Videogames: nova redução do IPI vai custar mais de 30 milhões de reais em 2021 (Getty Images/Getty Images)
Carolina Riveira
Publicado em 27 de outubro de 2020 às 16h51.
Última atualização em 28 de outubro de 2020 às 21h57.
O governo do presidente Jair Bolsonaro chamou atenção para o setor de games nesta semana depois de publicar em suas redes sociais a decisão de reduzir a carga tributária sobre aparelhos de videogame. O decreto que faz a mudança foi publicado nesta terça-feira, 27, com redução que incide sobre o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados).
É a segunda medida do tipo em pouco mais de um ano: em agosto do ano passado, o governo já havia reduzido os tributos uma primeira vez.
Apesar da publicidade que o tema ganhou, na prática, os valores renunciados pelo governo são relativamente baixos se comparados à dimensão do orçamento público.
Para o ano que vem, somadas as estimativas feitas pelo governo para os dois cortes, a renúncia fiscal pode ficar na casa dos 60 milhões de reais. O novo corte de hoje custará 36 milhões de reais em 2021, segundo o Ministério da Economia. Já o corte do ano passado teve custo estimado de 24 milhões de reais no ano que vem, segundo nota do governo na ocasião.
"Se considerarmos que a estimativa de arrecadação da Receita Federal para 2021 será de 975 bilhões de reais, o impacto será diminuto", diz o especialista em Direito Tributário Eduardo Gonzaga Oliveira de Natal, sócio do escritório Natal & Manssur e membro da Academia Brasileira de Direito Tributário (ABDT).
Por mês, o impacto previsto com a redução de hoje, segundo o Ministério da Economia, é de 2,7 milhões de reais mensais até o fim do ano.
Em tempos de pandemia e corte de gastos, a especificidade da medida -- reduzir a alíquota para um setor específico enquanto se discute a criação de outros tributos, como a "nova CPMF" sobre transações financeiras --, pode ser controversa. Mas, mesmo se mantida por uma década, a renúncia fiscal dos games não chega a 1 bilhão de reais.
Ao todo, as alíquotas das três categorias incluídas foram de 20% a 50% antes da primeira redução em 2019 para entre 6% e 30% com o novo corte hoje. A menor alíquota, de 6%, é para videogames com tela incorporada, portáteis ou não, enquanto os maiores impostos são para consoles.
Entre o setor, há dúvidas sobre o real impacto do corte do IPI no mercado de games, segundo as fontes ouvidas pela EXAME. A tendência é que haja alguma redução dos valores pagos por novas importações, que já sofrem com a alta do dólar -- o PlayStation 5, lançado neste ano, deve custar mais de 5.000 reais no Brasil.
O IPI é somente um dos impostos que os videogames pagam, e é cobrado tanto sobre produtos nacionais quanto importados. Nos importados, é cobrado no porto; nos nacionais, logo que sai da fábrica. Reduções de IPI foram constantes nos últimos anos: de FHC a Dilma e Temer, todos os governos fizeram cortes.
O Brasil arrecadou em 2019 cerca de 52,4 bilhões de reais em IPI, cerca de 0,72% do PIB, segundo estimativas do Tesouro.
Natal explica que o caráter do IPI dá margem para essa maior flexibilidade, o que também ocorre em impostos de importação (os do arroz foram zerados até o fim do ano diante da alta do preço interno).
"O IPI é um imposto que se submete ao chamado princípio da seletividade, o qual permite ao ente tributante adotar alíquotas em razão de interesses extrafiscais -- neste caso, o consumo de games", diz.
"Como a carga tributária direta é muito elevada, e ao invés de reduzir a carga na fonte, cria-se mecanismos de isenção. O IPI ou o ICMS [este último, estadual] são dois claros exemplos que gozam de bastantes incentivos", diz Feliciano Aldazabal, diretor de Inovação e Marketing do FI Group, consultoria especializada na gestão de incentivos fiscais e financiamento à Pesquisa & Desenvolvimento.
Dados os baixos valores, a decisão por reduzir o IPI defendida pelo presidente foi vista sobretudo como uma sinalização a parte de sua base aliada. O filho mais novo de Bolsonaro, Renan, de 22 anos (o "Zero Quatro"), é conhecido por ser um influenciador de jogos na internet.
Nesta semana, o presidente Bolsonaro já havia antecipado a redução do IPI em suas redes sociais, segundo ele, solicitada por ele próprio à Receita Federal e ao ministro da Economia, Paulo Guedes. Bolsonaro já citou repetidamente os gamers em outros pronunciamentos desde que tomou posse.
IMPOSTOS SOBRE JOGOS ELETRÔNICOS
- Em 2019, baixamos os impostos sobre jogos eletrônicos de 50% para 40%. Ontem, falei novamente com o Paulo Guedes para buscarmos uma nova redução, de 40% para 30%. Reconheço não ser o ideal, mas estamos avançando.
- Um abraço aos gamers! 👍
— Jair M. Bolsonaro (@jairbolsonaro) October 9, 2020
O público gamer crescente ficou claro com a quarentena. O setor de games deve terminar 2020 atingindo 2,7 bilhões de usuários no mundo e mais de 150 bilhões de dólares em faturamento, o triplo do streaming. Na América Latina, o setor deve crescer 10% em 2020, segundo a Newzoo, empresa de pesquisa do setor.
Só o Brasil tem 67 milhões de jogadores, segundo pesquisa encomendada pela Brasil Game Show ao Instituto Datafolha. E eles não são tão jovens quanto se pode pensar: a idade média dos fãs de jogos no Brasil é de 30 anos.
Nesse cenário, uma série de políticos têm tentando acenar para a base de jogadores na internet. O candidato de Bolsonaro à prefeitura de São Paulo, Celso Russomano (Republicanos), é o maior expoente dessas tentativas.
O prefeitável terminou sua participação no primeiro debate no mês passado com promessas de uma central municipal de games e, em um evento na zona leste da cidade, também prometeu "professores de games nas escolas municipais aos finais de semana para a garotada aprender a jogar". Em seu programa de governo, está a construção de centros esportivos destinados aos gamers caso seja eleito.
A esquerda também tenta sua fatia. Na outra ponta do espectro político, o também candidato em São Paulo Guilherme Boulos (PSOL) aceitou participar de uma live com influenciadores para jogar Among Us, o jogo que virou febre na quarentena e já teve mais de 100 milhões de downloads no mundo. O mesmo fez a deputada americana Alexandria Ocasio-Cortez, um dos principais nomes do Partido Democrata.