Bandeira do Chipre: há meses, o Chipre é apontado como um paraíso fiscal com poucas contemplações sobre a origem dos fundos depositados em seus bancos por milionários russos. (REUTERS/Yorgos Karahalis)
Da Redação
Publicado em 19 de março de 2013 às 15h35.
Nicósia - O Chipre estava imerso, nesta terça-feira, em árduas negociações sobre o plano de resgate europeu, que impõe uma taxa de quase 10% sobre os depósitos bancários, embora tenha concordado, antes de apresentá-lo ao Parlamento, em exonerar os que possuem menos de 20.000 euros, em resposta à indignação que a medida gerou na ilha.
O presidente cipriota, Nicos Anastiadis, deverá conversar novamente nesta terça-feira por telefone com a chanceler alemã Angela Merkel sobre o plano de resgate negociado no sábado com a União Europeia, segundo um porta-voz do governo da ilha.
O emendado projeto de lei, ao qual a AFP teve acesso antes de seu envio ao Parlamento pela tarde, exclui os pequenos correntistas, mas não prevê medidas compensatórias em faixas de depósitos mais altos, o que levaria ao descumprimento dos objetivos estabelecidos com os credores da ilha, segundo advertiu o Banco Central do Chipre.
Os bancos deste pequeno país da Eurozona não voltaram a abrir desde o anúncio do plano, no último sábado, e permanecerão fechados até quinta-feira, por medo de uma grande retirada de fundos por parte de clientes angustiados com suas economias.
O não funcionamento dos bancos forçou o fechamento da Bolsa de Nicósia, que também deve voltar a operar na quinta-feira.
O novo projeto de lei deixa intactos os depósitos bancários de menos de 20.000 euros, mas mantém o plano inicial, de uma taxa de 6,75% sobre os depósitos de 20 a 100 mil euros, e de 9,9% sobre os de mais de 100.000 euros.
O objetivo dessas taxas é arrecadar 5,8 bilhões de euros, em troca de um resgate de 10 bilhões acordado no sábado pela troika de credores do Chipre (Comissão Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional) para salvar o país.
Uma fonte europeia em Bruxelas havia advertido na segunda-feira à noite que, qualquer que fosse a divisão destas taxas, não deverá comprometer o objetivo de arrecadar os 5,8 bilhões de euros.
Mas, segundo o governador do Banco Central do Chipre, Panicos Demetriades, isso é exatamente o que ocorrerá com uma mera exoneração de impostos aos depósitos de menor quantia, sem compensação nos valores superiores.
"Se garantirmos 5,5 bilhões (de euros), isso será considerado um rompimento do acordo e provavelmente não será aceito", disse Demetriades, citado pela agência CNA.
O Chipre é o quinto país da Eurozona a se beneficiar de um plano de resgate internacional, embora com um montante muito inferior ao que precisou ser injetado para salvar Grécia, Portugal e Irlanda e para recuperar o setor bancário espanhol.
A taxa forçada sobre os depósitos bancários despertou temores de que o Chipre possa servir de laboratório na União Europeia (UE).
"Não seremos suas cobaias!", "UE. Quem é o próximo? Espanha ou Itália?", proclamavam os cartazes exibidos por centenas de manifestantes na noite de segunda-feira diante do Parlamento.
"Os depósitos são sagrados (...) Se tomarem o dinheiro das contas, o dinheiro pelo qual trabalhei por toda a minha vida para minha aposentadoria, para os estudos de meus filhos, o que acontecerá no futuro? Onde vão parar?", se perguntava irado Agis Petrides, um advogado cipriota, na fila de um caixa automático da ilha.
A votação no Parlamento deveria ter sido realizada na segunda-feira, mas foi adiada para esta terça-feira diante da dificuldade de obter a maioria em apoio ao projeto de lei decidido pelo presidente conservador e pela troica de credores.
O presidente Anastasiadis não dispõe efetivamente de uma maioria clara no Parlamento: o partido comunista Akel (19 deputados de um total de 56) e os socialistas do Edek (5) rejeitam o plano de resgate, também criticado no Diko (centro-direita, 8), aliado do Disy (direita, 20), ao qual o chefe de Estado pertence.
A rádio cipriota não descartava que a votação no Parlamento, já adiada duas vezes, fosse novamente postergada nesta terça-feira.
A taxa sobre os depósitos bancários - tanto de cipriotas quanto de residentes estrangeiros - também gerou fortes críticas da Rússia, que tem vastos bens na ilha.
Há meses, o Chipre é apontado como um paraíso fiscal com poucas contemplações sobre a origem dos fundos depositados em seus bancos por milionários russos, muitos deles suspeitos de serem membros da máfia.
A agência Moody's avaliou em 19 bilhões de dólares os ativos de sociedades russas depositados no Chipre, aos quais se somam 12 bilhões de dólares de bens de bancos russos em entidades cipriotas.