Economia

Dilma luta para convencer empresários a investir

Em seus encontros com os principais líderes empresariais do Brasil, a conversa se volta para os gargalos graves que levaram a economia do país a um crescimento pífio


	As reuniões, que se intensificaram nas últimas semanas, são uma parte crítica dos esforços de Dilma para convencer executivos a começar a investir de novo e ajudar a levantar a economia
 (Fabio Rodrigues Pozzebom/ABr)

As reuniões, que se intensificaram nas últimas semanas, são uma parte crítica dos esforços de Dilma para convencer executivos a começar a investir de novo e ajudar a levantar a economia (Fabio Rodrigues Pozzebom/ABr)

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Da Redação

Publicado em 4 de março de 2013 às 13h02.

São Paulo - As conversas muitas vezes duram duas horas, e até quatro. A presidente Dilma Rousseff faz perguntas detalhadas, mas ouve atentamente as respostas, com um olhar impenetrável que ocasionalmente enerva seus convidados.

Fala-se de investimentos e da necessidade de prosperidade partilhada --um tema favorito de Dilma. Mas em seus encontros com os principais líderes empresariais do Brasil, a conversa inevitavelmente se volta para os gargalos graves que levaram a economia do país a um crescimento pífio depois de um boom histórico na última década.

"O Brasil precisa se concentrar agora em questões como produtividade e redução de custos, porque essa é a única maneira de crescer de forma sustentável", disse Marcelo Odebrecht, que comanda um conglomerado global que leva o nome de sua família.

"Eu acho que percebemos isso, e a presidente está se movendo nessa direção", disse ele em uma entrevista. "Esse é o seu foco --olhar para esses obstáculos para fazer o Brasil crescer novamente." As reuniões, que se intensificaram nas últimas semanas, são uma parte crítica dos esforços de Dilma para convencer executivos a começar a investir de novo e ajudar a levantar a economia após dois anos consecutivos de crescimento decepcionante.

Os bate-papos com figuras bem conhecidas como Marcelo Odebrecht e o bilionário da mineração e energia Eike Batista ocorrem enquanto Dilma busca desmontar uma percepção de que ela não é amigável ou mesmo hostil em relação ao setor privado.

Tendo cumprido metade de seu mandato, Dilma fez muitos inimigos no mundo dos negócios. Ela condenou os bancos pela cobrança de taxas de juros elevadas, interveio fortemente na taxa de câmbio e realizou reformas controversas como um corte nas contas de luz que destruiu bilhões de reais do valor de mercado de empresas do setor elétrico.


Dilma argumenta que todas as suas decisões respeitam os contratos vigentes e as leis, e foram necessárias para colocar a economia do Brasil nos trilhos rumo a seus dias de glória de crescimento rápido como o visto no fim da década dos anos 2000.

Sua capacidade de convencer os líderes de negócios de que isso é verdade será chave para o resto de seu mandato.

Sem uma recuperação do investimento, algo que tem caído no governo Dilma, o Brasil não terá os recursos para tratar dos gargalos em infraestrutura que fizeram a economia crescer apenas 0,9 por cento em 2012.

Uma queda persistente da economia pode, ainda, colocar em perigo a ambição de Dilma à reeleição no próximo ano.

A Reuters falou com vários ministros, assessores presidenciais e líderes empresariais que participaram das reuniões recentes da presidente, tentando determinar por quais razões os executivos em geral não atenderam ainda ao apelo de Dilma por mais investimentos.

Líderes empresariais dizem que Dilma parece receptiva a suas opiniões e está focada nos problemas certos. Mas ela também não é tímida sobre a defesa de sua forte crença de que o Estado deve tentar moldar a economia para que toda a população prospere.


Essa filosofia norteou o Brasil durante os últimos 10 anos sob comando do PT, e ajudou a torná-lo um dos poucos países onde a desigualdade social caiu enquanto a economia cresceu. No entanto, também pode explicar as críticas recebidas por Dilma por algumas de suas decisões.

"Ela sempre desafia esses empresários: você tem que pensar como um negócio, mas você tem que pensar sobre o Brasil também", disse o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel, um dos assessores mais próximos de Dilma, que participa de algumas das reuniões.

"Você não pode ficar só pensando em como ganhar dinheiro. Ganhar dinheiro é natural, mas como é que vamos todos ganhar dinheiro? Como é que todo mundo vai melhorar? Não pode melhorar só por um lado, só para você", afirmou Pimentel.

Uma líder muito popular 

Desde que tomou posse no início de 2011, a primeira mulher presidente do Brasil vem ganhando notas altas da maioria dos eleitores. Sua taxa de aprovação pessoal tem ficado perto dos 80 por cento, graças em grande parte ao recorde de baixa do desemprego, apesar do baixo crescimento econômico.


Ao reprimir a corrupção e abraçar algumas políticas de livre mercado, como a privatização de aeroportos e rodovias, Dilma foi além da sombra de seu popular antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva.

Em uma região caracterizada por líderes carismáticos, como Lula e o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, Dilma se destaca por ser mais contida.

Assessores dizem que ela detesta aspectos cerimoniais da Presidência, evitando jantares com congressistas e visitantes estrangeiros.

Ela raramente dá entrevistas coletivas e abandonou o Twitter quase imediatamente após ter vencido a eleição. "Vamos conversar mais em 2011", disse Dilma em seu tweet mais recente.

A maioria dos brasileiros vê isso como sinal de uma líder trabalhadora. Especialmente entre os pobres, cuja vida melhorou drasticamente na última década, Dilma é vista como uma espécie de benfeitora --a "mãe do Brasil", como Lula a batizou em 2010.

Nos escritórios de São Paulo, a capital financeira e de negócios do país, executivos tendem a ter uma visão mais pálida.


Embora quase ninguém acuse Dilma de ser uma esquerdista dura como Chávez ou o presidente da Bolívia, Evo Morales, muitos dizem que ela tem tido uma mão muito pesada na economia do Brasil --e assusta alguns investidores que nunca sabem o que ela vai fazer a seguir.

"Eu acho que a maioria dos investidores entende que ela não é a reintrodução de um estilo antigo de ideias socialistas. Não é disso que se trata", disse Paulo Vieira da Cunha, ex-vice-presidente do Banco Central do Brasil e sócio da Tandem Global Partners, um hedge fund em Nova York.

"Ela tem crença no planejamento centralizado, em uma política industrial ativa, onde o governo toma as decisões críticas", disse ele. "Isso não é exclusivo do Brasil, aliás... Mas tem incomodado algumas pessoas." UMA MÃO PESADA Na verdade, não há grande setor econômico que Dilma não tenha tocado de uma maneira significativa nos últimos dois anos.

O setor bancário do Brasil foi virado de cabeça para baixo pela decisão do BC, a partir de oitavo mês de Dilma na Presidência, de reduzir a taxa básica de juros Selic, que desde então caiu de 12,50 por cento para a mínima histórico de 7,25 por cento ao ano.

Dilma publicamente se queixou dos bancos privados por não cortarem suas taxas de empréstimo rápido o suficiente para corresponder às quedas da Selic. Enquanto isso, a inflação mensal atingiu o seu nível mais alto em quase oito anos em janeiro, levando alguns investidores a dizer que os cortes de juros foram longe demais.


Dilma também tem se envolvido na administração da taxa de câmbio, que até aqui em seu governo oscilou entre 1,52 real e 2,13 reais por dólar. O governo tentou alternadamente fortalecer ou enfraquecer a moeda brasileira de forma imprevisível, dificultando o planejamento dos negócios pelas empresas.

Mesmo a estratégia política favorita dos empresários --o corte de impostos-- tem gerado incerteza.

Em vez de anunciar reduções de tributos para todos, Dilma vem mudando a carga de setor por setor, implementando reduções fiscais de duração incerta para indústrias como a automobilística ou de eletrodomésticos. Seu governo já fez mais de duas dezenas de anúncios de pacotes de estímulo.

Finalmente, Dilma fez algumas decisões que abertamente trabalham contra os interesses do capital privado. Elas incluem forçar a estatal Petrobras a importar gasolina e vendê-la com prejuízo, uma política que tem afetado os planos de investimento da empresa e que contribuiu para um declínio acima de 30 por cento nas ações da empresa na Bovespa desde que ela assumiu o cargo.

O principal índice de ações brasileiras, o Ibovespa, acumula queda de perto de 20 por cento durante a presidência de Dilma --em comparação a uma alta ao redor de 18 por cento no México e de mais de 20 por cento do índice industrial Dow Jones, nos Estados Unidos, no mesmo período.

O grupo de análises Eurasia disse em um relatório em fevereiro que as políticas do governo brasileiro e a má comunicação levaram a "um problema de credibilidade com o setor privado".


O resultado: o investimento caiu 4 por cento em 2012, e agora representa apenas 18,1 por cento do Produto Interno Bruto (PIB).

Isso dá ao Brasil a menor relação entre investimento e PIB entre as grandes economias da América Latina, bem atrás das taxas de 28 por cento ou mais no Peru, na Colômbia e no Chile. Como resultado, alguns membros da equipe econômica de Dilma temem que a taxa potencial de crescimento econômico do Brasil possa ser limitada a 3 por cento para os próximos anos.

Tentando o seu melhor?

Dentro do Palácio do Planalto, a palavra que melhor descreve a reação ao modo como alguns investidores estão se comportando é perplexidade.

Dilma passou grande parte de sua presidência explicitamente atendendo a comunidade de negócios do Brasil. De fato, muitas das políticas para o qual ela foi criticada foram resultado do retorno que ela recebeu de executivos, segundo ministros e assessores próximos da presidente.

E há verdade nisso. Em um discurso em 2010, antes da campanha presidencial, Armando Monteiro Neto --então presidente do principal grupo de lobby da indústria do Brasil, a CNI-- citou impostos, taxas de juros, um real valorizado e custos como o da energia elétrica como os principais problemas da economia.


Dilma fez um progresso mais rápido em todas essas questões do que qualquer economista ou analista político previu, embora algumas iniciativas --incluindo seu recente plano para diminuir a conta de luz-- tenham causado grandes perdas para algumas empresas.

"Eu acho que ela fez o que as pessoas de negócios pediram, e com uma certa velocidade", disse a presidente da varejista Magazine Luiza, Luiza Helena Trajano, outra empresária que frequentemente se reúne com Dilma.

"Algumas das críticas parecem um pouco estranhas", disse Luiza. "Ela fez um monte de coisas difíceis." Apesar de ter sido eleita inicialmente como uma figura de continuidade, Dilma fez alguns movimentos pró-negócios que eram impensáveis no governo Lula.

Ela ignorou as críticas da ala mais de esquerda do PT para privatizar os aeroportos de Guarulhos e Viracopos, no Estado de São Paulo, e em Brasília. Ela também conseguiu aprovar uma reforma da Previdência para servidores --uma decisão que vai ajudar a fortalecer as finanças do Brasil, que ela tem mantido de forma ordenada.

Uma interpretação da dificuldade que o Brasil enfrenta para crescer é que, após o boom da última década que tirou cerca de 30 milhões de pessoas da pobreza, as políticas que ajudaram a economia no governo Lula agora não têm mais tanto efeito.

Ou seja, não há mais espaço para crescer a economia expandindo o crédito do consumidor --o principal motor da expansão econômica de 2007 a 2010. Por isso, sobrou para Dilma fazer duras reformas estruturais que poderiam, eventualmente, abrir uma nova era de crescimento, algo que tem gerado incerteza no curto prazo.


O ministro Pimentel, que conhece Dilma há quatro décadas, disse que as direções da economia global também levaram a presidente a tornar-se mais reformista ao fim do primeiro ano de seu mandato.

"Ela viu com mais clareza que os gargalos que a economia brasileira tinha e têm são muito sérios e que teriam que ser superados", disse ele.

"Não podíamos protelar o enfrentamento desses gargalos sob pena de que, nesse mundo totalmente convulsionado pela crise europeia, aí sim perderíamos totalmente nossa competitividade", acrescentou.

Compartilhar a riqueza

Dilma tem aberto suas portas para uma variedade de líderes empresariais de finanças, siderurgia, aviação e em outras áreas --e ganhou o voto de confiança de alguns executivos que eram céticos em relação a ela.

Ela é principalmente atenta ao ouvir as ideias sobre novas políticas e para tentar avaliar a saúde da economia. Mas ela também não é tímida sobre pedir a seus convidados para que coloquem mais dinheiro para movimentar a economia.

Em uma reunião em 10 de janeiro com a Odebrecht, por exemplo, Dilma pediu para o grupo considerar investir nas concessões dos próximos aeroportos, disse um assessor. Em uma conversa em 16 de janeiro com Eike, Dilma pediu para ele participar de uma rodada de leilões de áreas de exploração de petróleo este ano.


Dilma também reúne duas dúzias de altos executivos em fóruns regulares com presidentes-executivos dentro do Palácio do Planalto, com o próximo encontro agendado para 19 de março.

Ainda assim, o contato direto com executivos não tem dado garantia de que haverá mais investimentos.

O contato mais próximo de Dilma no mundo dos negócios é, possivelmente, Jorge Gerdau Johannpeter, um magnata do aço a quem ela nomeou para liderar a Câmara de Políticas de Gestão, Desempenho e Competitividade, numa outra relação entre o governo e o setor privado. Jorge Gerdau é visto muitas vezes em Brasília, e sentou-se com Dilma por quatro horas em uma reunião em janeiro.

No entanto, em 21 de fevereiro, a empresa que tem Jorge Gerdau como chairman --a Gerdau, maior produtora de aços longos das Américas-- disse que está reduzindo seu plano de investimento para os próximos cinco anos em 17 por cento.

Procurada, a Gerdau não respondeu a pedidos de entrevista.


O mal-estar no setor privado do Brasil explica porque Dilma pode ser vulnerável a uma candidatura à Presidência mais amigável ao mercado, incluindo nomes como o do senador tucano Aécio Neves (MG) ou do governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), na eleição do próximo ano.

Mas as pesquisas indicam que, por enquanto, Dilma é popular o suficiente para vencer com facilidade. E um aumento inesperado de 0,5 por cento dos investimentos do Brasil no quarto trimestre de 2012 sugere que alguns líderes empresariais podem também estar mais dispostos a ajudar a economia.

Marcelo Odebrecht, que após o encontro com Dilma disse que seu grupo investirá 8,5 bilhões de dólares este ano, um terço a mais que em 2012, afirmou que os executivos podem aprender a viver com algum desconforto.

"As pessoas podem argumentar: 'Eu teria feito isso de uma maneira diferente'", disse ele. "Mas nos conceitos e nas intenções, eu acho que é difícil criticá-la. O que ela está fazendo é certo para o Brasil."

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