Alexandre Tombini, presidente do Banco Central: ele foi um dos membros do Copom a votar a favor da elevação da taxa Selic (Goh Seng Chong/Bloomberg News)
Da Redação
Publicado em 31 de outubro de 2014 às 12h21.
Entre a cruz e a espada. Esse deve ter sido o ânimo na reunião do Banco Central de quarta-feira e que resultou na maior surpresa dos últimos anos em uma decisão sobre a taxa básica de juro, com os oito membros do Comitê de Política Monetária (Copom) encurralados por um cenário de preços em alta e atividade econômica anêmica.
O mandato oficial do BC é zelar pelo controle da inflação. Mas também não se pode fechar os olhos completamente para os efeitos finais que cada passo da política monetária tem em empresários e consumidores.
Para os cinco membros do Copom, entre eles o presidente do BC, Alexandre Tombini, que optaram por elevar a Selic em 0,25 ponto percentual, uma das variáveis levada em consideração foi o mercado de trabalho ainda bastante robusto no país.
A visão deles --ou aposta, podem dizer alguns-- é de que o forte nível de emprego ajudaria a amortecer os efeitos perversos que uma alta na Selic tem na economia real, já fragilizada.
Ninguém esquece que o Brasil entrou em recessão técnica no primeiro semestre, situação que não acontecia desde a crise financeira global de 2008/2009.
Menos exuberante, é verdade, mas os indicadores de trabalho ainda têm seu brilho e foram bastante usados pela presidente Dilma Rousseff (PT) em sua campanha para a reeleição, garantida no domingo passado.
A taxa de desemprego medida pelo IBGE fechou setembro em apenas 4,9 por cento, mesmo com a criação de vagas formais tendo sido a menor para o mês em 13 anos, mostrou o Mistério do Trabalho.
Enquanto isso, a renda real --descontada a inflação-- continua em alta: a média dessa variável de janeiro a setembro cresceu 2,65 por cento ante igual período de 2013.
Cinco membros do Copom decidiram elevar a Selic para 11,25 por cento ao ano, enquanto outros três votaram por sua manutenção em 11 por cento, patamar em que a taxa ficou estagnada desde abril passado após um ciclo de aperto monetário que tirou o juro da mínima histórica de 7,25 por cento.
A manutenção da Selic no nível de 11 por cento até a penúltima reunião do BC, no começo de setembro, ocorreu apesar de a inflação medida pelo IPCA ter rompido em vários momentos o limite superior da meta do governo --de 4,5 por cento pelo IPCA, com margem de dois pontos percentuais para mais ou para menos.
Muitos entendiam que o BC estava evitando elevar os juros para não comprometer ainda mais o crescimento econômico, às vésperas de uma eleição presidencial na qual Dilma encarou chances reais de derrota contra dois adversários: primeiro para Marina Silva (PSB) e, depois, para Aécio Neves (PSDB).
O novo ciclo de aperto monetário vai moderar a busca por empréstimos, reconheceu o próprio BC nesta quinta-feira, mas a autoridade ainda acredita que a expansão do mercado de crédito no país será de 12 por cento neste ano, abaixo dos quase 15 por cento vistos em 2013.
Ainda assim, isso não é nada mal perto da expansão do Produto Interno Bruto (PIB) de apenas cerca de 0,3 por cento neste ano, como projetam economistas.
É claro que o mercado de trabalho não é uma espécie de varinha de condão que, num passe de mágica, é capaz de anular os efeitos na atividade econômica do novo ciclo de alto do juro iniciado agora.
Existe aí também o fator expectativas que, no pós-eleições, tem se desenhado diferente daquele que imperava até poucos dias antes da votação de 26 de outubro, com agentes econômicos e investidores céticos quanto às chances de mudanças na política econômica num segundo mandato de Dilma.
A alta surpresa da Selic está sendo capaz de alimentar esperanças contrárias de que, de fato, a política econômica pode ser diferente daqui para frente. Para citar dois exemplos, com a crença de que o BC conseguirá fazer o que tem de ser feito para domar a inflação e de que até a política fiscal será melhor conduzida.
Ou seja, com os novos rumos do governo, empresários e consumidores tendem a ficar mais animados e, mesmo com o peso de juros mais altos imediatamente, olhem para frente com menos pessimismo.
De novo: trata-se aqui de uma visão. Ou aposta? * Esta coluna foi publicada em 30 de outubro no terminal financeiro Eikon, da Thomson Reuters.