Haddad: receita precisa aumentar ao menos em R$ 110 bilhões para zerar déficit em 2024 (Andressa Anholete/Bloomberg/Getty Images)
Repórter de Economia e Mundo
Publicado em 3 de abril de 2023 às 15h43.
Última atualização em 3 de abril de 2023 às 16h23.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse que o governo precisará ampliar receita entre R$ 110 bilhões e R$ 150 bilhões para conseguir atingir as metas previstas no arcabouço fiscal.
Para chegar lá, Haddad afirmou que o governo vai apresentar um primeiro pacote de medidas que incluem taxação de apostas eletrônicas e de e-commerce que descumpra regras da Receita, além de mudança na subvenção a estados na cobrança de Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e Imposto sobre a renda das pessoas jurídicas (IRPJ).
O cálculo foi reiterado pelo ministro em entrevista à Globo News concedida na tarde desta segunda-feira, 3. "Ente R$ 110 e R$ 150 bilhões você zera o déficit no ano que vem", disse Haddad.
O ministro afirmou que, somente com a tributação de apostas online, o governo espera arrecadar entre R$ 12 bilhões e R$ 15 bilhões.
Ao todo, esse primeiro pacote com as três medidas geraria arrecadação entre R$ 100 e R$ 110 bilhões, o que seria suficiente para chegar à meta de zerar o déficit primário em 2024 conforme previsto no arcabouço apresentado, disse Haddad. (Para este ano, a previsão do governo é de déficit em torno de 1%).
Ao apresentar o arcabouço fiscal na semana passada, Haddad já havia antecipado que enviaria ao Congresso um pacote de medidas que levariam a ampliação da receita, podendo chegar a até R$ 150 bilhões, como forma de atingir as metas previstas no arcabouço.
A expectativa é que as medidas de arrecadação sejam apresentadas na primeira quinzena deste mês, junto ao texto final do arcabouço fiscal, que ainda precisa ser enviado ao Congresso. Em outra declaração nesta segunda-feira, ao falar a jornalistas no prédio da Fazenda em Brasília, Haddad afirmou que o texto do arcabouço será enviado ao Congresso "antes do dia 15".
Haddad afirmou que, neste primeiro momento, serão apresentadas três medidas de arrecadação:
"Não é aumento de carga tributária. Houve uma perda de carga tributária grande que nós estamos minorando, ajustando o texto ao que o Brasil precisa", disse Haddad à GloboNews.
Sobre o comércio eletrônico que atua fora das regras da Receita, Haddad afirmou se tratar de práticas de "contrabando". Sem citar nomes de varejistas específicas, o ministro afirmou que uma venda nesse modelo "se faz passar por uma remessa pessoa-pessoa para não pagar impostos".
"Empresas estrangeiras e brasileiras que estão sofrendo concorrência desleal de um ou dois players estrangeiros estão cobrando providência. Daqui a pouco vão entrar com ação contra a Receita", disse Haddad.
Em outras ocasiões, a Fazenda já havia citado esse cenário, diante do crescimento no Brasil de empresas internacionais de varejo com vendas feitas como remessa de pessoa física, evitando a tributação comum de uma compra desse tipo. É sabido que o modelo empregado por varejistas como a chinesa Shein, cujo faturamento tem subido no Brasil, estão na mira do governo.
Haddad não detalhou quais números foram usados para a base de cálculo do governo e o quanto a Fazenda espera arrecadar com a tributação dessas modalidades de e-commerce. Reportagem anterior de EXAME IN mostrou que a Shein deve alcançar R$ 16 bilhões em vendas no Brasil neste ano.
Sobre as apostas eletrônicas, Haddad afirmou que essa é "uma atividade que muitas pessoas nem concordam que exista no Brasil, mas é uma realidade". "Não é justo você não tributar", disse. O ministro afirmou que a projeção inicial era arrecadar cerca de R$ 6 bilhões, mas que a estimativa subiu desde então.
A subvenção que o governo tenta mudar na relação com os estados diz respeito à cobrança de Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e Imposto sobre a renda das pessoas jurídicas (IRPJ) de empresas que receberam incentivos fiscais dos estados em que atuam. Haddad diz que o governo vai seguir apoiando estados na atração de investimentos, mas que a subvenção não pode valer também para custeio.
"Qual é o sentido de uma empresa que está lucrando mais, por conta de um benefício fiscal do estado, abater da sua base de cálculo tributos federais?", disse. "Vamos restringir ao conceito de investimento."
O governo perdeu entre R$ 85 bilhões e R$ 90 bilhões em arrecadação devido à questão, disse Haddad, e a projeção é que as perdas cheguem a R$ 230 bilhões em 2026.
O formato atual mudou em uma emenda pertencente a uma lei complementar de 2017, e o tema foi judicializado. A mudança que quer o governo, porém, precisa passar pelo Supremo Tribunal Federal. "Ainda não chegou no Supremo, vamos fazer chegar", disse Haddad.
O ministro citou ainda que o governo obteve, com Medida Provisória do início do ano, cerca de R$ 30 bilhões dos R$ 100 bilhões que foram perdidos com a mudança na base de cálculo do PIS/Cofins, que teve o ICMS retirado.
Depois desse primeiro combo de medidas, Haddad afirmou que o governo focará na reforma tributária, que precisará ser aprovada no Congresso por emenda complementar (que exige três quintos dos votos e uma maior articulação do governo). "Vamos parar por aí porque queremos, depois disso, aprovar a reforma tributária", disse. Segundo ele, a reforma "tem um efeito importante de trazer para dentro do sistema quem hoje consegue sonegar".
Haddad afirmou que a reforma tributária está prevista para ser votada na Câmara até julho e até outubro no Senado.
Passado esse primeiro momento, o ministro afirmou que há ainda outras seis medidas "saneadoras" que podem ser apresentadas. "O mais importante é dar um sinal do rumo do que fazer tudo agora e descompensar algo na economia. Se o rumo estiver claro e a autoridade monetária harmonizar com a fiscal, a sociedade brasileira vai crescer mais, pagar menos juros, e o Estado estará menos endividado."