Euro (Philippe Huguen/AFP)
João Pedro Caleiro
Publicado em 25 de fevereiro de 2015 às 18h14.
São Paulo - No auge da crise do euro, a moeda parecia estar com os dias contados.
Hoje, quase ninguém mais fala disso, apesar da saída da Grécia ("Grexit") continuar sendo uma possibilidade bem real entre as negociações com o resto do continente.
Isso não significa, no entanto, que os problemas acabaram: a combinação explosiva entre alto desemprego, baixo crescimento e deflação continua de vento em popa.
Talvez fosse o caso de criar um segundo euro, de acordo com Jacques Melitz, professor da universidade Heriot-Watt em Edimburgo, na Escócia.
Em entrevista para o blog da London School of Economics, ele diz que a arquitetura do euro tem dois problemas de origem. O primeiro é que ela não dá ao Banco Central Europeu a autonomia necessária para atuar de forma livre no mercado, como fazem outros bancos centrais.
A outra é que não há uma responsabilidade compartilhada pelo sistema bancário. O bloco está caminhando nesse sentido, mas o problema básico permanece: uma união monetária foi criada sem união fiscal, tributária e política - e entre economias radicalmente diferentes.
Por um tempo, a coisa funcionou. Se a Alemanha tivesse uma moeda própria, por exemplo, ela seria hoje muito mais valorizada do que o euro - uma má notícia para a competitividade das suas exportações, que são a força-motriz de sua economia.
Se a Grécia tivesse uma moeda própria, o país provavelmente não teria sido financiado como foi nos anos de boom. Mas no cenário atual, sua moeda já teria desvalorizado de forma brutal, o que tornaria suas exportações mais competitivas e impulsionaria a recuperação.
Proposta
Neste cenário, faz sentido criar um segundo euro para os membros descontentes e que não podem esperar mais flexibilidade alemã no curto prazo.
"A principal vantagem desse sistema é que um segundo euro seria construído de forma melhor do que o euro anterior do ponto de vista dos membros descontentes. Este novo banco central teria poder para participar de operações normais de livre mercado e se engajar em uma política monetária expansionista para aumentar a demanda agregada na sua própria zona. E haveria um único fundo de resolução que cobriria a insolvência de qualquer parte específica do sistema bancário", diz Jacques.
Vale lembrar que em setembro, quando ele deu a entrevista, ainda não havia a perspectiva de que o BCE criaria um novo programa de compra de títulos e ativos, como foi anunciado há algumas semanas.
Mas ele também não é o primeiro a divulgar a ideia. Um artigo da Fortune assinado pela jornalista Cyrus Sanati já no início de 2011 sugeria uma moeda de transição, intercambiável com o euro por um determinado período até que os países pudessem voltar para o bloco principal (ou não). Um paralelo é o dólar de Hong Kong, que vai circular junto com a moeda chinesa até ser substituído gradualmente.
Um dos entrevistados por Sanati na época disse que era um "delírio" imaginar que seria possível quebrar a zona do euro de forma ordenada e ainda conseguir criar todas as instituições necessárias para uma nova moeda.
Para Jacques, "divórcios são uma bagunça, mas há momentos em que é melhor ser firme". De qualquer forma, uma coisa é certa: a crise da Europa só será resolvida com uma boa dose de criatividade.