Economia

EUA querem bloquear todos os negócios de tecnologia com a China

Novas restrições que Washington planeja adotar já começam a assustar empresa e afastar pesquisa e inovação do território americano

Huawei: governo norte-americano trava embate com a gigante de tecnologia chinesa (Alex Tai/SOPA Images/LightRocket/Getty Images)

Huawei: governo norte-americano trava embate com a gigante de tecnologia chinesa (Alex Tai/SOPA Images/LightRocket/Getty Images)

AO

Agência O Globo

Publicado em 17 de fevereiro de 2020 às 18h12.

A política do governo Trump de evitar que a China domine o mercado de tecnologia está colocando os Estados Unidos em rota de colisão com as próprias empresas americanas que busca proteger.

Companhias especializadas em microchips, inteligência artificial e outros setores estão alarmadas com os esforços envidados pelo governo para restringir o fluxo de tecnologia americana para a China. Elas alertam que isso poderia afastar dos EUA especialistas, pesquisas importantes e receitas essenciais no mercado tech, erodindo a liderança do país.

Os temores das empresas aumentaram depois da revelação de que o Deparamento de Comércio estuda adotar medidas para bloquear transações entre companhias americanas e chinesas.

As novas regras, junto com novas restrições a investimentos chineses nos EUA e outras normas que proibiriam a exportação para a China de certos produtos, além de vedar o compartilhamento de tecnologias, fizeram a indústria de tecnologia acender o sinal vermelho. A General Electric (GE), por exemplo, vende peças de avião à China, em parceria com a francesa Safran.

As medidas de Washington já levaram empresas estrangeiras a descartar o uso de tecnologias e componentes americanos por medo de que o acesso a eles poderia ser abruptamente cortado.

Altas autoridades americanas planejam se reunir em 28 de fevereiro para discutir novas restrições à China, o que poderia incluir não só sanções à GE, como bloquear o acesso da gigante chinesa de telecom Huawe a tecnologias americanas.

Se, por um lado, há consenso em Washington de que a China representa uma ameaça à segurança nacional e que os EUA devem proteger as indústrias locais para manter a liderança tecnológica, por outro a indústria tech americana avisou que limitar o acesso chinês a produtos locais pode prejudicar as empresas e tirar o país da posição de maior núcleo de pesquisa e desenvolvimento do mundo.

Segundo os empresários americanos do setor, as companhias não têm escolha senão sediar suas áreas de pesquisa e desenvolvimento de novas tecnologias fora dos EUA, para assim garantir livre acesso à China — um mercado consumidor que cresce rapidamente e também o centro da cadeia global de fornecimento de eletroeletrônicos.

De modo que dólares estão indo para centros de pesquisa em lugares como Canadá, Israel e Reino Unido, entre outros, longe do alcance das restrições do governo Trump.

— Quem pensa que os temores [das empresas] são exagerados deve conversar com os trabalhadores da indústria de semicondutores  que já estão perdendo seus empregos com o muro que estão construindo em torno de nosso mercado — diz John Neuffer, presidente da Associação da Indústria de Semicondutores dos EUA. — O faturamento que vem daquele grande mercado [a China] é o que alimenta nosso forte investimento em pesquisa, que nos permite inovar e fomentar o crescimento econômico americano, bem como a segurança nacional.

A Fundação RISC-V, entidade sem fins lucrativos que criou um padrão de software de código aberto para chips de smartphone e outros aparelhos, reconheceu que, recentemente, mudou suas operações do estado de Delaware para a Suíça, devido ao medo de regulações mais estritas de Washington.

— Se esse governo continuar na atual trajetória, veremos cada vez mais defecções de empresas e cientistas. Eles pegarão suas pesquisas e irão para outros lugares, cujas economias se beneficiarão de seu trabalho — afirma Scott Jones, professor do Stimson Center.

Um comunicado da IBM instou o Departamento de Comércio a "voltar ao quadro-negro" e rever as novas medidas, dizendo que elas são muito vagas e vão afastar as empresas dos EUA dos mercados globais e de fornecedores.

A Internet Association, de que fazem parte Google e Facebook, disse que a proposta não tem "salvaguardas substanciais", como deveria. E até a Motion Picture Association alertou que ela poderia prejudicar transações internacionais dos estúdios de Hollywood na área de efeitos especiais e animação.

Ameaça sobre Huawei

Enquanto isso, Trump ameaçou parar de compartilhar informações de inteligência com os países europeus que aceitarem trabalhar com o grupo chinês de telecomunicações Huawei no desenvolvimento da rede 5G, afirmou o embaixador americano na Alemanha, Richard Grenell.

Washington pressiona os países europeus para que não deem acesso a suas redes de telecomunicações 5G a Huawei, pelo temor de que a empresa facilite a espionagem chinesa.

"Trump deu instruções para dizer claramente que qualquer nação que decida utilizar um operador 5G que não seja digno de confiança coloca em risco nossa capacidade de compartilhar informações de inteligência no mais elevado nível", escreveu Grenell no Twitter.

O embaixador explicou que Trump fez uma ligação do avião presidencial Air Force One para transmitir a mensagem.

Aliados europeus chaves, entre eles Reino Unido e França, indicaram que não pretendem impedir a Huawei de participar em suas futuras redes 5G, mas destacaram que devem impor restrições à empresa.

À margem da conferência sobre segurança de Munique, no fim de semana, o chefe da diplomacia americana, Mike Pompeo, comparou a Huawei a um cavalo de Troia. Ele disse que a participação da empresa nas redes 5G ocidentais seria o equivalente a transferir os dados de todos os usuários ao "Partido Comunista Chinês e ao serviço secreto chinês".

O chefe da diplomacia chinesa, Wang Yi, também presente em Munique, pediu aos países europeus que adotem uma "decisão independente e sábia, respeitando a equidade para todas as empresas".

O governo dos Estados Unidos incluiu a Huawei em uma lista negra em maio de 2019, obrigando de fato as empresas americanas e as que operam em seu território a encontrar outros fornecedores de equipamentos de telecomunicações.

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