Economia

Dados apontam desaceleração do PIB em 2025, mas governo aposta em estímulos em ano pré-eleitoral

Com sinais de queda da atividade e de possível recessão técnica ao longo de ano, governo quer impulsionar o crescimento com saque do FGTS e crédito consignado privado

Publicado em 7 de março de 2025 às 15h16.

Última atualização em 7 de março de 2025 às 15h27.

O Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil registrou um crescimento de 3,4% em 2024, impulsionado pelas altas da formação bruta de capital fixo, do consumo das famílias, além dos resultados positivos da indústria e dos serviços. Entretanto, no 4º trimestre do ano passado, a atividade econômica mostrou sinais de desaceleração, com expansão de apenas 0,2%. O consenso de mercado e o governo estimavam uma alta de 0,4%. O resultado abriu nova divergência entre as expectativas do governo, que estima crescimento de 2,3% do PIB neste ano, e as do mercado, que revisou projeções para abaixo de 2% e, em alguns casos, fala em recessão técnica no segundo semestre.

Essa expectativa de crescimento menor após quatro anos de altas acima dos 3% — e a um ano de um novo ciclo eleitoral com um governo com popularidade em baixa — leva a uma maior convicção entre agentes econômicos de que o governo pisará no acelerador por novas medidas de estímulo econômico.

Especialmente porque no último trimestre do ano passado o consumo das famílias, parte importante das altas econômicas recentes, recuou 1% na relação com o trimestre anterior, um sinal de que o aperto monetário e a inflação chegaram ao bolso do consumidor.

A primeira das medidas de estímulo foi autorizar que o trabalhador que optou pelo saque-aniversário tenha direito de receber R$ 12 bilhões em depósitos de recursos que estavam retidos no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Desse total, R$ 6 bilhões serão pagos em março e outros R$ 6 bilhões em junho.

Na próxima semana, uma medida provisória modernizará as regras para concessão de crédito consignado para trabalhadores celetistas. O atual estoque de recursos concedidos nessa linha de financiamento é de R$ 40 bilhões. Nas contas da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), essa linha tem potencial de crescer até R$ 90 bilhões e totalizar R$ 130 bilhões.

Não há expectativa no governo e no setor financeiro de que todo esse recurso seja injetado na economia em 2025, mas uma parte deve ser concedida ao longo do ano. Ambas as medidas, do FGTS e do consignado privado, não têm efeito fiscal.

De outra ponta, o governo também prepara um novo formato para custear o programa de auxílio gás, que hoje atende quase 6 milhões de famílias e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) prometeu publicamente expandir para 22 milhões. O impacto fiscal desse aumento é estimado em R$ 15 bilhões.

Por fim, a gestão de Lula já elabora uma proposta para isentar de Imposto de Renda (IR) quem recebe até R$ 5 mil mensais, cujo custo é projetado em R$ 35 bilhões.

Até aqui, é importante ressaltar, o Ministério da Fazenda se manteve firme no objetivo de respeitar a meta fiscal, que prevê déficit primário de até 0,25% do PIB. Mas medidas de estímulo podem pressionar a inflação — cuja estimativa cresceu por 19 semanas seguidas no boletim Focus — e manter os juros altos por mais, o que deprime a economia como um todo.

Em relatório, por exemplo, o Bank of America destacou que o crescimento do ano passado foi resultado da combinação dos efeitos defasados do afrouxamento da política monetária, iniciado em agosto de 2023, e de uma "política fiscal expansionista no final de 2023 e início de 2024". Mas alertou:

"Para o futuro, espera-se uma desaceleração do crescimento para 2,0% em 2025, à medida que a política monetária se torne ainda mais contracionista e o estímulo fiscal seja menor do que o observado anteriormente", diz trecho do documento enviado a clientes. "Um risco altista para essa projeção é o uso de políticas de crédito, fiscais e parafiscais para estimular a atividade econômica diante da queda na popularidade presidencial."

Governo trabalha com 1º trimestre aquecido

Ao analisar os dados do PIB de 2024, a Secretaria de Política Econômica (SPE) do Ministério da Fazenda informou que o crescimento no 4º trimestre e em 2024 foi marginalmente abaixo do projetado, o que deixa um carrego estatístico de cerca de 0,5% para 2025. O dado mostra quanto a economia brasileira cresceria neste ano se as taxas fossem iguais a zero, assumindo que permaneceriam no mesmo nível registrado em 2024.

No 1º trimestre de 2025, apontou a SPE, o ritmo de crescimento deve voltar a subir na margem, desacelerando em seguida.

"A expansão da atividade agropecuária deverá ser na casa de dois dígitos, repercutindo principalmente a colheita recorde de soja. O PIB de serviços também deve acelerar na margem no primeiro trimestre, refletindo o reajuste do salário mínimo e o maior ritmo de crescimento de atividades relacionadas à agropecuária, como os transportes e o comércio", informou a pasta.

Para o segundo semestre, a expectativa é que o ritmo de crescimento se mantenha "próximo à estabilidade", diante dos menores impulsos do mercado de crédito e de trabalho em função dos juros altos. A SPE manteve a projeção de que a economia crescerá 2,3% em 2025.

Mercado mais pessimista e recessão técnica

Enquanto o governo espera um crescimento de 2,3% em 2025, o mercado é mais pessimista. A mediana das expectativas no Boletim Focus do Banco Central (BC) aponta que o crescimento será de 2,01%. Após a divulgação do PIB, muitos bancos e casas de análise já revisaram suas projeções para menos de 2%. E já há quem aposte em recessão técnica ao longo do ano. Isso ocorre quando há dois trimestres consecutivos de queda do PIB.

Em relatório aos clientes, o diretor de Pesquisas e Estudos Econômicos do Bradesco, Fernando Honorato Barbosa, afirmou que 2024 marcou uma aceleração dos investimentos e do vazamento externo em resposta ao forte aumento do consumo, que se observa desde o fim da pandemia.

"No último trimestre do ano passado, entretanto, consumo e investimentos perderam força, provavelmente derivada do aumento dos juros e da inflação. Para este ano, esperamos que a economia cresça 1,9%, ajudada por um primeiro trimestre forte vindo da safra agrícola e dos efeitos sobre o consumo da elevação do salário-mínimo", afirmou, em relatório.

Para Igor Cadilhac, economista do PicPay, a combinação de inflação persistente, juros elevados e o consequente aperto das condições financeiras deve pesar sobre a atividade econômica em 2025.

"Nesse contexto, a desaceleração não apenas se torna inevitável, mas também necessária para corrigir os desequilíbrios atuais. Projetamos um crescimento de 1,6% para o PIB este ano, sustentado, em grande parte, pelo elevado carrego estatístico e pelo desempenho de setores exógenos, como o agronegócio e a indústria extrativa", disse.

Segundo ele, a partir do segundo trimestre, a desaceleração tende a se intensificar, aumentando o risco de estagnação e até mesmo de uma recessão técnica. Os setores de perfil mais cíclico tendem a enfrentar as maiores dificuldades ao longo do ano.

Mariana Rodrigues Monteiro, economista da SulAmérica Investimentos, disse que para 2025 a tendência de desaceleração deve continuar, embora o primeiro trimestre ainda se beneficie do desempenho da agropecuária.

"Os indicadores divulgados já mostram sinais sutis de arrefecimento, mas sem indícios de colapso. Esperamos que os próximos indicadores setoriais apresentem direções mistas. Por enquanto, mantemos nossa projeção de crescimento em 2% para 2025, com recessão técnica a partir do segundo trimestre", disse.

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