Joseph Stiglitz, ganhador do Prêmio Nobel de Economia: 'pode ser que seja o fim do euro'
Da Redação
Publicado em 19 de junho de 2012 às 13h53.
São Paulo - A economia brasileira continua protegida dos efeitos da crise política. Essa é a avaliação do economista Joseph Stiglitz, ganhador do Prêmio Nobel de economia em 2001. "Não há razão para acreditar que as dificuldades políticas contaminarão a economia", disse Stiglitz, após participar de um seminário em São Paulo. Para ele, a blindagem da economia vem ocorrendo porque houve, nos últimos anos, uma "institucionalização da política econômica no Brasil". "A condução da economia, hoje, depende menos de nomes e caras e mais de instituições".
O economista ressaltou, porém, que há fatores que ameaçam essa separação entre política e economia. Crítico da abertura do mercado de capitais, Stiglitz disse que o fato de não haver controles para a entrada e a saída de recursos deixa o país vulnerável ao humor dos investidores internacionais. "O mercado financeiro ainda acredita que o Brasil é uma boa história, mas isso pode mudar", declarou. "Inúmeros fatores podem abalar a confiança dos investidores, como um descontrole orçamentário ou um Congresso tentando se aproveitar da crise".
Apesar de elogiar alguns pontos da política econômica brasileira como a tentativa de redução do déficit público , Stiglitz voltou a criticar os altos juros praticados pelo Banco Central e disse que, em certos aspectos, a Argentina está melhor que o Brasil. "A Argentina fez o certo ao renegociar uma grande parte de sua dívida e também ao concentrar a recuperação de sua economia no mercado interno, depois da crise de 2001", disse. "A visão era a de que, se a economia se recuperasse, os estrangeiros voltariam. Estava certo". O economista também elogiou o governo Néstor Kirchner pelo embate contra o Fundo Monetário Internacional (FMI). "Ele ignorou o FMI e teve sucesso".
Em entrevista exclusiva a EXAME, Stiglitz disse ainda que a Argentina "tem uma enorme vantagem em relação ao Brasil". "O país conseguiu renegociar sua dívida e limpou sua ficha", afirmou. Por isso, em sua avaliação, "é compreensível que o mercado financeiro veja o risco da Argentina como semelhante ao do Brasil". "Quando os economistas avaliam as perspectivas da economia argentina, vêem que há mais potencial de crescimento do que para o Brasil".
Conhecido por defender posições polêmicas, Stiglitz não poupa os Estados Unidos e diz que está pessimista sobre o futuro país. Em entrevista exclusiva a EXAME, o economista também criticou a redução de impostos para a classe alta.
A economia americana já se recuperou da crise de 2001?
Joseph Stiglitz Não. A economia está abaixo de seu potencial e o desempenho deve continuar ruim até 2007. O crescimento nos últimos quatro anos foi fraco, e o mais grave é que foi apoiado exclusivamente em dívidas, isto é, nos empréstimos feitos pelo próprio governo e pelas famílias para consumir. É uma situação frágil, que deve acabar em breve, em razão do aumento dos juros, porque taxas mais altas inibem o crédito.
EXAME Os juros baixos levaram à explosão dos preços dos imóveis nos Estados Unidos, fenômeno conhecido como bolha imobiliária. Que conseqüências o fim da bolha terá?
Stiglitz - A bolha imobiliária substituiu a bolha das empresas de tecnologia. Quando houve o colapso das ações das ponto-com, em 2001, foi a compra e a venda de imóveis que impediu que a economia americana entrasse em recessão. Agora, porém, com a alta dos juros, há consenso que os preços dos imóveis vão cair. Isso terá um grande impacto sobre a economia americana e o problema é que, desta vez, não há nenhuma outra bolha que possa sustentar a atividade. O governo também não pode fazer investimentos para movimentar a economia, porque está endividado. As empresas têm caixa, mas não vão querer investir num ambiente de desaquecimento econômico. As empresas estão mais preocupadas em como sobreviver se o consumo cair. Por isso, estou muito pessimista.
EXAME Os Estados Unidos correm o risco de viver a mesma recessão que atingiu o Japão quando estourou a bolha imobiliária de Tóquio?
Stiglitz - Não. Uma bolha imobiliária pode acabar de dois jeitos. Um deles é o que aconteceu em Tóquio, onde os preços dos imóveis despencaram, pessoas foram à falência e bancos quebraram. O cenário mais provável para os Estados Unidos, porém, é uma queda lenta de preços a alta dos juros vem sendo gradual justamente para garantir isso. Mesmo assim, o fim da bolha imobiliária vai prejudicar a economia americana, porque vai acabar com o combustível que sustentou seu crescimento nos últimos anos.
EXAME Em algum momento, os investidores ou os analistas do mercado financeiro conseguirão prever a formação de bolhas especulativas e evitá-las?
Stiglitz - Não. É impossível prever a ocorrência de bolhas. Mesmo quando alguém consegue detectá-las, o que é raro, nunca foi possível precisar quando a especulação irá acabar. Por isso, as bolhas ocorrem há séculos e vão continuar ocorrendo, isso já faz parte do funcionamento do mercado financeiro.
EXAME O que os Estados Unidos precisam fazer voltar a crescer mais?
Stiglitz - Precisam fazer algo que o Brasil conhece muito bem: reduzir seus déficits fiscal e comercial. Isso não pode ser feito com corte de gastos sociais na educação, principalmente , porque esse tipo de corte tem efeitos péssimos para a economia. Para diminuir o déficit, o governo precisa voltar a aumentar os impostos dos mais ricos, que foram reduzidos em 2001 e em 2003
EXAME Há alguma chance de o governo aumentar impostos?
Stiglitz - Só quando tivermos outro presidente. (George W.) Bush é o pior presidente para a economia americana em décadas. A melhora depende de outro governo.