Presidentes Donald Trump e Xi Jinping: os dois países estão no centro das atenções em 2020 (Damir Sagolj/Reuters)
Karin Salomão
Publicado em 7 de fevereiro de 2020 às 10h00.
Última atualização em 7 de fevereiro de 2020 às 11h00.
Paris - Como grandes potências mundiais, as movimentações e tendências nos Estados Unidos e na China são acompanhadas de perto pelo mundo todo. Este ano, as eleições presidenciais americanas e a epidemia de coronavírus no país asiático são as grandes incertezas envolvendo os dois países.
Essas incertezas não afetam apenas as potências globais, mas também o comércio e crescimento global, de acordo com especialistas presentes no evento Conferência de Riscos para Países da Coface, seguradora de créditos francesa.
Além disso, a China é o principal parceiro comercial de diversos países. "Mesmo que um país não venda diretamente para a China, a economia chinesa afeta diretamente os preços de diversas commodities", diz Julien Marcilly, economista-chefe da Coface.
De acordo com a Coface, os Estados Unidos têm um nível de risco “baixo” e a China, um nível “relativamente alto” em relação a crédito.
O Brasi, como comparação, tem um risco “relativamente alto” como país - o ambiente de negócios tem risco “razoável”. Por outro lado, a Coface revisou o risco do segmento de construção brasileiro, que está se recuperando da crise e deve se fortalecer com a taxa de juros baixa.
A pesquisa da Coface foi divulgada esta semana em um evento em Paris, França.
O ano é marcado pela eleição presidencial nos Estados Unidos. O presidente Donald Trump — exceto alguma surpresa — vai concorrer à reeleição e apenas em julho, depois de eleições primárias, o Partido Democrata deve anunciar o nome de quem irá disputar o cargo.
"Trump realmente encontrou encontrou lugar entre os conservadores americanos e começou a desafiar ideais liberais. É um processo irreversível", diz Gérard Araud, ex-embaixador francês nos Estados Unidos.
O crescimento da economia americana deve ser um ponto a favor do atual presidente. "Se você analisa a taxa de desemprego e de crescimento, o histórico de Trump na presidência é bom", disse Fabrice Brégier, presidente da Palantir France, companhia de tecnologia de análise de dados e ex-diretor da Airbus, no evento da Coface.
A história de crescimento da economia americana pode ajudar na reeleição de Trump. "Desde os anos 1970, nenhum presidente americano perde reeleição com a economia crescendo", diz a economista Vitoria Saddi, professora do Insper e que trabalhou em instituições como JP Morgan e Citibank, em entrevista a EXAME. Além disso, afirma ela, o impasse dos democratas de indicarem um candidato enfraquece a oposição.
A reeleição de Trump poderia impactar na construção de acordos comerciais multilaterais - vide a recente disputa com a China, dizem os especialistas.
"Trump não acredita em uma política de 'América em primeiro lugar', mas sim em construir uma 'América em único lugar'", diz Araud. Para ele, as políticas externas de seu governo demonstram que o presidente americano não trabalha preferencialmente para a construção de acordos com aliados, mas sim que tem o interesse dos americanos em primeiro lugar.
Sobre os acordos com a China, Brégier disse que "você pode criticar sua personalidade e o seu método de negociação, mas no fim Trump chegou a um acordo com a China aceito pelos dois lados", afirma o empresário.
O crescimento global encolheu 0,75 pontos percentuais no ano passado, para 2,5%, e deve continuar encolhendo esse ano, cerca de 2,4%, de acordo com estimativas da Coface. O ano de 2019 marcou a primeira queda no comércio global em 10 anos e deve crescer apenas 0,8% este ano, como consequência.
Para Vinícius Vieira, professor de relações internacionais na FGV e na Faap, essas tensões também revelam a perda do lugar de potência global dos Estados Unidos, com a ascensão de novos poderes como a China. "A disputa com a China foi uma forma que Trump usou para levantar bandeiras políticas. Não foi eficiente do ponto de vista econômico, mas sim do ponto de vista político", diz Vieira em entrevista a EXAME. O objetivo é engajar a população americana em torno de sua causa, afirma o professor.
Cada vez mais relevante globalmente, o ano também é significativo para a economia chinesa. A renda per capita dos chineses dobrou desde 2010 e, em 2021, será comemorado o centenário da fundação do partido comunista na China.
Por isso, o impacto da epidemia do coronavírus é tão relevante. Segundo Agatha, os chineses acabaram de passar pelo Ano Novo (comemorado no dia 25 de janeiro), momento em que os consumidores costumam sair para jantar com amigos, ir ao cinema, viajar e fazer compras. Agora, segundo ela, as ruas estão vazias e a falta de consumo pode prejudicar a economia.
Empresas como a Apple, Levi Strauss, McDonald's e Starbucks, fecharam suas lojas e operações provisoriamente no país. A paralisação pode afetar empresas americanas que têm fábricas na China, como Apple, Tesla e AB Inbev.
As lojas devem continuar fechadas em algumas cidades até a segunda quinzena de fevereiro. De acordo com Agatha Kratz, diretora da empresa de pesquisa Rhodium Group, cerca de 80% das companhias pequenas chinesas podem se manter fechadas por apenas mais duas semanas antes de terem problemas financeiros mais graves.
Já segundo André Chieng, vice-presidente do Comitê França-China e chairman, da empresa de comércio Asiatique Européenne de Commerce, a crise deve terminar mais cedo do que o esperado.
De acordo com ele, a abertura de um hospital inteiramente dedicado ao cuidar do coronavirus, construído em apenas 15 dias, é um exemplo da rapidez da resposta do governo chinês.
Exame viajou a Paris, França, a convite da Coface.