Economia

Intervencionismo, PPI e dividendos: os destaques da primeira coletiva de Prates na Petrobras

Presidente da Petrobras se pronunciou pela primeira vez após lucro recorde da estatal. De um provável fim da PPI a transição energética, veja os destaques da fala

Prates: novo modelo para preço será estudado (VIVIAN FERNANDEZ/Agência Petrobras/Divulgação)

Prates: novo modelo para preço será estudado (VIVIAN FERNANDEZ/Agência Petrobras/Divulgação)

Carolina Riveira
Carolina Riveira

Repórter de Economia e Mundo

Publicado em 3 de março de 2023 às 09h03.

Última atualização em 3 de março de 2023 às 20h00.

O presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, disse na quinta-feira, 2, que não há "intervencionismo" do governo federal na estatal. O executivo afirmou que as consultas sobre mudança na política de preço com a União têm ocorrido dentro das regras de governança.

"Em nenhum momento está havendo qualquer grau de intervencionismo na Petrobras. Tudo está sendo conversado como um acionista controlador qualquer, em qualquer empresa que tem um acionista controlador", argumentou Prates.

Prates afirmou ainda que a empresa segue cumprindo a paridade de importação (PPI) "enquanto for regra", mas não escondeu que a mudança é uma prioridade em discussão com a União e com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

As declarações foram feitas em coletiva de imprensa na sede da estatal, no Rio de Janeiro, no primeiro evento do tipo desde que Prates assumiu o cargo. Mais cedo, Prates também havia falado a investidores ao apresentar os resultados da Petrobras, que lucrou R$ 188 bilhões em 2022, o maior lucro da história.

Indicado por Lula em janeiro, Prates foi senador pelo PT do Rio Grande do Norte (cargo que ocupou até este ano) e fez carreira no setor de energia e petróleo. Em 2008, foi secretário de Energia potiguar, período em que ficou conhecido pela ampliação da matriz eólica do estado. Nas falas desta quinta-feira, ele também citou a transição energética e disse que a Petrobras vai caminhar rumo a uma "economia de baixo carbono", mas sem deixar de investir em petróleo no curto prazo. Veja sete temas abordados por Prates e as pistas que as falas dão sobre o futuro da empresa e a relação com a União no governo Lula.

Futuro da PPI

Prates têm dito que a política de preço é "um assunto de governo", uma vez que cabe à União, como acionista controlador, indicar os conselheiros que podem mudar a regra atual da Petrobras. Quando era senador, Prates frequentemente dizia que a política não era "da Petrobras", ao criticar o ex-presidente Jair Bolsonaro por não alterá-la.

A estatal aplica em sua definição de preço uma paridade de importação (PPI) desde o governo Michel Temer em 2016. Prates criticou a obrigatoriedade do PPI por diversas vezes e disse que a estatal, se as atuais regras forem alteradas, "vai praticar preços competitivos".

"Aqui como Petrobras só me cabe dizer o seguinte: a Petrobras vai praticar preços competitivos, de mercado nacional, conforme ela achar que tem que ser para garantir a sua fatia de mercado em cada lugar em que estiver presente", disse Prates. "Se é o PPI que é o melhor preço por acaso, que seja. Mas na maior parte das vezes talvez não seja."

Não há "intervencionismo"

Prates negou intervencionismo do governo federal ao discutir mudanças na estratégia de preços e em outras frentes, como distribuição de dividendos - que foram recorde nos últimos trimestres, gerando criticas da base aliada do governo Lula. "Eu estou gerindo uma empresa que vai praticar o melhor preço para ela, para o acionista dela, para o mercado dela", disse.

"O governo, as figuras políticas, a discussão da campanha, projeta, isso eu não tenho por que esconder, não acha o PPI adequado como preço nacional", disse. "É a conversa de um CEO com membros de acionista controlador, a conversa do CEO com os acionistas minoritários, ordinaristas, preferencialistas."

"A diferença da política do governo anterior para a atual é que nós vamos nos defender", disse Prates. "Enquanto houver fatia de mercado para a Petrobras captar, ela vai captar. Dentro das regras, dentro da competitividade natural. Agora, como foi antes, deixar entrar concorrentes, e aplicar um preço abstrato só para favorecer o meu concorrente, eu não posso admitir que eu faça isso."

Mudanças aguardam novo conselho e diretoria

Questionado sobre datas para eventuais mudanças, Prates disse nada ocorrerá por ora e reforçou que a empresa seguirá as regras de governança. "Temos uma regra aqui que nós vamos ter que alterar [antes de mudanças]. Temos uma regra interna que refere ao PPI", frisou, mas voltando a afirmar que a decisão caberá "ao governo". "Está escrito na nossa regra e não vou descumprir regra."

Alterar a obrigatoriedade da paridade de importação nos preços da Petrobras exigirá aprovação no conselho da Petrobras, processo no qual o Planalto já trabalha. Embora caiba à União os votos majoritários, os conselheiros indicados pelo Ministério de Minas e Energia (MME) ainda precisam ser aprovados e tomar posse, o que só ocorrerá no final de abril. Já a nova diretoria da Petrobras deve chegar à companhia em março, disse Prates.

Mais cedo, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, também falou sobre a composição do conselho. "Vamos colocar os nossos melhores quadros à disposição do MME para encontrar alternativas para que não pesem no bolso do consumidor", disse nesta quinta-feira. "Temos aí um mês e meio para que haja mudança de Conselho e de diretoria, e vamos tratar com toda a seriedade este assunto", disse o ministro.

Petrobras "não é mais monopolista"

Na discussão sobre preços da estatal, Prates repetiu em mais de uma ocasião que a Petrobras não é mais "monopolista" e que, portanto, o PPI não é "o preço do Brasil", mas somente da empresa.

"Não estamos aqui dizendo que esse preço é o preço do Brasil. Se eu fizer isso é quase que admitir que a Petrobras faz o preço então ela é monopolista. E ela não é monopolista. Sequer é mais hegemônica em alguns mercados."

"Imaginar que o PPI é o preço do Brasil é imaginar que lá em Tabatinga no Amazonas e aqui em Ipanema no Rio, o preço é o mesmo da Alemanha colocado no Brasil. E não é assim", disse. "Quem faz preço é o mercado. Empresa faz política comercial."

Desde a obrigatoriedade da paridade de importação, somada a uma decisão por desinvestimentos da estatal, importadoras entraram no mercado e refinarias foram privatizadas, cenário que faz Prates afirmar que o Brasil tem hoje um "mercado doméstico" no qual a Petrobras deverá competir. "Não é subsídio, é meu melhor preço para garantir aquele cliente", argumentou. "É claro que não vou canibalizar ou aniquilar minha margem [...], mas até certo momento eu posso disputar o meu mercado com o importado, por que não?", afirmou.

Paridade "internacional" continua

Prates disse também que não existe ainda uma "fórmula" fechada nas conversas com o governo para uma eventual nova estratégia de preço, mas frisou que os preços internacionais serão levados em conta. "Nós não vamos vamos ficar também muito distantes de um processo dentro da paridade internacional, que a paridade internacional todo mundo segue", disse.

"Se o preço do petróleo sobe lá fora, alguma coisa vai acontecer com o produto, seja refinado aqui ou não, com o mercado local", disse. "Acontece que no mercado local você tem outros critérios."

Prates disse também que a estratégia será, certamente, diferente para cada produto e para cada região onde a estatal concorrerá.

Em crítica ao atual formato da PPI, o presidente repetiu que a Petrobras é obrigada a "seguir o preço do concorrente", em referência a importadores, em vez de explorar suas vantagens competitivas ao refinar parte de seu petróleo localmente. "Nós, Petrobras, temos investimento em refino no Brasil. Eu tenho culpa por ter isso? Não. Eu preciso usar isso a nosso favor", disse Prates.

Dividendos em aberto

Sobre a distribuição de dividendos, uma das principais incógnitas no momento, Prates disse defender uma regra "flexível" e que a avaliação precisa ocorrer "caso a caso". Ele criticou a regra atual da Petrobras, que exige uma distribuição específica de dividendos em relação ao fluxo de caixa.

Questionado sobre eventuais incertezas que possam afugentar investidores, Prates disse que nem todas as empresas de capital aberto têm uma regra fixa de distribuição de dividendos.

"Eu particularmente imagino que dividendos tem que ser uma regra um pouco solta. A empresa tem que ter a liberdade de o tempo todo propor um trade off com os acionistas, dizer, olha, eu tenho esses projetos aqui, vocês topam entrar comigo neles?", disse, afirmando que essa discussão ocorrerá "inclusive com o governo, que é acionista majoritário". Porém, disse que o cenário não está definido. "Pode ser que internamente a gente tenha uma regra mínima, ou um range", disse. "Não quer dizer que vai ser uma incógnita. Tem uma diferença entre uma incógnita e uma regra dura."

Transição energética, mas petróleo continua

Na fala, Prates citou em discurso de abertura sua tese sobre uma Petrobras atuante na transição energética, embora sem citar planos concretos por ora. "Os negócios em energia eólica offshore e hidrogênio são novas fronteiras que a Petrobras vai desbravar nos próximos anos", disse.

Prates afirmou que um "planejamento estratégico" será apresentado em breve, e que entende que a empresa vai "enfrentar ceticismo" tanto dos que defendem ruptura imediata com combustíveis fósseis, tanto dos que priorizam resultados imediatos decorrentes da "priorização" dos fósseis. "Vamos encontrar o passo ideal, em diálogo com nossos acionistas e com a sociedade brasileira, maior proprietária da Petrobras."

O presidente afirmou que a Petrobras que ainda se conviverá com o petróleo "por décadas". "Nós sabemos que é imperioso intensificar a descarbonização das operações e caminhar rumo à economia de baixo carbono. Mas também sabemos que a produção de óleo e gás ainda precisará prover a energia necessária ao planeta, e sobretudo ao país e à sociedade brasileira", disse. "A produção de petróleo não vai desaparecer de uma hora para outra."

O presidente disse que a Petrobras "não se furtará" em fazer novos investimentos em óleo e gás, citando como exemplo as reservas da margem equatorial, no litoral do Nordeste. O executivo falou ainda em eventual "reexploração de bacias já produtoras". Sobre refinarias já vendidas, Prates disse que não haverá interferência em ativos já vendidos dentro das regras, mas que processos com problemas ou não finalizados estão sendo revisitados pelo governo federal.

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