Economia

O impacto econômico da Brexit: abriu-se a "caixa de pandora"

Ninguém sabe o que vai acontecer, mas é difícil achar alguém otimista; Reino Unido e Europa devem perder crescimento, comércio, empregos, renda e relevância


	Bandeira do Reino Unido em frente ao relógio Big Ben em Londres
 (Toby Melville / Reuters)

Bandeira do Reino Unido em frente ao relógio Big Ben em Londres (Toby Melville / Reuters)

João Pedro Caleiro

João Pedro Caleiro

Publicado em 24 de junho de 2016 às 10h52.

São Paulo - Aconteceu: o Reino Unido decidiu em referendo que não quer mais ser parte da União Europeia.

Ninguém sabe exatamente o que acontece agora, e esse é justamente o problema. Os mercados reagiram levando a libra para seu menor nível em 31 anos e derrubando as ações europeias (o Brasil também será afetado).

O primeiro-ministro David Cameron renunciou e o próprio país pode se desfazer. O "fico" ganhou na Escócia, que se sente traída, já que os riscos econômicos pesaram na sua decisão de ficar dentro do Reino Unido no em setembro de 2014. 

Em pesquisa antes da votação, 88% dos economistas britânicos concordaram que a economia britânica seria prejudicada pela Brexit. Na semana passada, 10 vencedores do Nobel divulgaram uma carta alertando para consequências graves e duradouras.

De acordo com um estudo da PwC encomendado pela Confederação das Indústrias Britânicas (CBI), serão 950 mil empregos eliminados. Segundo o Tesouro Britânico, cada domicílio britânico perderá US$ 6.143 anualmente (veja mais números).

A economia do país é bastante dependente do comércio internacional e 44% dos bens e serviços exportados pelo Reino Unido têm a União Europeia como destino.

Sair da UE dispara negociações não só com o resto do continente mas também com cerca de 50 países que tem acordos com o bloco, além de novas tarifas e barreiras.

É razoável supor que a União Europeia vai dificultar a vida dos britânicos, sob risco de estimular a debandada de mais países. O comércio provavelmente continuará intenso, mas não como antes.

Isso aumenta a incerteza e os custos no curto prazo, especialmente para setores como o financeiro. Não por acaso, os grandes bancos trabalharam sem parar durante a apuração prevendo uma "catástrofe".

Veja algumas projeções dos últimos meses:

Morgan Stanley

Em março, o Morgan Stanley identificou 4 canais de contágio, com a incerteza no topo da lista: todas as regras tem que ser renegociadas e diante disso, os atores do mercado devem esperar para ver o que vai acontecer antes de investir.

Estão incluídas projeções para 2016 e 2017 do próprio país (UK, em verde), da zona do euro (Eurozone, em azul) e do CEE (Mercado Comum Europeu, em amarelo) em dois cenários: de "stress médio" e de "stress grande".

Cenários de queda do PIB com saída do Reino Unido da União Europeia (Morgan Stanley)

Barclays

"Acreditamos que as implicações para a UE (União Europeia) e a União Monetária Europeia são pelo menos tão importantes do que para o Reino Unido", diz a nota assinada por Marvin Barth ainda em janeiro.

A saída do país desperta novamente o temor de dissolução do bloco que tanto assustou os mercados no pico da última crise do euro.

"O precedente de um estado membro saindo da união abriria a caixa de Pandora: poderia ser usado como argumento político por partidos extremos e populistas, tanto da direita quanto da esquerda, para pressionar por uma saída da UE, incluindo em alguns países do euro", diz o texto.

Representantes da extrema-direita celebraram e pediram referendos similares em outros países. A líder da Frente Nacional francesa, Marine Le Pen, e o líder da ultradireita holandesa, Geert Wilders, foram os primeiros a defender consultas em seus países.

O presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, insistiu nesta sexta-feira que a Brexit não representa o início do fim da UE.

Respondendo a pergunta de repórter em entrevista coletiva na sede executiva da UE em Bruxelas, Juncker simplesmente respondeu "não". A fala gerou aplausos de autoridades da UE na sala, e Juncker saiu após responder somente a duas perguntas.

Open Europe

De acordo com um relatório do think tank independente Open Europe, tudo depende do que o Reino Unido fará com essa tal liberdade.

Quando o artigo 50 é colocado em prática, não tem volta: o país perde o poder de voto e a partir daí é o bloco que estabelece o calendário e os termos do rompimento.

No melhor cenário, o país consegue não apenas manter o livre comércio com a Europa mas também se abre ainda mais para o resto do mundo. Nesse caso, o PIB seria 1,6% maior em 2030. No pior cenário, sem acordo algum, o PIB cairia 2,2% no mesmo horizonte.

O mais provável, no entanto, é alguma combinação das duas coisas - colocando as estimativas numa janela mais realista entre perda de 0,8% e ganho de 0,6%. 

Tudo depende também do comportamento da economia europeia nas próximas décadas. Se ela superar seus desafios e voltar a apresentar dinamismo, o custo da separação aumenta para a Grã-Bretanha - e vice-versa.

Nenhum país saiu da União Europeia até hoje. A Grécia quase saiu algumas vezes, mas por causa de crises de liquidez e negociações tensas sobre pacotes de resgate, não por um ato de vontade dos gregos.

"Se o Reino Unido colocasse tanto esforço em reformar a UE como teria de fazer para sair dela com sucesso, tanto o país quanto a UE ficariam bem melhores", diz o relatório.

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