Trabalhadores próximos a pôsteres de protesto contra os "abutres", em Buenos Aires (Enrique Marcarian/Reuters)
Da Redação
Publicado em 27 de junho de 2014 às 22h34.
Nova York - O juiz americano Thomas Griesa impediu a Argentina nesta sexta-feira de pagar parte de sua dívida reestruturada, ao considerar "ilegal" o envio de dinheiro para o pagamento.
A corte não embargou os recursos, porém, tendo determinado sua devolução a Buenos Aires.
"Esses pagamentos são ilegais, não podem ser feitos e não serão permitidos por essa corte", disse o juiz Griesa, para quem qualquer futura tentativa argentina de pagar os fundos que participam da reestruturação "desrespeitaria a decisão desta corte".
Na quinta-feira, a Argentina anunciou um depósito em diversos bancos para pagar títulos da sua dívida reestruturada, mas não se dispôs a pagar os fundos especulativos que ganharam um litígio na corte de Griesa em 2012 e que exigem o valor integral de seus títulos.
O Ministério argentino da Economia emitiu uma nota oficial nesta sexta, na qual afirma que Griesa cometeu um "abuso de autoridade" ao impedir os pagamentos. Segundo o comunicado, a decisão é "insólita e inédita".
Na nota, o Ministério argentino afirma ainda que Griesa "pretendeu anular o pagamento já realizado pela Argentina".
A audiência desta sexta-feira foi convocada com urgência a pedido dos fundos especulativos, assim que o governo argentino anunciou o depósito de cerca de 1 bilhão de dólares para pagar os fundos litigantes. A atitude foi considerada "desafiadora" pelos advogados dos fundos.
Griesa lamentou que as partes não tenham sido capazes de fazer as negociações avançarem, apesar de ter nomeado o tribunal como um "special master", ou supervisor das negociações, e de ter sido obrigado a interromper suas férias para tratar do tema.
Ação "explosiva"
Para Griesa, a decisão argentina de depositar dinheiro para pagar os fundos que participaram da reestruturação da dívida foi uma "ação explosiva" que teve como efeito impossibilitar qualquer entendimento.
O advogado Eric Shaffer, do banco New York Mellon, relatou a Griesa que, na quinta-feira, a conta dessa entidade no Banco Central recebeu depósitos de 230,92 milhões de dólares e de 225,85 milhões de euros.
"Até onde sabemos, não recebemos instruções sobre o que fazer com esse dinheiro. Mas temos consciência da ordem da Justiça", declarou Shaffer.
"Esse dinheiro deve ser devolvido para a República Argentina. Eles não têm por que fazer esses pagamentos. Isso nunca deveria ter sido feito. O dinheiro será devolvido", respondeu o juiz.
A resposta de Griesa esgotou a possibilidade de o juiz determinar o embargo desses recursos para garantir o pagamento aos fundos especulativos NML e Aurelius, além de outros litigantes menores.
Griesa também mencionou a jurisdição de sua decisão, referente ao ao pagamento de títulos reestruturados nominados em euros e administrados por um banco em Luxemburgo. "A decisão é sobre qualquer pagamento realizado pela Argentina", apontou.
Reforçar as negociações
Na audiência, Griesa insistiu em que as partes deveriam se concentrar nas negociações com a ajuda do advogado Daniel Pollack, escolhido por ele para supervisionar e ajudar os interessados a chegar a um entendimento.
"Neguei (na quinta-feira) o pedido da Argentina para suspensão da sentença, porque era preciso que as negociações entre as partes concordassem em manter o 'status quo'. Isso é algo que se faz todos os dias nas negociações deste país (Estados Unidos)", afirmou Griesa, sem esconder sua irritação.
A Argentina havia expressado sua preocupação com a data de 30 de junho, em que deve pagar os credores dos títulos reestruturados, mas Griesa sugeriu que até esse detalhe poderia ter sido resolvido, se as partes tivessem trabalhado com Pollack.
"Houve um fracasso em trabalhar com o supervisor", criticou.
Nesse sentido, o juiz apontou que o gesto argentino de depositar o dinheiro se tornou um fator de quebra do diálogo. "Se tivessem mantido o contato com o supervisor, todos esses problemas estariam agora resolvidos", reclamou.
Griesa considerou que é "desejável" que as partes cheguem a um acordo e manifestou sua expectativa "de que a República Argentina participe das negociações".
Para Richard Samp, advogado da instituição Washington Legal Foundation que apoia as demandas dos fundos que Buenos Aires chama de "abutres", a Argentina não conseguirá pagar os títulos reestruturados, nem poderá retornar aos mercados financeiros. O advogado acredita que os argentinos vão apenas conseguir irritar Griesa ainda mais.
"Há somente uma saída para o dilema que Argentina tem pela frente (...) A Argentina deve sentar com os 'holdouts' (fundos credores da dívida em default) e tentar chegar a um acordo de boa-fé com eles. Isso permitirá que o país evite a moratória", sugeriu Samp, em mensagem enviada à AFP.