Economia

Orçamento público precisa de um choque de realidade

Depois de manobras contábeis e após eleição presidencial, números oficiais precisam ser divulgados de forma precisa


	Joaquim Levy e Nelson Barbosa: Para chegar a superávit anunciado, governo inflou a estimativa de receitas e subestimou ou omitiu despesas
 (Ueslei Marcelino/Reuters)

Joaquim Levy e Nelson Barbosa: Para chegar a superávit anunciado, governo inflou a estimativa de receitas e subestimou ou omitiu despesas (Ueslei Marcelino/Reuters)

DR

Da Redação

Publicado em 30 de novembro de 2014 às 10h20.

Brasília - Este será um fim de ano emocionante para o governo e, particularmente, para o futuro ministro do Planejamento, Nelson Barbosa.

A 22 dias do início do recesso parlamentar, o Congresso ainda precisa aprovar a alteração da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2014, a LDO de 2015 e o Orçamento de 2015.

Este último pode ser votado no ano que vem sem grandes problemas, mas precisa ser totalmente refeito.

Não é por outra razão que Barbosa, escolhendo palavras, afirmou que seu desafio mais imediato é a "adequação" da proposta orçamentária "ao novo cenário macroeconômico e ao objetivo de elevação gradual do resultado primário".

Depois de anos de manobras contábeis e ainda com uma eleição presidencial no meio do caminho, os números oficiais do Orçamento ainda precisam ser colocados "na real". É isso que tem consumido boas horas de trabalho da equipe de transição.

No dia 21, o Ministério do Planejamento divulgou um relatório em que admitiu que as receitas ficarão R$ 38,4 bilhões abaixo do esperado e as despesas, R$ 22,2 bilhões acima. Apesar desse erro de R$ 60,6 bilhões, decidiu-se liberar mais R$ 10,1 bilhões para gastos.

O Estado perguntou ao Ministério do Planejamento o que teria ocorrido, entre setembro e novembro, para justificar as revisões.

A Pasta respondeu que os gastos com abono e seguro-desemprego, por exemplo, foram corrigidos em R$ 8,8 bilhões, porque "a execução desse item, até outubro, se mostrou superior ao estimado no relatório anterior".

A Pasta foi questionada sobre se as revisões haviam sido feitas somente em novembro por causa do calendário eleitoral. E se as correções eram uma espécie de "limpeza" das manobras contábeis. Não houve resposta.

Mesmo com uma correção dessa magnitude, as contas ainda têm uma gordura de pelo menos R$ 7,3 bilhões, segundo as consultorias de Orçamento do Congresso.

As receitas da Previdência, por exemplo, deverão ser cerca de R$ 5 bilhões inferiores à estimativa oficial.

Para atingir a meta oficial para o ano, de R$ 346,4 bilhões, os recolhimentos precisariam dobrar em novembro e dezembro. Mas não há nada que dê base a esse salto.

A proposta de Orçamento de 2015 precisa de uma reforma radical porque foi construída em cima de uma expectativa de crescimento de 3%, quando o esperado é algo próximo a 1% ou menos.

Além disso, modula as receitas e despesas para obter superávit primário de 2% do Produto Interno Bruto (PIB), maior até do que o anunciado pelo futuro ministro Joaquim Levy.

Mas, para chegar a esse superávit, o governo inflou a estimativa de receitas e subestimou ou omitiu despesas, segundo nota elaborada pelos consultores da Comissão de Orçamento da Câmara Ingo Antonio Luger e Márcia Rodrigues Moura.

Confusão

A condução das contas públicas foi tão confusa neste fim do ano que Dilma corre risco de judicialização das questões orçamentárias.

A liberação de R$ 10,1 bilhões neste mês, num momento em que tudo indica o descumprimento da meta fiscal, bate de frente com a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

Assim, essa medida sujeita a presidente a processo por improbidade administrativa. É por isso que o governo está tão empenhado em aprovar no Congresso, até o fim deste ano, a mudança da meta fiscal na LDO de 2014, que legalizaria a situação.

Já se a LDO de 2015 não passar até o fim de dezembro o governo corre o risco de um "apagão" financeiro. Não haverá base legal para gastar nem para pagar aposentadorias e salários.

O governo já tem um Plano B para essa eventualidade, que é editar uma medida provisória (MP) para liberar os recursos. Mas, para os mais formais, essa saída é questionável.

Embora a LDO seja uma lei ordinária - pelo menos em tese substituível por uma MP -, os ritos de votação são diferentes. Ou seja, essa saída poderia parar na Justiça.

O mais provável é que as duas proposições sobre a LDO sejam aprovadas este ano. O custo político, porém, deve ser elevado.

Acompanhe tudo sobre:Ajuste fiscalEconomistasGoverno DilmaJoaquim LevyMinistério da FazendaMinistério do PlanejamentoNelson BarbosaPolítica fiscal

Mais de Economia

Temos um espaço muito menor para errar, diz Funchal sobre trajetória da dívida pública

Isenção de IR para quem ganha até R$ 5 mil recairá sobre grandes empresas, diz Rodrigo Maia

A crescente força das gerações prateadas no Brasil

Haddad diz que consignado privado pelo eSocial terá juro "menos da metade" do que se paga hoje