Economia

O duro recado de George Soros para Xi Jinping

A exposição cada vez maior de investidores a ativos chineses preocupa George Soros, que escreveu sobre o tema em artigo no jornal Financial Times. O caminho, no entanto, é sem volta

George Soros: pedido de mais transparência nos investimentos na China (Simon Dawson/Bloomberg/Getty Images)

George Soros: pedido de mais transparência nos investimentos na China (Simon Dawson/Bloomberg/Getty Images)

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Da Redação

Publicado em 31 de agosto de 2021 às 15h36.

Última atualização em 1 de setembro de 2021 às 11h34.

O investidor e filantropo húngaro-americano George Soros criticou nesta semana medidas econômicas tomadas pelo governo chinês, que vem apertando o cerco na regulação de alguns setores no país.

A análise foi feita em artigo assinado por Soros no jornal britânico Financial Times na segunda-feira, 30.

Na visão de Soros, o presidente chinês, Xi Jinping, "colidiu com a realidade econômica" e investidores estrangeiros terão, com o tempo, "um duro despertar" para os problemas da abordagem chinesa.

O artigo foi classificado pelo FT em suas redes sociais como "palavras duras" de Soros para o presidente chinês.

Dentre as críticas, ele cita sobretudo os mercados imobiliário e de educação privada, que têm sido alvo de regulações do governo chinês nos últimos meses.

Soros também cita, por exemplo, a entrada do governo chinês no conselho da ByteDance, startup dona da rede social TikTok, em abril.

"O movimento dá a Pequim um dos assentos em um conselho diretor de três pessoas e acesso em primeira mão a trabalhos internos da companhia que tem um dos maiores tesouros de dados pessoais do mundo", escreveu.

Para o bilionário investidor, o movimento na ByteDance passou "despercebido" pelo mercado financeiro, ainda que ele concorde que investidores estejam hoje mais atentos à influência do governo sobre nomes como a varejista Alibaba (que chegou a ter o IPO da fintech Ant cancelado neste ano após o empresário Jack Ma criticar o governo em Pequim).

George Soros é presidente do conselho e fundador da Soros Fund Management, o familly office que gerencia sua fortuna (e que já foi um fundo de hedge no passado), além da rede internacional de filantropia Open Society Foundations.

Sua fortuna pessoal, segundo a Bloomberg, é hoje de 7,5 bilhões de dólares, excluindo os mais de 20 bilhões de dólares sob gestão dos fundos de filantropia.

Críticas ao "ESG chinês"

Como a EXAME mostrou em reportagem sobre os 100 anos do Partido Comunista Chinês, completados em julho, o presidente Xi Jinping tem tido uma liderança centralizadora mesmo para os moldes do PCCh.

O movimento pode colocar em xeque o modelo de flexibilidade que foi um dos maiores trunfos do sistema chinês até aqui.

Desde as reformas do ex-líder Deng Xiaoping nos anos 1970, o PCCh vinha buscando algum equilíbrio entre abertura ao mercado, avanço sociais e o elefante político na sala com a falta de democracia — ainda que encorajasse, ao mesmo tempo, algum tipo de abertura interna dentro do partido

Mas sob o novo momento do governo Xi, Soros argumentou em seu artigo que investidores estrangeiros, atraídos pelo crescimento chinês recente, não têm sido capazes de identificar os novos riscos envolvidos em investir na China.

"A China de Xi não é a China que eles conhecem. Ele está colocando em vigor uma versão atualizada do partido de Mao Tse-tung", escreveu, citando o ditador chinês dos anos 1950.

"Nenhum investidor tem nenhuma experiência com essa China porque não havia mercado de ações na época de Mao. Por isso o bruto despertar que os aguarda."

Até os esforços de investimentos ESG (sigla para meio-ambiente, social e governança) dos investidores americanos entram no rol de críticas.

Soros, que vem sendo um dos expoentes dos investimentos ESG nos últimos anos, avalia que muitos cotistas terminam expostos a empresas da China sem entender completamente o tamanho da participação chinesa.

Muitos fundos de pensão, por exemplo, acompanham índices como o MSCI’s ACWI ESG Leaders Index, que tem as chinesas Tencent e Alibaba entre algumas das principais empresas.

Soros argumentou que, como muitos acionistas de fundos estão diretamente conectados às decisões em Pequim, é preciso maior transparência nos investimentos — e defendeu até mesmo que o Congresso americano passe leis nesse sentido.

A existência de empresas chinesas em índices ESG não é de todo questionável pelas métricas da sigla.

O país erradicou a extrema pobreza e ampliou acesso à saúde e educação. Embora seja ainda um dos maiores poluidores do mundo com parte da matriz energética em carvão, tem também se tornado líder em energia renovável.

Mas a principal crítica de Soros é com relação à governança. Para Soros, o presidente Xi Jinping "enxerga todas as empresas chinesas como instrumentos de um Estado de um só partido".

O bilionário avalia que os índices "têm forçado centenas de bilhões de dólares pertencentes a investidores dos EUA na direção de empresas chinesas cuja governança não atende ao padrão exigido".

Investimentos na China

Apesar da guerra comercial que se intensifica entre EUA e China desde 2017, a economia americana segue cada vez mais interligada aos acontecimentos na China — assim como a de todos os países do mundo, como o Brasil, do qual a China é a maior parceira comercial.

Nos mercados, estimativas apontam que investidores ou fundos dos EUA tenham mais de 1 trilhão de dólares em ativos chineses de equity ou de dívida, segundo projeção da consultoria Rhodium Group. Devido à solidez do mercado americano, a conta é maior para o outro lado, com chineses tendo mais de 2 trilhões de dólares em ativos nos EUA.

Para além dos mercados, o investimento direto de empresas americanas na China ou investimentos de venture capital (como em startups) somou 11,2 bilhões de dólares em 2020.

O número é alto apesar de uma queda em 2020 em relação aos anos anteriores, gerada sobretudo pela pandemia, segundo números do US-China Investment Hub.

Já o investimento direto ou em venture capital dos chineses nos EUA foi um pouco menor, de 10,4 bilhões.

A China é também a terceira maior parceira comercial dos EUA. Os americanos importam quase 500 bilhões de dólares, sobretudo em manufaturas.

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