Economia

Em 20 anos, moeda que derrubou hiperinflação perde valor

A moeda que derrubou a inflação foi lentamente corroída por ela: uma nota de R$ 100 hoje compra apenas o equivalente ao que R$ 21,75 comprariam há duas décadas


	Nota de cem reais queimada: inflação de julho de 1994 até maio de 2014 chega a 359,89%
 (EXAME)

Nota de cem reais queimada: inflação de julho de 1994 até maio de 2014 chega a 359,89% (EXAME)

DR

Da Redação

Publicado em 1 de julho de 2014 às 10h15.

Brasília - Em 20 anos de existência, a moeda que derrubou a inflação foi lentamente corroída por ela.

De acordo com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a inflação oficial acumulada de julho de 1994 até maio deste ano (último dado disponível) chega a 359,89%.

Uma nota de R$ 100 hoje compra apenas o equivalente ao que R$ 21,75 comprariam há duas décadas.

Os levantamentos de preços da cesta básica do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) mostram o poder da inflação.

O quilo da carne em São Paulo, que custava R$ 3,21 em 1994, hoje vale R$ 19,53 em média.

O quilo do tomate no Rio de Janeiro, que saía por R$ 0,44 há 20 anos, atualmente é vendido por R$ 5,04 em média.

No Recife, o quilo do pão saltou de R$ 1,46 no início do Plano Real para R$ 7,63 hoje.

O comportamento da inflação, no entanto, não significa que o brasileiro tenha ficado mais pobre nesse período.

Ao mesmo tempo em que os preços aumentaram 359%, a renda média do trabalhador brasileiro aumentou 426%, mais do que a inflação acumulada no período.

De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o rendimento médio nominal da população empregada subiu de R$ 382,73 em 1994 para R$ 2.013,50 em 2014.

Funcionária de uma empresa estatal, Maria de Lourdes Xavier, 66 anos, é testemunha do crescimento da renda média nos últimos 20 anos.

Ela, no entanto, recorda que os primeiros anos após o Plano Real foram difíceis.


“Fiquei sem duas cadernetas de poupança para comprar comida, pois não havia aumento bom de salário. Só voltei a conseguir economizar alguma coisa em anos mais recentes”, diz.

Segundo o economista Carlos Eduardo Freitas, diretor do Banco Central por duas vezes, de 1985 a 1988 e de 1999 a 2003, o aumento da renda do brasileiro está relacionado a dois fatores: o crescimento do emprego formal e à própria teoria econômica, que prevê a neutralidade da moeda no longo prazo.

“Na economia, o que conta não são os preços monetários, mas os preços relativos, que estão sempre se ajustando. Os salários nada mais são do que o preço do trabalho e tendem a acompanhar a inflação, embora isso demore algum tempo”, explica.

Os preços relativos representam o número de unidades de um produto que compra outro bem.

Para Freitas, o Plano Real só foi bem-sucedido porque a Unidade Real de Valor (URV), na prática, dolarizou a economia sem precisar trocar a moeda nacional por dólares.

“O congelamento de preços de outros planos econômicos provocava o desalinhamento dos preços relativos porque vinha de surpresa. Alguns preços tinham passado pela correção monetária. Outros, não. A URV deu alguns meses para que todos os preços se alinhassem ao dólar, ajustando os preços relativos”, relembra.

Diretor técnico do Dieese, Clemente Ganz tem opinião diferente.

Segundo ele, o sucesso do Plano Real está não apenas no alinhamento dos preços relativos, mas na redistribuição de renda a favor dos trabalhadores.

“A estabilização do poder de compra da moeda é importante. Agora, o que determina a transferência da renda para o trabalhador é a ação política nas negociações entre patrões e empregados”, diz.

No ano passado, segundo o Dieese, 87% das categorias conquistaram reajustes reais (acima da inflação), mesmo num cenário de baixo crescimento da economia e de inflação alta.

“Com o bom desempenho do mercado de trabalho nos últimos anos, os empregados ganham poder para conseguir aumentos acima da inflação e impedir a renda de ser corroída”, ressalta o diretor do Dieese.

Acompanhe tudo sobre:economia-brasileiraEstatísticasIBGEIndicadores econômicosInflaçãoIPCAPreçosReal

Mais de Economia

Oi recebe proposta de empresa de tecnologia para venda de ativos de TV por assinatura

Em discurso de despedida, Pacheco diz não ter planos de ser ministro de Lula em 2025

Economia com pacote fiscal caiu até R$ 20 bilhões, estima Maílson da Nóbrega

Reforma tributária beneficia indústria, mas exceções e Custo Brasil limitam impacto, avalia o setor