Para contornar os prejuízos criados pela mudança de hábito no exterior, os produtores locais se organizam para criar uma empresa que levará às prateleiras dos brasileiros o suco tipo exportação (Stock.xchng)
Da Redação
Publicado em 17 de junho de 2013 às 10h42.
São Paulo - A americana Joanna Escandon, hoje com 32 anos, cresceu ouvindo a avó repetir uma recomendação: Não esqueça de beber o alimento para o cérebro. Tratava-se do suco de laranja, desses que se compram prontos no supermercado, que a família bebia em todas as refeições.
Há três anos, seguindo uma tendência em seu país, tirou o suco pronto do cardápio. Desde 2010, cerca de 200 mil litros de suco de laranja industrializado deixaram de ser consumidos nos Estados Unidos, um dos principais mercados do Brasil.
Suco a menos por lá significa laranja a mais por aqui. De cada cinco copos consumidos no mundo, três saem do Brasil e, principalmente, das três maiores indústrias do setor no mundo, que estão instaladas no interior de São Paulo: Cutrale, Louis Dreyfus Commodities e a nova empresa que reúne Citrovita e Citrosuco.
Nos últimos seis anos, o Brasil deixou de exportar o equivalente a 220 milhões de laranjas na forma de suco - volume equivalente a quase uma safra e meia da Flórida (EUA), outra região que é referência na produção mundial de laranja. Para contornar os prejuízos criados pela mudança de hábito no exterior, os produtores locais se organizam para criar uma empresa que levará às prateleiras dos supermercados brasileiros o suco tipo exportação.
Essa companhia não terá terras com laranjais ou indústrias com linhas de produção, diz Ibiapaba Netto, diretor executivo da CitrusBR, entidade do setor que participa da formatação do modelo de negócio.
Será um consórcio que reunirá as indústrias e os produtores e a sua tarefa será divulgar a marca, ainda não definida, e gerenciar os prestadores de serviço contratados para embalar e transportar o suco produzido pelos parceiros. O negócio deve entrar em operação ainda neste ano e a previsão é de que consuma R$ 9,7 bilhões em investimentos até 2020.
Consecitrus
Uma das alternativas cogitadas pelo setor é criar o Conselho de Produtores e Exportadores de Suco de Laranja (Consecitrus), para que ele assuma essas funções.
O Consecitrus reunirá a CitrusBrasil, representando as indústrias do setor, e, do lado dos produtores, a Sociedade Rural Brasileira, a Alicitros, que congrega produtores de laranja de Limeira, no interior de São Paulo, e a cooperativa Cocamar, do Paraná, que conta com produtores de laranja do Norte e Nordeste do Estado.
A criação do Consecitrus está em análise no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), órgão que avalia a fusão e criação de empresas no Brasil para evitar concentração de mercado.
Há três razões para o negócio focar na venda do suco tipo exportação. A primeira é aliviar os excedentes de produção que estão se formando por causa da estagnação do consumo global e criar um alternativa de mercado para um setor, hoje muito dependente das exportações. Em dezembro de 2012, o estoque de suco no Brasil quase bateu em 1,2 milhão de litros - o equivalente a um ano de produção.
Mais do que liberar os estoques, a estratégia vai reduzir a forte dependência que o setor tem do mercado externo, diz Marcos Fava Neves, pesquisador e professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade Universidade de São Paulo em Ribeirão Preto. Cerca de 90% do faturamento do setor da laranja vêm da exportação - não há setor no Brasil tão vulnerável às oscilações do mercado internacional.
O segundo motivo: o suco para exportação é feito com 100% de laranja, um produto quase desconhecido pelos brasileiros. A grande maioria dos sucos vendidos no Brasil são néctares: sucos diluídos.
Algumas marcas chegam a ter 70% de água. Dos 778 milhões de litros de sucos vendidos no Brasil no ano passado apenas 55 milhões eram naturais e a maioria, de uva. Ao desbravar um nicho, os fabricantes não vão entrar em concorrência direta com seus clientes, as indústrias de bebidas, que detêm as principais marcas de néctares no País.
Por fim, a decisão de atuar em um nicho de mercado também reduz o risco do Cade vetar a criação do novo negócio, Como o trio controla a produção, se criasse uma empresa para disputar espaço com os néctares dificilmente obteria sinal verde para operar.
Isenção de impostos
Para oficializar a criação da nova empresa, o setor aguarda apenas uma pendência: conseguir que o governo dê isenção de impostos para o suco de laranja 100%. Com a desoneração, o produto poderá custar aproximadamente R$ 4, praticamente a metade do preço atual. O governo não terá perda de receita, porque a venda desse tipo de suco praticamente não existe, diz João de Almeida Sampaio Filho, consultor de agronegócio e ex-secretário de agricultura do estado de São Paulo.
Em contrapartida, um número maior de consumidores terá acesso a um produto natural. O setor apresentou o projeto à secretaria de Finanças do governo do Estado de São Paulo e ao ministério da Fazenda. Os órgãos ainda não se pronunciaram.