Economia

Com exportação maior à China, carne fica mais cara no Brasil

Frigoríficos têm sido pressionados a fazer ofertas recordes por bois nas fazendas, já que compras pela China aumentaram 23,6% de janeiro a outubro

Açougue: em São Paulo, média da carne registrou nesta semana nova máxima histórica para de 13,90 reais/kg (NurPhoto/Getty Images)

Açougue: em São Paulo, média da carne registrou nesta semana nova máxima histórica para de 13,90 reais/kg (NurPhoto/Getty Images)

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Reuters

Publicado em 21 de novembro de 2019 às 08h25.

Última atualização em 21 de novembro de 2019 às 09h00.

São Paulo — O Brasil, maior exportador global de carne bovina, está faturando com a maior demanda da China, mas os consumidores brasileiros estão por tabela pagando mais pelo produto nos açougues, enquanto frigoríficos têm sido pressionados a fazer ofertas recordes por bois nas fazendas.

A fome chinesa para preencher o buraco deixado pela peste suína africana na criação de porcos já é sentida setorialmente nos índices de inflação no Brasil e ainda pressiona margens da maior parte dos frigoríficos do país, segundo especialistas.

Com impulso dos chineses, que elevaram as compras de carne bovina do Brasil em 23,6% de janeiro a outubro, para cerca de 320 mil toneladas, o país exportou 11% mais no período, para 1,47 milhão de toneladas, de acordo com a associação da indústria Abrafrigo.

Além da forte demanda da China após novas habilitações de indústrias de bovinos pelos chineses --que passaram de 16 no início do ano para 40 unidades atualmente, segundo a Abrafrigo--, um dólar em máximas históricas frente ao real também favorece as exportações.

"Estamos no auge da captação desses aumentos de preços, a carne vai continuar subindo e vai impor um desafio para a dona de casa. Quando a carne bovina sobe, outras carnes também sobem, ainda que não houvesse razão para isso, elas sobem pela questão da substituição (do produto)", disse o economista do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) André Braz, da Fundação Getulio Vargas, que acompanha índices inflacionários.

Não fossem poucos os fatores de alta, a proximidade das festas de final de ano gera uma demanda adicional por carnes, há o pagamento da primeira parcela do décimo terceiro neste mês e uma oferta mais restrita de bovinos prontos para o abate.

"A gente já está assistindo sim uma alta forte, tem a ver com sazonalidade, e também com demanda chinesa. Isso gera choque de oferta", completou Braz, em entrevista à Reuters.

"Com a chegada do décimo terceiro, o consumidor compra mesmo, e este comprar é o sinal verde para aumento de preços. O dever de casa seria comprar menos, mas vai dizer para a pessoa não celebrar o final do ano?"

Pelo Índice de Preços ao Produtor Amplo, da FGV, a carne bovina apareceu entre os destaques em novembro, com alta de 5,26%, dez vezes mais do que o visto em outubro.

"Dá para ver que houve um avanço significativo no preço da carne bovina, já pronta para ir para o açougue", comentou Braz, sobre a carne mais significativa para a inflação.

Em novembro, Índice de Preços ao Consumidor constatou alta de 6,04% no contrafilé, enquanto em outubro havia subido 2,69%.

"Parte da alta ao produtor é repassada sim, e dado que está subindo ao produtor, a carne vai continuar pressionando inflação em novembro e dezembro...", disse Braz.

Isso em momento em que o preço da arroba do boi gordo, acompanhado pelo indicador Esalq/B3, atingiu um recorde de 204,05 reais na terça-feira, acumulando alta de 19,54% no mês, segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), que também registrou nesta semana nova máxima histórica para a carcaça bovina na Grande São Paulo, de 13,90 reais/kg.

A inflação no país, no entanto, tem se mantido abaixo do piso da meta oficial para 2019, de 4,25% pelo IPCA com margem de 1,5 ponto percentual para mais ou menos.

"A gente sabia que ocorreria uma maior demanda por boi para abate, mas não nesta magnitude... O número de empresas habilitadas para a China foi muito significativo", afirmou o presidente da Abrafrigo, Péricles Salazar.

Segundo ele, aqueles frigoríficos que não têm habilitação para a China não conseguem repassar para os seus preços a alta da matéria-prima.

"Margens menores. Tenho recebido a seguinte afirmação: está muito difícil para os frigoríficos que não têm habilitação da China, porque são obrigados a acompanhar o preço do boi daqueles que têm habilitação...", disse.

Ele acrescentou que aquelas empresas que não têm habilitação para exportar à China, que está pagando melhores preços do que outros destinos, conseguem compensar apenas parte do aumento da arroba bovina, já que o mercado interno também está em alta.

Diante da forte demanda chinesa, ele disse que o setor espera ainda este ano novas habilitações de frigoríficos, após cinco unidades de carne bovina terem sido autorizadas na semana passada, incluindo fábricas da JBS e Marfrig.

Entretanto, ele comentou que o preço da arroba do boi a mais de 200 reais não é sustentável, e o mercado deve recuar em algum momento. Quando, ele disse não saber.

Na avaliação de Braz, da FGV, o preço da carne só vai começar a arrefecer um pouco ao final de janeiro.

"Lá para fevereiro e março a carne começa a devolver uma parte do aumento", comentou ele, condicionando essa previsão a uma normalidade climática para as pastagens, por exemplo.

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