Joaquim Levy participa de CPI do BNDES (Cleia Viana/Agência Câmara)
Estadão Conteúdo
Publicado em 26 de junho de 2019 às 18h16.
Última atualização em 26 de junho de 2019 às 18h22.
Brasília - O ex-presidente do BNDES Joaquim Levy disse nesta quarta-feira, 26, que o fim da transferência de recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) para o BNDES pode comprometer as atividades do banco e afetar a democratização do crédito no Brasil. Ele ressaltou, no entanto, que esse movimento deve ser visto como uma política formal do governo e avaliado sob o ponto de vista do papel da instituição no País.
"O que o governo quer do BNDES? Qual o tamanho? Que atividades o governo quer que ele faça?", questionou Levy, em depoimento na CPI do BNDES, na Câmara dos Deputados. Como exemplo, ele citou que as atividades de apoio do banco ao programa de privatizações do governo não precisa de muitos recursos. "O FAT é um funding que tem papel importante na democratização do crédito no Brasil", afirmou. "É importante, para os bancos pequenos, que se tenha um funding estável, de longo prazo, para emprestar para pequenas empresas."
A Constituição Federal determina que 40% dos recursos do FAT sejam transferidos ao BNDES para bancar financiamentos das empresas. O restante é usado para o pagamento do seguro-desemprego e abono salarial.
O fim do repasse obrigatório dos recursos do FAT ao BNDES está no relatório da reforma da Previdência, apresentado pelo deputado Samuel Moreira (PSDB-SP).
A medida, que obriga que o dinheiro seja usado para o pagamento de aposentadorias e pensões, recebeu muitas críticas depois da divulgação. Segundo o Broadcast (sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado) apurou, a ideia é fazer com que o fim do repasse seja gradual. Dessa forma, o "desmame" do BNDES do dinheiro do FAT seria feito ao longo de um período, ainda em análise. O rombo do FAT no ano passado foi superior a R$ 9 bilhões.
Levy ressaltou que o desafio do banco é estar bem capitalizado e ser um banco sólido. Diante da potencial perda de recursos do FAT, segundo ele, técnicos da tesouraria do banco aumentaram a percepção de risco da instituição.
Gustavo Montezano
Sobre o novo presidente do banco, Gustavo Montezano, Levy disse que ele é uma pessoa capaz e afirmou que chegou a convidá-lo para integrar o BNDES. Na época, porém, ele preferiu ficar na secretaria de Desestatização e Desinvestimento do Ministério da Economia e trabalhar com o secretário especial Salim Mattar.
BNDES atual
O ex-presidente do BNDES disse que a instituição financeira hoje é mais transparente e não faz mais empréstimos com juros subsidiados. Segundo ele, os desembolsos do banco hoje estão no mínimo histórico e essa situação deve permanecer no futuro. "Sem dúvida nenhuma, o BNDES hoje é muito mais magrinho do que no passado", afirmou, em depoimento na CPI. Para ele, as consequências dessa decisão para o futuro devem ser avaliadas.
Levy passou a responder a perguntas dos deputados que integram a CPI. Antes, ele já respondeu aos questionamentos do relator da CPI, deputado Altineu Côrtes (PR-RJ).
Inicialmente, ele fez uma breve apresentação separada em três partes: a atuação do BNDES entre 2009 e 2014; seu papel como ex-ministro da Fazenda na devolução de recursos pelo banco ao Tesouro; e sua fase como ex-presidente da instituição financeira.
Ao falar sobre os empréstimos que o BNDES fez para empresas que fizeram obras no exterior, entre 2009 e 2014, Levy disse acreditar que o banco foi vítima das companhias. Também segundo ele, o banco foi vítima de ações de contabilidade fiscal do governo - já que, entre 2011 e 2014, o governo não fez a equalização dos empréstimos.
"Há sinais de que o BNDES foi um pouco empurrado para essas atividades", disse ele, ressaltando o fato de que o governo deixou de usar a linha de financiamento Proex, pois ela exigia recursos do Orçamento, e passou a contar diretamente com o BNDES, o que não elevava o déficit primário.
Ainda sobre os empréstimos para serviços de engenharia, Levy disse que eles se davam dentro do marco legal, em cumprimento a políticas definidas pelos ministérios de Relações Exteriores e Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Segundo ele, porém, a parcela de serviços exportados era pequena na comparação com os bens vendidos ao exterior.
"Infelizmente os itens de maior valor vinham de outros países", disse Levy. "Havia um desequilíbrio. Em um empréstimo de US$ 3 bilhões, US$ 1 bilhão era de elementos importados de outros países e US$ 200 milhões eram serviços", afirmou, ressaltando que outros bancos de desenvolvimento do exterior também participavam desses empréstimos. "Por isso, das várias ações que tomamos em 2015, isso foi bloqueado. Saneamos, resolvemos o problema fiscal, começamos com a devolução dos recursos", acrescentou, já se referindo à sua atuação como ministro da Fazenda.
Levy ressaltou que os serviços de engenharia no exterior normalmente custavam entre US$ 1 bilhão e US$ 1,5 bilhão por ano ao banco, uma parcela pequena dos US$ 80 bilhões financiados anualmente. "Lógico que apesar de os valores serem comparativamente pequenos, eram empréstimos com implicações bastante sérias e que, em anos mais recentes, resultaram em diversas inadimplências e diversas outras questões", disse.
A situação do BNDES hoje, segundo ele, é muito diferente. Ele ressaltou que atualmente há convergência entre a taxa básica de juros, a Selic, e a TLP, utilizada pela instituição para financiamentos.