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"Duplo mandato" do BC é retrocesso, dizem economistas

A possibilidade de o Banco passar a perseguir dois objetivos - o controle da inflação e o crescimento econômico - é vista com cautela

BC (Gustavo Gomes/Bloomberg)

BC (Gustavo Gomes/Bloomberg)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 22 de fevereiro de 2018 às 08h17.

Última atualização em 22 de fevereiro de 2018 às 13h02.

Brasília - A possibilidade de o Banco Central passar a perseguir dois objetivos - o controle da inflação e o crescimento econômico - é vista como um retrocesso por ex-presidentes e ex-diretores da instituição.

Para eles, a introdução do chamado "duplo mandato" para o BC pode levar ao descontrole da inflação e até a questionamentos na Justiça sobre os juros no País.

No projeto de autonomia do Banco Central, que está sendo formulado pelo governo, uma das propostas é a de que a instituição passe a fazer política monetária com os olhos no controle de preços e também no crescimento econômico ou na geração de empregos.

Atualmente, o BC tem o foco voltado apenas para os preços, sendo que sua ferramenta para controle da inflação é a Selic (a taxa básica de juros), hoje em 6,75% ao ano.

O modelo estudado no governo é semelhante ao adotado nos Estados Unidos, onde o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) determina sua taxa de juros de modo a controlar a inflação e, ao mesmo tempo, criar postos de trabalho.

Para o economista Carlos Langoni, ex-presidente do Banco Central e diretor do Centro de Economia Mundial da Fundação Getúlio Vargas (FGV), essa ideia "não faz o menor sentido para uma economia como a brasileira".

"Em economias estabilizadas, com uma longa tradição de inflação baixa, você até pode se dar ao luxo de ter dois objetivos. Mas mesmo nos Estados Unidos o duplo mandato tem sido objeto de discussões, o que traz insegurança ao mercado e afeta as expectativas de inflação", disse.

Único

Os Estados Unidos estão sozinhos no modelo de duplo mandato. As demais economias centrais e os países emergentes com economias relevantes possuem regra semelhante à adotada hoje no Brasil, em que o BC mira apenas a inflação.

A lógica econômica por traz disso é a de que, com os preços sob controle, garante-se um crescimento sustentável ao longo do tempo.

"Cumprindo bem sua função, de controle da inflação, o Banco Central acaba permitindo que se tenha um crescimento sustentável", defendeu o ex-presidente do BC e sócio da Tendências Consultoria Integrada, Gustavo Loyola.,

"Impor ao BC uma obrigatoriedade de ter um 'olho no peixe e outro no gato' pode enfraquecer o controle da inflação, que é a tarefa precípua dos bancos centrais. O crescimento da economia depende de vários outros fatores, e não só do Banco Central."

Loyola cita ainda o risco de com o duplo mandato as decisões do Banco Central sobre a Selic acabarem indo parar no Supremo Tribunal Federal (STF).

"No Brasil, existe um excesso de judicialização. Imagine que o BC, com mandato duplo, esteja fazendo determinada política e que um partido ou o Ministério Público ache que ele controla a inflação, mas não gera emprego", exemplificou Loyola.

"Então, o partido vai procurar o STF dizendo que o Banco Central não está cumprindo seu objetivo. De repente, teremos ministros do Supremo tendo de decidir se o BC deve baixar ou subir os juros. Seria uma insanidade."

'Burrice'

Ex-diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central, o economista Alexandre Schwartsman, da Schwartsman e Associados, qualifica a ideia do governo de estabelecer duplo mandato para o BC como uma "burrice atroz".

"Se forem estabelecidos dois objetivos (inflação e crescimento), o que o BC fará, já que ele tem um instrumento (a Selic)? Isso pode causar vários problemas."

Para o economista Luis Eduardo Assis, ex-diretor de Política Monetária do Banco Central, a ideia de autonomia é importante, para blindar a instituição de influências externas.

A autonomia permitiria "formalizar uma situação que já existe de fato: a de independência do Banco Central". Já o duplo mandato é criticado pelo economista. "Há coisas mais importantes para o governo tratar." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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