Cristina Kirchner, presidente argentina: economia sofre com súbita desvalorização de 18% do peso argentino em janeiro, tratada com má vontade pelo governo (Getty Images)
Da Redação
Publicado em 6 de maio de 2014 às 20h49.
Os sinais de esfriamento da economia argentina se intensificaram em abril, com a queda sensível de vendas do setor de varejo, incluindo a indústria automobilística, que puxou o crescimento durante o alto consumo da última década.
As vendas ao consumidor caíram 7,5% em abril, e acumulam baixa de 6,3% nos primeiros quatro meses de 2014, em relação ao mesmo período do ano passado, informou nesta terça-feira a Confederação Argentina da Média Empresa (CAME).
O comércio de automotores despencou 35% em abril, fechando o quadrimestre com um retrocesso de 18% em comparação ao mesmo período de 2013.
A indústria automotora, setor sensível da economia argentina, registra férias forçadas de trabalhadores em quase todas as fábricas. A crise afeta diretamente as relações comerciais entre Argentina e Brasil.
"Em abril, e pelo sétimo mês consecutivo, foi registrada queda no comércio total entre Argentina e Brasil (-24%), que afeta, em particular, os automóveis", segundo um relatório da Abeceb.com enviado à AFP.
A economia sofre com a súbita desvalorização de 18% do peso argentino em janeiro, tratada com má vontade pelo governo diante da pressão do mercado que demandava um ajuste relativo à perda geral de competitividade nos produtos.
O efeito foi uma disparada na inflação, que somou 10% somente no primeiro trimestre, e a queda do poder aquisitivo dos salários, já que as negociações dos sindicatos com as empresas ainda não haviam começado.
Cai o salário real
"A chave do fenômeno está na queda do salário real", disse Soledad Pérez Duhalde, analista de la consultora Abeceb.com, à AFP.
O poder de compra de quase 11 bilhões de trabalhadores registrados e de outros quatro bilhões de trabalhadores informais perdeu força nos últimos dez anos. Esse poder de compra é a pedra angular da economia de consumo que consolidou no poder o falecido presidente Néstor Kirchner e sua esposa e atual presidente do país Cristina Kirchner.
De acordo com a CAME, "em abril os preços novos conviveram com os salários antigos, e essa realidade foi verificada nos estabelecimentos comerciais, vazios".
Os setores imobiliário, de brinquedos e de bens de consumo duráveis, em particular veículos e eletrodomésticos, sofreram mais do que qualquer outro setor com a desaceleração econômica.
Kirchner, que vive seus 18 últimos meses de mandato, conseguiu estabilizar o setor financeiro ao lançar mão de medidas ortodoxas que antes renegava, como a elevação de até 26% na taxa do Banco Central.
"A desejada paz cambial, de 8,01 pesos o dólar (há três meses) teve impacto de forma adversa nos gastos. O consumo não vai operar como condutor do crescimento em 2014", afirma Pérez Duhalde.
O produto interno bruto, que crescia em média 8% na última década, chegou a apenas 3% em 2013, e estima-se que registrará queda neste ano.
Um fator de estabilidade é a entrada de dólares com a venda da colheita agrícola, que permitiu o Banco Central -através de um sistema impositivo- recuperar a metade dos 3 bilhões perdidos entre novembro e janeiro no que se referem às reservas monetárias.
As reservas superam agora os 28 bilhões e o mercado financeiro está calmo, mas às custas de uma retração do consumo.