Homens do setor de construção trabalhando na luz da manhã (Marcelo_minka/Getty Images)
João Pedro Caleiro
Publicado em 3 de dezembro de 2019 às 13h58.
Última atualização em 3 de dezembro de 2019 às 16h22.
São Paulo - Os números do Produto Interno Bruto (PIB) do terceiro trimestre, divulgados pelo IBGE nesta terça-feira (03), deixaram os economistas mais confiantes sobre a aceleração da atividade no país.
O crescimento foi de 0,6% na base trimestral e 1,2% na base anual, acima da expectativa do mercado.
Além disso, houve revisão para cima dos dados de 2018 e dos primeiros trimestres do ano, sinalizando um resultado melhor também no ano que vem.
"Um PIB com cara de 2% em 2020 começa a ficar muito possível. Para não acontecer tem que ter alguma tragédia, um choque muito negativo", diz Silvia Matos, coordenadora do Boletim Macro do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre/FGV).
O Ibre revisou sua projeção do ano de 1,1% para 1,2%. Já o Goldman Sachs revisou de 1% para 1,2% o crescimento da economia em 2019 e de 2,2% para 2,3% o de 2020.
A avaliação é de que este crescimento dobrado está relativamente "contratado", ou seja: não inclui grandes choques negativos nem positivos, já que será difícil avançar em reformas estruturais em um ano eleitoral e com as dificuldades políticas do governo.
A MB Associados, por outro lado, preferiu manter sua previsão de alta de 1,6% para o ano que vem. "O resultado (do 3º tri) animou quem estava mais pessimista. Nossa preocupação com 2020 é focada no cenário externo, que tem muitos riscos ainda. Não descarto crescimento podendo chegar a 2%, o que só saberemos quando o risco internacional arrefecer", diz Sérgio Vale, economista chefe da MB.
De forma geral, o crescimento da economia brasileira tem sido puxado pela expansão do consumo das famílias e do investimento das empresas.
"É um crescimento de melhor qualidade, que depende muito mais da demanda privada do que da contribuição do gasto público", diz Alberto Ramos, economista-chefe para América Latina do Goldman Sachs.
O consumo das famílias, que é o principal componente pelo lado da demanda com 65% do PIB, cresceu pelo décimo trimestre seguido e vem se acelerando ao longo dos trimestres deste ano.
“E será ainda mais forte no quarto trimestre. A história continua e o consumo está ajudando a dar o ritmo de crescimento, até pelo peso que tem”, diz Silvia.
A inflação baixa, a queda dos juros, a expansão do crédito e a melhora no mercado de trabalho, ainda que muito apoiada na informalidade, são vistos como responsáveis por este movimento.
"Não se trata de um voo de galinha; é um crescimento bem sustentável", diz Claudio Considera, pesquisador associado do Ibre/FGV.
Outra surpresa positiva do terceiro trimestre foi o setor de construção, que subiu 4,4% na comparação anual, a segunda alta consecutiva após vinte trimestres de queda.
"Prefiro olhar para isso com certo suspense, porque o IBGE tem revisado sistematicamente os números do setor para baixo. Mas não deixa de indicar uma forte recuperação da construção, que é uma atividade que emprega muita gente", diz Considera.
O desempenho do setor ajudou a fazer com que o investimento privado avançasse 2,9% na mesma comparação, no oitavo resultado positivo após quatorze trimestres de recuo:
"Isso demonstra uma certa confiança no empresário no futuro", diz Considera. Apesar disso a taxa de investimento no terceiro trimestre ficou estável em relação ao ano anterior, na faixa de 16,3% do PIB.
Ramos, do Goldman, lembra que o investimento privado ainda está, em perspectiva histórica, no começo de uma recuperação.
"O indicador teve a contração absolutamente extraordinária durante a recessão de 2015 e 2016, com queda de quase 30%. Ainda há muita margem para avançar, mas isso só vai acontecer quando o sentimento melhorar um pouquinho mais e quando a demanda também aumentar", diz.
Vale lembrar que a economia brasileira também segue operando abaixo do seu pico, registrado no início de 2014, de acordo com a projeção de Andre Perfeito, economista-chefe da corretora Necton.
A atividade econômica no país segue sendo puxada para baixo pela fraqueza da demanda externa e no consumo do governo.
Silvia calcula que sem os choques da tragédia do rompimento da barragem em Brumadinho e da crise na Argentina, o crescimento da economia brasileira poderia ter ficado entre 1,5% e 2% já neste ano.
A Argentina, um dos principais parceiros comerciais do Brasil e compradores do nosso setor de manufaturas, deve ver sua economia encolher 3% em 2019 e mais 1,5% em 2020, segundo as previsões mais recentes.
As exportações brasileiras de forma geral caíram 5,5% na base anual e 2,8% na base trimestral, enquanto as importações cresceram 2,9% na base anual e 2,2% na base trimestral.
Ainda que o aumento de importações seja natural em momento de aquecimento econômico, a contribuição do setor externo para o PIB tem sido negativa.
A incerteza gerada pela guerra comercial entre Estados Unidos e China, assim como a desaceleração das principais economias do globo, também contribuem para este cenário.
Já o consumo do governo segue deprimido, com queda de 0,4% em relação ao trimestre imediatamente anterior e 1,4% na comparação anual.
A dificuldade das contas públicas, a continuidade do ajuste fiscal e a forte rigidez orçamentária, com 94% de despesas obrigatórias por lei, sugere que este cenário não deve mudar tão cedo.