Bandeiras de campanha com os rostos da presidente argentina, Cristina Kirchner, e de Martin Insaurralde, candidato a deputado (Juan Mabromata/AFP)
Da Redação
Publicado em 30 de outubro de 2013 às 21h55.
Buenos Aires - Dois dias após ser castigado nas urnas, o kirchnerismo teve um contundente triunfo na longa batalha judicial que começou há quatro anos contra o grupo multimídia Clarín pela lei de meios audiovisuais, declarada constitucional na terça-feira pela Suprema Corte argentina.
Em plena ressaca eleitoral, a decisão deu um respiro para o governo, a quem muitos já garantiam uma morte lenta daqui até as eleições presidenciais de 2015, após o revés sofrido no pleito legislativo de domingo e da incerteza sobre a saúde da presidente Cristina Kirchner e o retorno a suas funções.
A sentença, que considerou a lei constitucional por seis dos sete magistrados da Corte, encerra quatro anos de disputas e enfrentamentos judiciais entre o Estado argentino e o grupo Clarín sobre a validade ou não de quatro artigos da norma, mas abre uma nova batalha em relação a sua aplicação.
Juristas e analistas preveem um longo processo pela frente para a adequação à lei não só do principal grupo multimídia da Argentina, mas de outros 37 conglomerados de mídia que já apresentaram seus planos de adaptação, como estabelece a norma sancionada pelo Congresso em 2009.
'A própria Corte deixa a porta aberta para o Clarín questionar se no processo de adequação que deve realizar se receberá tratamento justo por parte do Estado', levantou Martín Becerra, especialista em imprensa e professor da Universidade de Quilmes.
A lei fixa para os meios privados de difusão nacional um máximo de 35% do mercado em cobertura de televisão aberta e 35% de assinantes em televisão a cabo, 10 licenças de rádio, 24 de televisão a cabo e uma de televisão por satélite.
Aplicada estritamente, a partir de agora o Clarín precisaria vender 15 licenças de rádio AM e FM e de televisão aberta e 222 licenças de televisão por assinatura, segundo a Autoridade Federal de Serviços de Comunicação Audiovisual (Afsca), organismo responsável pela aplicação da norma.
Com essa eventual venda, o grupo de comunicação poderia inclusive 'solicitar uma indenização pelos danos e prejuízos que pudesse sofrer' no processo, alertou Becerra.
Por ser o mais poderoso, o Clarín é o principal afetado pela norma, que repercutirá em outros grupos de comunicação da Argentina ou com interesses no país, como o espanhol Prisa.
No total, segundo a Afsca, se a lei for cumprida devem ser colocados à venda mais de 330 meios, entre licenças e frequências de rádios AM e FM, canais de TV de cabo e aberta e serviços de TV por assinatura.
Apesar do corte de licenças, tanto a Corte Suprema como especialistas em meios de comunicação garantem que a aplicação da norma 'não põe em xeque a liberdade de expressão'.
'A primeira parte da decisão, dos fundamentos usados pela Corte, ajuda a entender que a liberdade de expressão não estava em jogo nesta causa como o Clarín pretendia sustentar', afirma Becerra.
Ricardo Lorenzetti, presidente do máximo tribunal argentino, assegura que 'a postura tradicional' do Supremo é que 'os direitos de propriedade, quando têm vinculação com licenças, se protegem com uma indenização'.
Lorenzetti também nega que a decisão a favor da lei seja produto de um pacto com o governo, como denunciaram alguns setores da oposição, por ter se tornado pública só dois dias depois dos resultados das eleições legislativas.
O certo é que para o kirchnerismo a resolução a seu favor representa uma baforada de ar fresco em um entorno que estava se tornando hostil, sem a presença de Cristina e com uma oposição mais forte depois d eleitoral.
Tanto é assim, que após uma exagerada discrição sobre o estado de saúde da presidente, seu entorno começa a dar sinais de um próximo retorno.
Alguns meios, como o jornal La Nación, asseguram que os médicos autorizaram a governante 'a ler os jornais e relatórios gerais do governo a partir de hoje', com a notícia da decisão da Corte sobre a lei de meios ocupando todas as manchetes. EFE