Economia

Haddad: BC também tem de nos ajudar, não é "espectador"

Falas do ministro, no entanto, foram mais amenas do que declarações do governo nos últimos dias. Haddad disse que ata veio com termos "mais condizentes"

Haddad: ata veio com termos mais condizentes (Lula Marques/Agência Brasil)

Haddad: ata veio com termos mais condizentes (Lula Marques/Agência Brasil)

Carolina Riveira
Carolina Riveira

Repórter de Economia e Mundo

Publicado em 28 de março de 2023 às 16h50.

Última atualização em 28 de março de 2023 às 17h12.

Em tom mais ameno do que na semana passada, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse nesta terça-feira, 28, que a ata do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central trouxe sinais sobre a necessidade de política monetária e fiscal trabalharem em sintonia, ponto com o qual o ministro afirmou concordar.

Questionado sobre se o governo anunciará novas medidas para "ajudar" o BC, porém, Haddad afirmou que a autoridade monetária "também tem de nos ajudar".

O BC divulgou nesta terça-feira ata completa da reunião do Copom, na qual o comitê decidiu na semana passada por manter a taxa Selic em 13,75% pela quinta reunião seguida.

"O Banco Central também tem de nos ajudar. É um organismo que tem dois braços, um ajudando o outro. Eu sempre insisto nessa tese porque dá a impressão de que um é espectador do outro, não é assim que a política econômica tem de funcionar", disse o ministro, em fala a jornalistas no Ministério da Fazenda nesta tarde.

"São dois lados ativos, concorrendo para o mesmo propósito, mesmo objetivo, que é garantir o crescimento com baixa inflação. E isso só é possível pela harmonização da política fiscal com a monetária. E nós vamos atingir os nossos objetivos, que é fazer o país depois de dez anos voltar a crescer de maneira sustentável, esse é o desejo do presidente [Lula]", completou Haddad, antes de encerrar a declaração sobre o BC.

Na mesma entrevista, Haddad afirmou que o anúncio do novo arcabouço fiscal deve ser feito ainda nesta semana, outro tema que o Copom incluiu na ata divulgada nesta terça-feira. O comitê afirmou que a apresentação do arcabouço pode ajudar na desinflação via melhora das expectativas, embora esse resultado não seja garantido.

Ata tem termos "mais condizentes"

Haddad também avaliou nesta terça-feira que a ata do Copom, que tradicionalmente vem alguns dias depois do anúncio da Selic, veio com "termos mais condizentes" com as perspectivas de sintonia entre política monetária e fiscal.

"Da mesma forma que aconteceu com o Copom anterior, a ata, com mais tempo de preparação, veio com termos mais condizentes com as perspectivas futuras de harmonização da política fiscal com a política monetária. Que é o nosso desejo desde sempre", disse.

Logo após o anúncio da Selic, o Copom divulga um comunicado, mais curto, e cujo tom membros do governo haviam criticado nos último dias.

Na semana passada, Haddad havia classificado o comunicado como "muito preocupante", mencionando que foi divulgado no mesmo dia que as projeções de déficit primário do governo melhoraram e caíram para perto de 1% em 2023 devido ao plano fiscal que vinha sendo executado. A ministra do Planejamento, Simone Tebet, também disse ontem que o comunicado veio "fora de tom". 

Já nesta terça-feira, Haddad disse que o governo tem feito "a parte que nos cabe", com ajuste via receita.

"A gente fazer a parte que nos cabe, que é uma série de empresas que não pagam seus tributos, que evadem, que sonegam, então nós estamos fazendo um trabalho de combate forte à sonegação, revendo algumas desonerações que do nosso ponto de vista não se justificam", disse o ministro. "Mas sem tirar o pobre do orçamento porque esse é o compromisso de campanha que nós tenhamos, um orçamento condizente com aquilo que o eleitorado aprovou nas eleições de 2022."

"E que ao mesmo tempo nós venhamos a ter contas equilibradas, a partir de um conjunto de situações que não se justificam mais", disse.

Os recados da ata do Copom

Na ata desta terça-feira, o Copom de fato pontuou que o pacote fiscal do governo ajudou a atenuar os riscos no curto prazo, em linha com o que disse Haddad, citando políticas como a reononeração dos combustíveis.

"O Comitê avalia que o compromisso com a execução do pacote fiscal demonstrado pelo Ministério da Fazenda, e já identificado nas estatísticas fiscais e na reoneração dos combustíveis, atenua os estímulos fiscais sobre a demanda, reduzindo o risco de alta sobre a inflação no curto prazo", diz a ata do Copom.

O comitê falou ainda sobre o arcabouço fiscal, que, na visão dos membros, "pode levar a um processo desinflacionário mais benigno através de seu efeito no canal de expectativas", embora tal efeito não seja garantido.

Na outra ponta, o comitê respondeu negativamente ao que chamou de "adoção de políticas parafiscais expansionistas". O texto divulgado na ata não cita exemplos específicos, embora seja sabido que o governo discute frentes como juro menor no crédito consignado do INSS e expansão da atuação do BNDES, além de ampliação de programas sociais já debatidos no fim do ano passado, como o Bolsa Família de R$ 600 com adicional de R$ 150.

"Ao avaliar os fatores que poderiam levar à materialização de cenário alternativo caracterizado por uma taxa de juro neutra mais elevada, enfatizou-se a possível adoção de políticas parafiscais expansionistas, que têm o potencial de elevar a taxa neutra e diminuir a potência da política monetária."

Nos mercados, a ata foi lida como reforço da sinalização de que o BC deve manter a Selic em 13,75% por mais alguns meses. O Copom afirmou que ainda há riscos pela inflação "inercial" em todo o mundo e justificou a manutenção da Selic no maior patamar desde 2016 devido às perspectivas de inflação desancoradas no médio prazo (hoje girando em torno de 4% para 2024, acima do centro da meta que o BC deve perseguir, de 3%).

O comitê reforçou que a desinflação vai requerer "paciência" e disse que a desaceleração econômica em curso no Brasil é importante para "garantir a convergência da inflação para suas metas".

O governo vem criticando desde o começo do ano a manutenção da Selic em 13,75%, em meio aos efeitos negativos na geração de empregos e crescimento do PIB, que deve ser menor em 2023. Até a última sexta-feira, 24, a mediana da projeção dos mercados apontava para Selic em 12,75% até o final do ano, com redução de 1 ponto percentual. Muitas casas apostam, no entanto, que os cortes só devem começar no segundo semestre, a contragosto do governo.

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