MACONHA: 30 estados americanos já liberaram o comércio recreativo ou medicinal / Young Chang/ Getty Images (Young Chang/Getty Images)
João Pedro Caleiro
Publicado em 26 de maio de 2019 às 08h00.
Última atualização em 26 de maio de 2019 às 08h00.
São Paulo - "O Novo Normal": o slogan da MedMen, uma das maiores varejistas de maconha dos Estados Unidos, dá o tom da mudança nas atitudes com a substância ao redor do mundo.
A previsão da provedora de pesquisa de mercado Euromonitor é que as vendas legais de cannabis disparem 1.200% no espaço de sete anos, indo de US$ 12 bilhões anuais em 2018 para US$ 166 bilhões em 2025.
A Euromonitor analisou recentemente os 100 maiores mercados consumidores do planeta para identificar onde a maconha tem um futuro mais promissor usando três critérios principais.
O primeiro foi a escala do "mercado do pecado", ou seja: quantas pessoas hoje fumam tabaco, consomem bebidas alcoólicas e usam maconha mesmo que ilegalmente.
O segundo critério foi sociodemográfico, do tamanho da população e quanta renda ela tem disponível para gastar, e o terceiro foi o status legal e a expectativa sobre quando a maconha será enfim liberada.
A América Latina tem três representantes nos 15 mercados mais promissores, mas o Brasil só aparece na 26 ªposição apesar de ser um dos maiores mercados consumidores do mundo, inclusive na área do "pecado".
O Senado aprovou neste mês mudanças na política sobre drogas que facilitam a internação involuntária de dependentes e a nova orientação do governo federal na área, assinada pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL), excluiu o conceito de redução de danos.
"O Brasil é um daqueles mercados potencialmente significativos para a cannabis onde a liderança política é abertamente oposta, ou no mínimo ambígua, em relação à legalização. Outras são Trump nos Estados Unidos e [o vice primeiro-ministro Matteo] Salvini na Itália", diz Shane MacGuill, gerente da indústria de tabaco da Euromonitor International.
Apesar disso, a consultoria prevê a possibilidade de legalização total da maconha dentro de cinco anos nos Estados Unidos e três anos na Itália. Os países estão em segundo e terceiro lugar, respectivamente, no ranking dos mercados mais promissores.
Shane diz que as tendências políticas foram consideradas pela consultoria, mas que há outros fatores de longo prazo que contam muito, como a trajetória de investimentos corporativos e a aceitação da opinião pública.
Uma pesquisa Datafolha de 2018 mostra que apesar do apoio à legalização ser o maior desde o início da série histórica em 1995, dois em cada três brasileiros acham que fumar maconha deve continuar sendo proibido.
É a resistência cultural que faz com que países asiáticos ricos e populosos como Coreia do Sul e Japão só apareçam na segunda metade do ranking de mercados mais promissores, por exemplo.
O Canadá aparece no topo em grande parte por ter sido o primeiro grande país a legalizar totalmente a maconha, mas sua importância relativa deve declinar ao longo do tempo com a tendência de legalização centrada nos EUA e na Europa.
O mercado comum e a livre circulação na União Europeia sugerem que na medida que a liberalização avançar em países grandes como França, Espanha e Alemanha, ela tende a se tornar um fato consumado mesmo nos vizinhos com maiores restrições.
A consultoria avalia que da mesma forma que acontece no mercado de alimentação, não deve haver um padrão mundial único, com cada país experimentando um tipo de regulação.
"O Uruguai tem alto nível de envolvimento estatal na sua economia de forma geral, enquanto os EUA é o país dos empreendimentos privados, então não surpreende que adotem modelos na mesma linha para a cannabis", diz Shane.
A taxação é outro ponto de ajuste fino: não pode ser muito baixa, pois o potencial de arrecadação do produto é um dos principais argumentos pró-legalização, mas não pode ser muito alta a ponto de estimular a manutenção de um amplo mercado ilegal.
Mas o que tudo significa para as empresas de cigarro e bebida: maior concorrência ou novas oportunidades? A resposta não está clara, dizem os analistas.
"Alguns fumantes podem usar a cannabis legal para parar de fumar, alguns consumidores em potencial podem escolher consumir a cannabis legal ao invés de tabaco e nicotina e muitos fumantes passarão a usar novos métodos de entrega para cannabis, esperando usá-los cada vez mais também para entrega de nicotina", diz Shane.
Algo parecido pode acontecer com a indústria do álcool, setor já vem sendo desafiada por novas tendências geracionais e de comportamento, com o consumo responsável e o foco na saúde, aponta Spiros Malandrakis, gerente da indústria de Bebidas Alcoólicas na Euromonitor International.
O caminho mais proveitoso seria encarar a cannabis não como rival e sim como parceira, buscando integração via pesquisas conjuntas, aquisições e sinergia entre marcas. Há sinais de que isso já está acontecendo.
A moral da história seria a mesma da legalização: se não pode combatê-los, junte-se a eles. Veja quais são os 15 mercados no topo da lista da Euromonitor: