Economia

Guedes brigou por Levy, mas depois não o queria mais à frente do BNDES

Os seis meses da gestão de Levy no banco foram marcados por atritos com o governo e funcionários

Paulo Guedes: ministro do Economia chegou a conversar em particular com presidente Bolsonaro sobre indicação de Levy para o BNDES (André Coelho/Bloomberg)

Paulo Guedes: ministro do Economia chegou a conversar em particular com presidente Bolsonaro sobre indicação de Levy para o BNDES (André Coelho/Bloomberg)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 17 de junho de 2019 às 07h28.

Brasília — A escolha de Joaquim Levy para a presidência do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) - da qual pediu demissão neste domingo, 16, após ameaça pública - teve vício de origem. O presidente Jair Bolsonaro e três dos seus auxiliares mais próximos na formação da equipe de governo cobraram explicações do então futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, assim que o nome do ex-ministro da Fazenda de Dilma Rousseff e ex-secretário de Fazenda de Sérgio Cabral começou a aparecer no noticiário para a presidência do banco de fomento.

Bolsonaro chamou Paulo Guedes para um conversa com esses auxiliares de confiança, contrários à indicação de Levy. "Estão dizendo que você escolheu o cara errado", foi logo dizendo o presidente eleito. Os seis meses da gestão de Levy no banco foram marcados por atritos com o governo e funcionários.

Uma das preocupações do presidente era com a participação do Levy no famoso jantar, que ficou conhecido como a "festa dos guardanapos", em Paris, quando Cabral foi condecorado pelo governo francês. A foto do jantar, que custou R$ 1,5 milhão, virou um símbolo da farra da corrupção.

Irritado, Guedes pediu uma conversa sozinho com Bolsonaro. Fez uma defesa forte do ex-ministro do governo do PT, um executivo com influência internacional. Diretor do Banco Mundial na época, com passagens em organismos internacionais e no setor financeiro, Levy poderia trazer dinheiro de fora do país para ajudar nos investimentos em infraestrutura que seriam necessários para impulsionar o crescimento da economia.

Guedes botou Levy no telefone com Bolsonaro, que explicou que já esteve a serviço do país em vários governos. Levy acabou sendo nomeando com a chancela de Guedes e Bolsonaro; na posse chegou a dizer que o ministro escolheu os nomes sem interferência política.

Não foi o que aconteceu. Em várias oportunidades de entrevista e "lives", Bolsonaro e seus filhos não perdiam oportunidade, de olho no seu público de apoiadores nas redes sociais, de cutucar o presidente do BNDES. Repetia sempre que era preciso abrir a "caixa preta" do banco, que foi marcado pela política econômica dos governos petistas por empréstimos bilionários para grupos empresariais envolvidos em escândalos de corrupção.

Bolsonaro cobrava nos bastidores uma posição mais firme de Levy sobre os empréstimos feitos para bancar obras na Venezuela, Cuba, Moçambique e Angola durante o governo do PT e que não estão sendo honrados.

O presidente do BNDES insistia que não havia nada que não tivesse sido mostrado. Preparou uma série de perguntas e respostas para detalhar os pontos. Não agradou o presidente e seus auxiliares, que seguiram cobrando a abertura da "caixa preta".

Com Guedes, os problemas começaram já em março, pouco tempo depois da posse. O ministro se mostrava arrependido da escolha de Levy e fazia planos para transferi-lo para um posto do Brasil fora do país assim que tivesse oportunidade.

A insatisfação de Guedes era grande com a resistência do presidente do BNDES em não devolver antecipadamente os empréstimos do Tesouro. Levy botava empecilhos. Mesmo depois da cobrança pública de R$ 126 bilhões dos empréstimos feita pelo secretário especial de Fazenda, Waldery Rodrigues, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo. Para Guedes, o dinheiro do BNDES era importante no objetivo de redução da dívida, uma promessa de campanha de difícil execução diante do avanço dos gastos. Um caminho mais fácil e rápido, já que do lado de cortes das despesas não seria possível.

A insatisfação do ministro era grande também com o ritmo de venda os ativos do banco. Levy alegava que o banco precisaria de recursos com a retomada da demanda. Também dizia que não podia sair vendendo suas participações a qualquer preço.

Levy não percebeu os recados de que Guedes tem como meta reduzir o tamanho do banco. A birra aumentou depois que ele criou duas diretorias na direção contrária à orientação do ministro. Na equipe de Guedes, Levy ficou com carimbo de ter sido cooptado pelo corporativismo dos funcionários do BNDES. Queria que ele tivesse sido rápido em demonstrar aos funcionários o seu novo tamanho e nos esclarecimentos as devoluções para o Tesouro e mostrar aos funcionários importância de pagar o Tesouro.

Levy não administrou a pressão ou não quis fazê-lo por suas convicções. Mas nada justifica a forma como presidente o "demitiu" publicamente ao lhe atacar com críticas publicas.

A queixa do presidente em relação à nomeação de Marcos Barbosa Pinto foi apenas uma desculpa bem arranjada para a saída de Levy. Bolsonaro usou do seu método habitual de forçar uma situação insustentável que force o subordinado a pedir demissão. Teve apoio do ministro.

O seu sucessor, seja quem for, assume uma batata quente, principalmente com o avanço silencioso da CPI do BNDES no Congresso. Terá pela frente a resistência dos funcionários. Cobiçado por muitos, o posto de presidente do BNDES nos últimos tempos mais parece uma cadeira elétrica.

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