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Da Redação
Publicado em 25 de junho de 2016 às 09h00.
São Paulo - A saída do Reino Unido da União Europeia foi decidida pela questão da imigração e opôs duas visões de mundo: paroquial e cosmopolita.
A opinião é de Peter Hall, professor de Economia Política do Cento de Estudos Europeus da Universidade de Harvard.
Ele é autor de dezenas de livros e artigos sobre o continente e serve no conselho de publicações acadêmicas e institutos europeus.
Outros economistas apontam que a Brexit terá impacto econômico negativo, afeta o Brasil e é sinal de "um mundo caminhando na direção errada".
Em entrevista para EXAME.com ontem direto de Londres, Hall opinou sobre o que a decisão significa e o que pode vir por aí:
EXAME.com - Por que você acha que a Brexit ganhou apesar das últimas pesquisas darem vantagem para a permanência?
Peter Hall - Foi um voto apertado que poderia ter ido para qualquer um dos lados, mas o da permanência dependia principalmente de argumentos negativos sobre o custo econômico da saída.
E no meio de um debate em que afirmações infundadas foram jogadas de ambos os lados, muitos britânicos perderam a confiança no que os políticos estavam dizendo e simplesmente votaram com seu instinto.
E muitos se opõe instintivamente à imigração, que foi de fato a questão decisiva nessa campanha.
EXAME.com - Quais são as consequências econômicas da Brexit para o Reino Unido e a Europa?
Hall - No curto prazo, a incerteza vai provavelmente deprimir a economia britânica e a libra esterlina, mas no longo prazo, não acho que os efeitos serão catastróficos.
O Reino Unido tem uma economia dinâmica e acredito que continuará a sustentar um dos mais importantes setores financeiros do mundo.
Para o resto da Europa, os custos econômicos também não devem ser tão fortes. Ambos os lados terão interesse em continuar o comércio, mesmo que em termos um pouco menos vantajosos do que no passado.
EXAME.com - Mas a União Europeia não deve adotar uma linha dura nas negociações mesmo que isso implique em custos para o bloco?
Hall - Há muito que ainda não sabemos. Acho que a UE vai estar interessada em assegurar um comércio relativamente livre entre o Reino Unido e o continente, mas não acho que possam dar acesso total ao mercado comum sem exigir em troca uma contribuição para o Orçamento da UE e livre movimento de trabalhadores e esses são termos que o governo britânico não pode aceitar.
Eles vão achar um modus vivendi, mas a UE não pode facilitar para o Reino Unidoou estaria encorajando outros estados-membros a tentar algo similar.
EXAME.com - Você acredita que outros países poderiam seguir o exemplo e levar a uma dissolução do bloco?
Hall - Os líderes dos partidos "eurocéticos" na Europa já pediram por referendos semelhantes em seus países e uma pesquisa recente sugere que apenas 52% dos franceses votariam para ficar na UE se um referendo do tipo acontecesse lá, uma margem perigosamente pequena.
No entanto, eu acho que os partidos que governam a Europa estarão ansiosos para evitar novas saídas e, caso mantenham o poder, vão conseguir fazer isso.
EXAME.com - Há alguma vantagem na Brexit?
Hall - Nesse momento, é difícil de ver. Aqueles que esperam por uma integração política maior na UE podem acreditar que isso será mais fácil sem a Grã-Bretanha no meio do caminho.
No entanto, eu duvido que uma integração política muito maior seja possível em uma união de 27 países com governos e economias divergentes.
Não acho que o referendo seja catastrófico para qualquer um dos lados, mas também não ajuda ninguém. E no Reino Unido, revela uma divisão política profunda que vai torturar os políticos britânicos por anos a fio.
EXAME.com - Como você explica a diferença geracional, que fez os jovens votarem pela permanência e os velhos pela saída, se o desemprego entre os jovens é muito pior, por exemplo?
Hall - Muitas pessoas não lidaram com esse referendo como algo puramente econômico e sim como uma disputa entre uma perspectiva cosmopolita, que olha de forma esperançosa para um mundo mais aberto e tolerante à imigração, e uma perspectiva mais paroquial, que teme os efeitos da globalização e da imigração em particular.
De forma geral, os mais jovens tendem a ser mais esperançosos, especialmente se tem níveis relativamente altos de educação, e nasceram em um mundo que já era mais cosmopolita.
EXAME.com - Considerando que os mercados estarão voláteis e os governos terão que agir para sustentar o nível de crescimento, podemos esperar o fim das políticas de austeridade?
Hall - Durante a campanha, o ministro da Economia George Osborne alegou que a Brexit causaria uma recessão e que a perda de receita exigiria mais cortes no gasto público.
Mas eu acho que se houver uma recessão, as autoridades vão relaxar a política fiscal, pelo menos no curto prazo. O que acontece no longo prazo depende de quem substituir Osborne no posto.
O Partido Conservador está comprometido em cortar o gasto e esse pode continuar sendo o objetivo do novo líder do partido no outono, mas o primeiro imperativo será mitigar os efeitos econômicos adversos da Brexit.