Economia

Fazenda prioriza frear gastos com BPC e redobra aposta no STF para resolver imbróglio da desoneração

Diagnóstico da equipe econômica é de que regras aprovadas pelo Congresso têm sido insuficientes para cobrir renúncia fiscal. No caso do benefício, alta real do gasto chega a 14,9%

Ministério da Fazenda: governo defende mudanças nas regras dos benefícios para ajustar as contas públicas (EDU ANDRADE/Ascom/MF/Flickr)

Ministério da Fazenda: governo defende mudanças nas regras dos benefícios para ajustar as contas públicas (EDU ANDRADE/Ascom/MF/Flickr)

Publicado em 7 de fevereiro de 2025 às 15h22.

Última atualização em 7 de fevereiro de 2025 às 16h56.

Dois temas sensíveis têm preocupado o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, segundo interlocutores ouvidos pela EXAME: o aumento do gasto com o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e as compensações aprovadas pelo Congresso que tem sido insuficientes para bancar a renúncia fiscal com a desoneração da folha de pagamentos.

No primeiro caso, a despesa com o BPC registrou crescimento real de 14,9% entre 2023 e 2024, bem acima do limite de 2,5% definido pelo arcabouço fiscal para o orçamento público. Na prática, essa expansão acelerada pressionará os demais programas do governo, que precisarão ser achatados para bancar os pagamentos do benefício.

O gasto com o BPC passou de R$ 98,734 bilhões para R$ 113,421 bilhões de um ano para o outro, segundo dados do Tesouro Nacional. O valor desembolsado em 2024 com o pagamento do benefício já corresponde a 1% do Produto Interno Bruto (PIB).

Essa alta é significativa e chamou a atenção da equipe econômica. Em comparação, as despesas primárias do governo central, de janeiro a dezembro do ano passado, registraram queda real de 0,7%.

A avaliação de Haddad, apontam técnicos do governo, é de que as regras para a concessão do benefício foram “afrouxadas” durante o governo Jair Bolsonaro, o que levou ao crescimento significativo nas concessões.

Congresso mudou proposta governista

Em 2024, a ideia da equipe econômica era restringir o pagamento do benefício para portadores de deficiência grave ou média. Essa previsão constou na proposta aprovada na Câmara, mas senadores pressionaram para a retirada dessa regra. Com isso, um acordo foi firmado com o governo e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vetou esse trecho.

O texto sancionado por Lula prevê biometria obrigatória para novos benefícios e atualização cadastral, no mínimo, a cada dois anos. Também determina a realização de cadastro biométrico para receber e manter aposentadoria e pensão. Atualmente a exigência é válida apenas para o BPC.

O benefício, no valor de um salário mínimo por mês, é pago a pessoas com deficiência e idosos com 65 anos ou mais que não têm condições de se sustentar ou serem sustentados pela família. Para ter direito ao benefício, é preciso que a renda per capita do domicílio do beneficiado seja entre 25% e 50% do salário mínimo (entre R$ 379,50 e R$ 759). Caso outra pessoa no domicílio já receba o BPC, o benefício desta pessoa não fará parte do cálculo.

Diante do crescimento das despesas, Haddad deve debater o tema com Lula e com o Congresso para buscar uma alternativa para frear o crescimento desse gasto público. Mas nenhuma proposta está definida e as conversas com o Legislativo ainda devem começar.

Desoneração da folha deve voltar ao Judiciário

No caso da desoneração da folha de pagamentos, o diagnóstico no Ministério da Fazenda é de que as propostas aprovadas pelo Congresso são insuficientes para bancar a renúncia fiscal. Os dados de arrecadação de janeiro, segundo interlocutores de Haddad, confirmam esse cenário e serão apresentados pela Receita Federal e pelo Tesouro.

Com isso, o governo deve recorrer novamente ao Supremo Tribunal Federal (STF) para solucionar o impasse. O caso é relatado pelo ministro Cristiano Zanin.

Haddad tem afirmado publicamente que a desoneração da folha de pagamentos e o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse) implicaram renúncia fiscal de R$ 45 bilhões em 2024.

Sem esses benefícios, o governo teria registrado superávit primário no ano passado, apontam técnicos do governo. No caso do Perse, o programa termina em março. Mas no caso da desoneração, o impasse para a compensação continua.

Pelo texto aprovado pelo Congresso, a reoneração gradual da folha de pagamentos terá duração de três anos, de 2025 a 2027.

A lei manteve a desoneração integral em 2024 e estabeleceu a retomada gradual da tributação a partir de 2025, com alíquota de 5% sobre a folha de pagamentos. Em 2026, serão cobrados 10% e, em 2027, 20%.

Durante toda a transição, a folha de pagamentos do 13º salário continuará integralmente desonerada.

Entre as soluções propostas pelo Congresso para bancar a renúncia fiscal estão:

  • a captura de depósitos esquecidos em contas judiciais por mais de cinco anos;
  • a abertura de um novo prazo de repatriação de recursos no exterior com taxas menores;
  • atualização do valor de bens (como imóveis) no IR, com desconto na cobrança;
  • um programa de descontos para empresas que tenham multas vencidas em agências reguladoras;
  • e a ampliação e modernização do Cadin.

Há também outras alternativas já apontadas pelo governo para bancar a renúncia fiscal com o desoneração, como o aumento das alíquotas da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e dos Juros sobre Capital Próprio (JCP). O texto com essas medidas, inclusive, já tramita no Legislativo e foi enviado em conjunto com a indicação de Gabriel Galípolo para presidir o Banco Central (BC)

No caso da JCP, a proposta chegou a tramitar entre as alternativas aprovadas pelo Congresso, mas foi retirada do texto após pressão dos parlamentares.

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