Crise: após calote, juiz sugere processar fundos especulativos e reforma legal (Martin Acosta/Reuters)
Da Redação
Publicado em 3 de agosto de 2014 às 14h17.
Buenos Aires - Um juiz da Suprema Corte da Argentina sugeriu denunciar judicialmente os fundos especulativos que processaram o governo da Argentina e pediu uma reforma legal para processar funcionários que comprometam a economia nacional, em entrevista publicada neste domingo.
"Seria preciso explorar a possibilidade de processar os fundos abutre. Em princípio, parece claro e há provas de que não eram os proprietários originais dos bônus, mas que compraram para interferir ou fazer negociações com intenção especulativa", disse o juiz Raúl Zaffaroni, embora tenha admitido não ser especialista na matéria.
"Isto não será crime, mas em sede civil é uma conduta dolosa. O prejuízo desta conduta imoral é sentido no país. Não sei se caberia um processo aqui, nos Estados Unidos ou em algum outro lugar", acrescentou, em entrevista ao jornal "Página 12".
Zaffaroni criticou duramente a sentença do juiz nova-iorquino Thomas Griesa e também a decisão da Corte Suprema dos Estados Unidos de se recusar a discutir uma questão que "põe em xeque a um país inteiro".
"Como alguém explica que a famosíssima Corte, tão respeitosamente citada porque sempre "age bem", tenha dito que não interessa o destino de uma negociação de muitos bilhões de dólares que compromete um país inteiro e talvez o destino de quantos mais? Isto é um escândalo jurídico", afirmou.
Para ele é "urgente reformar a lei para declarar imprescritível a administração fraudulenta em prejuízo dos interesses nacionais em toda negociação internacional que comprometa substancialmente a economia nacional", como acontece agora com os crimes de contra a humanidade.
Zaffaroni citou o catedrático emérito alemão Wolfgang Naucke ao afirmar que "hoje o poder arbitrário é econômico, e não há instrumentos penais para contê-lo".
"Se alguém administra as propriedades de uma viúva ou de um órfão e age em seu prejuízo, vai preso, conforme o nosso Código Penal, pelo crime de administração fraudulenta, que introduzimos em nossa lei há uns 50 anos. Mas se administra toda a economia da Nação e entrega à jurisdição, que é expressão constitucional da soberania. Ah! Então dá cátedra e conselhos", comparou.
Após a decisão firme na justiça americana a favor dos fundos de investimento que exigem do governo argentino o pagamento integral de US$ 1,5 bilhão por títulos de dívida em moratória desde 2001, o juiz Thomas Griesa bloqueou no final de junho fundos depositados pelo executivo de Cristina Kirchner para os credores que aceitaram reestruturar a dívida (92,4%).
O fracasso das negociações mantidas desde então o governo argentino e os denominados fundos abutre, sob a mediação do advogado Daniell Pollack, deixou o país à sombra da moratória.