Sede do Banco Central: em 2013, essas expectativas ruins foram responsáveis por 10,7% do IPCA do ano (João Ramid/Veja)
Da Redação
Publicado em 15 de outubro de 2014 às 09h06.
Brasília - Diante da elevação dos gastos do governo e de uma política monetária que é considerada pelo mercado financeiro como "leniente", o governo tem perdido o controle sobre as chamadas "expectativas de inflação".
A contribuição dessa percepção do mercado como combustível para o custo de vida, segundo estimativas de analistas ouvidos pelo Broadcast, serviço em tempo real da Agência Estado, pode chegar ao maior nível desde 2003, quando tomou posse o presidente Luiz Inácio Lula do Silva.
Em 2013, essas expectativas ruins foram responsáveis por 10,7% do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) do ano, mostram dados coletados em relatórios de inflação do Banco Central.
A evolução dos dados mostra uma escalada dessas expectativas e do repasse dessa piora de percepção para os índices de inflação. Em 2002, as expectativas no Boletim Focus chegaram a 12,64%. Ao fim do ano, o IPCA ficou em 12,53%. Em 2003, no auge do pessimismo do mercado financeiro, a projeção de mercado para a inflação atingiu 12,56% em março.
O indicador de custo de vida, no entanto, recuou ao longo do ano, fechando em 9,30%. Ou seja, a percepção ruim dos agentes econômicos sobre o custo de vida teve peso de 18,3% no IPCA - o equivalente a 1,7 ponto porcentual.
Na decomposição da inflação, as expectativas só tiveram mais peso do que as atuais no ano da posse do presidente Lula. "Neste ano, dificilmente o peso das expectativas será menor que o do ano passado. Elas se deterioraram demais", diz Mauro Schneider, economista-chefe da CGD Securities. O BC informou que não comentaria.
Para 2014, o Banco Central ainda não divulgou projeções. Esse dado só deve ser conhecido no primeiro Relatório Trimestral de Inflação (RTI) do próximo ano. Mas, no mercado, estima-se um índice ligeiramente superior ao registrado em 2013: entre 11% e 12% do IPCA do ano deve derivar das chamadas expectativas desancoradas.
"O que acontece agora é que há uma percepção do mercado de que o Banco Central não está mais buscando uma inflação de 4,5% como meta. Isso afeta a decisão dos formadores de preço", diz Luciano Rostagno, estrategista-chefe do Banco Mizuho.
Flávio Serrano, economista do Espírito Santo Investment Bank, faz avaliação semelhante: "Dado que os agentes têm essa percepção de que o BC tem mirado em uma inflação mais alta, está se cristalizando um cenário de custo de vida elevado".
Pelo Boletim Focus, ao menos até 2018 não é possível ver a inflação no centro da meta, um IPCA de 4,5%. "As expectativas têm grande importância para a inflação", diz Carlos Thadeu de Freitas Filho, economista da gestora de recursos Franklin Templeton. "Enquanto o governo não der uma guinada na questão fiscal, não tem como ancorar as expectativas."
"Se pensarmos que há pelo menos há quatro anos temos uma inflação que não cede e um quadro de baixo crescimento, é natural uma deterioração das expectativas", diz Schneider.
Lula
Analistas lembram que a eleição e posse do presidente Lula foi um período de grande instabilidade, com disparada do dólar e incertezas sobre a continuidade do tripé macroeconômico.
No entanto, eles ponderam que os momentos atuais, apesar de serrem considerados de tensão, não carregam o mesmo nível de estresse e não esperam a repetição do quadro econômico daquele período. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.