O consumo das famílias responde por 65% do PIB (Dário Oliveira/Estadão Conteúdo)
João Pedro Caleiro
Publicado em 1 de março de 2018 às 12h45.
Última atualização em 1 de março de 2018 às 17h53.
São Paulo – O PIB do Brasil cresceu 1% em 2017 após uma queda acumulada de 7% nos anos anteriores.
A volta de um número anual positivo após uma das maiores recessões da nossa história é certamente algo a ser comemorado.
O PIB per capita, a divisão do resultado pela população, teve a primeira alta desde 2013: 0,2% em termos reais, atingindo R$ 31.587.
Mas é preciso cautela, já que o dado veio abaixo da expectativa do mercado e levou alguns órgãos a rebaixar a previsão de crescimento para 2018 (o Ibre/FGV, por exemplo, alterou de 2,9% para 2,7%).
“A comparação trimestral está desacelerando muito rapidamente. Há indícios de que saímos do fundo do poço, mas a recuperação tende a ser muito lenta. Não consigo ver quais seriam os pólos dinâmicos”, diz Andre Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos.
O lado positivo é que a retomada é cada vez mais disseminada. A agricultura tem o número mais vistoso do ano (alta de 13%), mas com peso relativamente pequeno no total e focado especialmente no 1º trimestre.
“2017 começou com o crescimento concentrado em alguns segmentos, como exportação, mineração, petróleo e agricultura, mas ao longo do ano a recuperação foi se espalhando”, diz Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados.
O processo continua no início de 2018, diz ele, citando como exemplo as vendas muito fortes do setor automobilístico em janeiro e os primeiros dados de fevereiro.
O que também ajudou e continua ajudando o Brasil, segundo os analistas, é o cenário internacional favorável.
Apesar de turbulências recentes, há sobra de liquidez, tolerância ao risco e crescimento "sincronizado" em todas as grandes economias, o que não ocorria há muito tempo.
Se a agropecuária foi o grande destaque, o consumo das famílias foi o grande motor do crescimento brasileiro em 2017.
O item responde por 65% do PIB e está de volta a uma dinâmica positiva. O desemprego está em queda (ainda que muito baseado na precariedade), o crédito está voltando (ainda que aos soluços) e a inflação desabou para um novo padrão.
Todos estes fatores se retroalimentam e a massa ampliada de rendimentos cresceu quase 6% no ano.
“Há uma recuperação cíclica importante do consumo. A desaceleração absurda da inflação, que foi a surpresa de 2017, permitiu isso já que mesmo com mercado de trabalho muito ruim, a sua renda disponível consegue comprar mais”, diz Silvia Matos, coordenadora técnica do Boletim Macro do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (IBRE/FGV).
A liberação de recursos do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) também ajudou a aliviar o bolso das famílias em meados do ano passado.
Mas a maior parte deste efeito já se dissipou, uma das razões pelas quais depois de subir 1,1% no 3º trimestre, o consumo cresceu só 0,1% no 4º trimestre.
“Boa parte do PIB foi sorte (agricultura, muito dependente de chuva) e a outra parte foi FGTS, que tende a não se repetir”, diz Andre.
Andre e Silvia acreditam que os números relativamente mais fracos divulgados hoje podem estimular o Copom a fazer um novo corte de 0,25 ponto percentual na taxa de juros na próxima reunião, marcada para os dias 20 e 21 de março.
O relaxamento da política monetária ao longo de 2017, levando a Selic para repetidas mínimas históricas, também vem sendo um dos fatores de estímulo ao crescimento.
Outra boa notícia é que o investimento está começando a dar sinais de retomada, com alta de 2% no 4º trimestre em relação ao anterior e o primeiro número positivo interanual após 14 trimestres de queda.
“Foi o dado mais relevante do trimestre, mostrando que além do consumo, 2018 será um ano com o investimento mais consolidado”, diz Vale.
Mas ainda é muito pouco, já que a base estava extremamente depreciada. Prova disso é que a taxa de investimento caiu de 16,1% do PIB em 2016 para 15,6% em 2017.
O maior exemplo de fraqueza é a Construção Civil, responsável por mais da metade do investimento no país e que teve queda de 5% no ano.
“É o patinho feio da economia: há o problema das obras do governo paradas, da Lava Jato e da vacância elevada, e depende muito do crédito de longo prazo. Mas parou de ser um desastre e a medida de máquinas e equipamentos já mostra recuperação”, diz Silvia.
Já o consumo do governo, que responde por cerca de um quinto do PIB pela despesa, vem encolhendo em volume desde 2015. Segundo a LCA Consultores, é reflexo do "processo de consolidação fiscal em curso”.
A visão de analistas é que o crescimento de 2018 já está relativamente contratado, mas o viés de alta ou baixa, e especialmente de 2019, dependem da continuidade de uma agenda de reformas.
Esta agenda depende da evolução do quadro eleitoral, o que inclui as ideias de quem está bem posicionado e a sua capacidade de implementar medidas com o Legislativo após eleito.
“A eleição ainda está extremamente aberta, mas não tem nesse momento nenhuma perspectiva de ganhar um candidato extremado, mesmo com as suspeitas de sempre como Jair Bolsonaro. Se ganha alguém como a Dilma, que quis reinventar a roda, volta para a recessão”, diz Vale.
A reforma da Previdência, já abandonada pelo governo atual, segue citada como uma agenda inescapável para garantir a sustentabilidade do teto de gastos e da trajetória da dívida pública.