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Da Redação
Publicado em 26 de janeiro de 2011 às 13h02.
No extremo oposto dos dois graus negativos registrados nas ruas de Davos, na madrugada desta quarta-feira (23/01), a temperatura das discussões a serem travadas no centro de convenções da pequena cidade suíça deve refletir, nos próximos cinco dias, a agitação extrema do ambiente econômico mundial recente.
Até domingo, mais de 2500 políticos, empresários, executivos e acadêmicos devem passar por Davos para o encontro anual do Fórum Econômico Mundial, organização que reúne que reúne boa parte dos homens e mulheres que dão as cartas da economia global, para discutir temas que vão da necessidade de controle mais rígido do fluxo de capital ao grau de felicidade que as novas drogas da Medicina podem trazer.
Os números de Davos |
De 23 a 27 de janeiro |
2500 participantes |
27 chefes de governo ou de Estado |
235 sessões oficiais de discussão |
74 das 100 maiores companhias do mundo |
1370 CEOs ou presidentes de empresa |
Sob o tema central "O Poder da Inovação Colaborativa", escolhido meses antes de a crise das hipotecas nos Estados Unidos começar a fazer vítimas entre os bancos mais influentes do mundo, o Fórum foi organizado com base em cinco "pilares de discussão", (ver tabela abaixo). No entanto, os próprios organizadores e participantes admitem que diante das derrubadas consecutivas das bolsas mundiais e do clima de pânico que tomou o mercado, desde a semana passada, é impossível evitar que a desaceleração americana transforme-se no foco das discussões.
"Evidentemente, que estarão no topo da pauta das reuniões os horizontes financeiros e econômicos", afirma Jacques Marcovitch, professor de Economia da Universidade de São Paulo e conselheiro do fórum para a América Latina. Para ele, a discussão central deve girar em torno de "como desacoplar o elevado volume de recursos financeiros em circulação de uma economia real consideravelmente menor do que a primeira". O clima de preocupação com o tema deve afetar inclusive alguns debates menos relacionados ao cenário americano, segundo o professor de Prática de Desenvolvimento Econômico da Universidade de Harvard, Ricardo Hausmann. "Os encontros costumam ser bastante pautados pelas notícias recentes, então, assim como a discussão sobre a Guerra do Iraque, por exemplo, predominou nos debates de 2003, este ano a desaceleração da maior economia do mundo deve dar o tom", explica.
Participante de uma das sessões sobre o desaquecimento econômico, Hausmann diz não ver motivo para pânico, uma vez que a economia mundial vinha num ritmo muito forte e, portanto, a desaceleração "não será o fim do mundo", segundo ele.
O professor também discorda das afirmações, veiculadas na imprensa internacional, de que o Fórum de 2008 começa sob o ambiente mais complicado desde o início da década. "O clima do encontro estava pior há três anos, quando Europa e Estados Unidos pareciam estar em conflito crescente sobre as questões globais. Em 2003, então, com os americanos envolvidos numa guerra, era possível cortar o ar das salas do Fórum com uma faca, de tão pesado. Acredito que dessa vez não será assim", diz.
Temores crescentes
Na contramão do que prevê Hausmann, no entanto, uma pesquisa divulgada pelo próprio Fórum Econômico Mundial, na semana passada, aponta para um aumento significativo do pessimismo quanto ao futuro da economia, entre os cidadãos de 60 países. Questionadas sobre se as próximas gerações viverão num mundo mais ou menos próspero do que o atual, 36% dos entrevistados responderam que o mundo será menos próspero, contra 33% que acreditam em mais prosperidade. No levantamento divulgado no início de 2007, quando o crescimento da China puxava aceleradamente o ritmo de crescimento global e a crise imobiliária nos Estados Unidos ainda não havia se instalado, a proporção era de 40% de otimistas, ante 31% de pessimistas.
Entre os analistas do mercado financeiro, por sua vez, a percepção de que os Estados Unidos devem entrar em recessão e arrastar consigo as demais economias parece ter ganhado ainda mais força, nos últimos dias, a julgar pelo comportamento dos investidores nas bolsas.
Os cinco temas centrais de discussão |
Economia e Finanças: lidando com a insegurança econômica |
Negócios: competir enquanto se colabora |
Geopolítica: alinhando interesses em meio a divisões |
Ciência e Tecnologia: explorando as novas fronteiras da Natureza |
Valores e Sociedade: compreendendo as mudanças do futuro |
Dois dias antes do início do fórum, uma seqüência de perdas profundas varreu as bolsas desde o início do dia e se alastrou da Ásia até as bolsas latino-americanas. A Bolsa de Frankfurt, por exemplo, uma das mais importantes do mundo, despencou 7,16%, maior baixa desde os atentados às Torres Gêmeas, em 11 de setembro de 2001. Em meio ao efeito-dominó negativo, o diretor-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Dominique Strauss-Kahn, declarou que a crise é "séria" e poderá prejudicar também os países emergentes.
O pânico dissipou-se na terça-feira, somente após o Federal Reserve (Fed, o Banco Central americano) reunir-se emergencialmente e anunciar um corte de 0,75% na taxa de juros dos EUA.
Brasil é exceção
Enquanto os sinais de ansiedade quanto à desaceleração dos Estados Unidos tomam conta dos debates sobre o cenário global, as perspectivas para o Brasil parecem mais positivas, na avaliação dos próprios brasileiros que comparecerão ao fórum.
Para Luiz Fernando Furlan, presidente da empresa de participações Galf Empreendimentos e ex-ministro do Desenvolvimento, a estabilidade dos índices de inflação, o fortalecimento do mercado de capitais e a internacionalização das empresas brasileiras ajudam a aumentar a resistência do país, em relação às turbulências externas.
"Esses fatores colocam o país numa posição muito melhor do que no passado, inclusive do que no ano anterior", afirma Furlan, que este ano vai ao evento de Davos pela 15ª vez, para participar de uma sessão sobre insegurança econômica.
Engrossa o coro de otimismo quanto ao Brasil o presidente da petroquímica Braskem, José Carlos Grubisich, convidado para um debate sobre re-emergência da classe média na América Latina, marcado para o segundo dia do encontro.
"A região como um todo tem ganhado visibilidade, e o Brasil está mais protegido. Temos, hoje, uma robustez de estrutura econômica e de consumo que permitem que, mesmo em meio à incerteza internacional, praticamente nenhuma empresa tenha revisto suas previsões de investimento no país", diz ele.
O Brasil ainda deve aparecer como destaque na sessão "A Surpreendente Arrancada da América Latina", na qual o executivo-chefe de finanças da Petrobrás, Almir Guilherme Barbassa, discutirá com outros representantes da região o ganho de musculatura por parte do mercado de capitais local.
Como representante estatal, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, deve defender a necessidade de conclusão rápida para a Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio, que avança lentamente por causa das divergências sobre derrubada de tarifas. O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, também confirmou presença.
O Brasil no Fórum |
Os destaques brasileiros do evento |
Celso Amorim, ministro das Relações Exteriores |
Jacques Marcovitch, professor de Economia e ex-reitor da USP Conselheiro do Fórum para a América Latina, ajuda a definir temas e selecionar participantes |
Luiz Fernando Furlan, presidente da Galp Empreendimentos |
José Carlos Grubisich, presidente da Braskem Debatedor da sessão "América Latina: a Re-emergência da Classe Média" |
Almir Guilherme Barbassa, executivo-chefe de finanças da Petrobrás Debatedor da sessão "A Arrancada Surpreendente da América Latina" |
Ricardo Young, presidente do Instituto Ethos Brasil Debatedor da sessão "América Latina: a Re-emergência da Classe Média" |
Paulo Coelho, escritor Participante do Encontro de Empreendedores Sociais, realizado um dia antes da abertura do Fórum |
Entre os destaques internacionais, o mais aguardado é a secretária de Estado do EUA, Condoleezza Rice, responsável pela sessão de abertura do Fórum, a respeito de mudança climática e terrorismo.
Além dela, passarão por Davos o primeiro-ministro britânico Gordon Brown, o presidente do Afeganistão, Hamid Karzai, e o presidente israelense Shimon Peres. O presidente da Colômbia, Álvaro Uribe, será o único representante latino-americano, entre os chefes de Estado.