz do debate vem do delicado equilíbrio que mantinha o setor, com empresas muito alavancadas se sustentando ao apostar em um cenário de preços em alta nas cidades. O problema ficou exposto em meio às medidas do governo Xi Jinping para reduzir o crescimento dos preços dos imóveis, com menos crédito e outras regulações.

Com os valores caindo pela primeira vez em anos, empresas do setor se viram com dívidas altas e sem condições para terminar parte das obras. Uma crise da qual a megaconstrutora Evergrande (que quase quebrou e tenta a trancos e barrancos reestruturar sua operação) virou o maior símbolo no ano passado.

Recessão global segue sendo risco

O cenário internacional para além da China piora as perspectivas, uma vez que, com a inflação recorde nos EUA e Europa e alta de juros em resposta, uma recessão global está cada vez mais no radar. Novos lockdowns generalizados na China elevariam ainda mais as pressões ao afetar a cadeia de suprimentos e a inflação no mundo.

Fila para testagem em Xangai: cidade reabriu e conseguiu reduzir casos, mas risco de nova paralisações por causa da covid-19 continua (Qilai Shen/Bloomberg/Getty Images)

Para o Brasil, todas as movimentações que possam vir a desacelerar o PIB chinês são má notícia não só pelas exportações diretas, mas pela influência chinesa nos preços das commodities. As possibilidades de desaceleração na China já derrubaram o preço do minério de ferro, que caiu para seu menor patamar em oito meses na quinta-feira, 14 (e fizeram a ação da Vale cair 6%).

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No curto prazo, o Brasil deve crescer mais do que o esperado inicialmente em 2022, com PIB subindo 2% nas projeções do Ministério da Economia (o banco Credit Suisse também aumentou previsão para os mesmos 2% ontem). O otimismo vem do grande impacto dos preços altos de commodities até aqui, reabertura pós-auge da pandemia e estímulos fiscais no Congresso. A inflação, hoje na casa dos 12%, deve invariavelmente cair no segundo semestre. Mas os próximos meses deixarão mais claros o quanto os impactos internacionais podem afetar a situação interna.

Enquanto isso, com o governo chinês devendo ampliar estímulos para acelerar a economia no segundo semestre (sobretudo se ainda quiser perseguir a meta de crescer 5,5%), parte do mercado parece também acreditar que o pior para a economia chinesa já passou.

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Os dados de junho na China deram alguma sinal de melhora, o que explica em parte por que o crescimento quase nulo em um país acostumado a altas exponenciais não derrubou os mercados na Europa na manhã desta sexta-feira.

Apesar disso, até o momento, tudo indica que a China não viverá uma retomada tão rápida e forte - e, sobretudo, que Pequim não deve ser novamente o grande motor de um mundo em recessão. O pequeno "boom das commodities" que favoreceu as exportações brasileiras nos últimos anos pode não ter vida longa.

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