Economia

Campos Neto diz que falta de autonomia mais ampla cria dificuldades ao BC

A fala de Campos Neto ocorre num momento em que os servidores do BC estão fazendo um movimento de greve em busca de reajustes salariais

Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central  |  Foto: Adriano Machado/Reuters (Adriano Machado/Reuters)

Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central | Foto: Adriano Machado/Reuters (Adriano Machado/Reuters)

AO

Agência O Globo

Publicado em 26 de abril de 2022 às 16h35.

Última atualização em 26 de abril de 2022 às 17h16.

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, criticou nesta terça-feira a falta de uma autonomia "mais ampla" para a autoridade monetária e disse que essa condição gera dificuldades para a condução do dia a dia da instituição.

A fala de Campos Neto ocorre num momento em que os servidores do BC estão fazendo um movimento de greve em busca de reajustes salariais. O governo já sinalizou com um aumento linear de 5% para todo o funcionalismo federal.

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Campos Neto discursou durante sessão solene do Congresso Nacional em homenagem aos 105 anos do nascimento do economista Roberto Campos, seu avô e criador do Banco Central do Brasil.

"Hoje nós vivemos a realidade de ter uma autonomia operacional sem ter uma autonomia administrativa e financeira, e a gente vê a dificuldade que no dia a dia de conduzir o Banco Central sem ter uma autonomia mais ampla", disse Campos Neto.

O Banco Central ganhou autonomia operacional — mas não financeira e administrativa — após o Congresso aprovar uma lei nesse sentido no ano passado. Isso significa mandato fixo para os seus diretores e presidente, além de liberdade na condução da política monetária. Por outro lado, não pode, por exemplo, conceder reajustes para servidores por decisão própria.

Campos Neto lembrou que a lei de criação do BC dava total autonomia para a instituição, mas isso acabou três anos depois.

"De fato, Roberto Campos foi um dos principais responsáveis pela criação do Banco Central e um grande defensor de sua autonomia. A lei 4.595, de 1964, que criou o Banco Central, garantiu autonomia operacional, financeira e administrativa, inclusive com mandato fixo para seus presidentes e diretores", disse o presidente.

Ele completou, reforçando a necessidade de autonomia operacional, financeira e administrativa:

"Infelizmente, essa autonomia, que é moderna até para os padrões de hoje, durou apenas até 1967. E aí, olhando as notas do meu avô do período, ele dizia por que era importante ter as três autonomias e o que causaria ter uma autonomia sem ter as demais", disse.

Legado do avô

Campos Neto falou também sobre o legado do avô, mencionando em particular o Plano de Ação Econômica do Governo (PAEG), adotado durante o primeiro governo do período da ditadura militar. Uma das medidas era justamente a autonomia do Banco Central.

"Meu avô, senhoras e senhores, não foi somente um dos principais porta-vozes do pensamento liberal no Brasil. Ele foi um homem sempre fiel às suas ideias e que trabalhou intensamente pelo seu país. Sua trajetória de vida na esfera pública é bem conhecida", disse.

Roberto Campos, nascido em 17 de abril de 1917 e morto em 2001, era um defensor intransigente da livre iniciativa. Chamava Petrobras de Petrossauro, condenando enfaticamente o monopólio da atividade e combateu com veemência a reserva de mercado da informática, adotada em 1984 e que permaneceu até 1992. Participou da criação do Banco Mundial e do FMI.

"Após diplomar-se em teologia e filosofia, iniciou sua vida pública no Itamaraty. No segundo governo Vargas, contribuiu para a criação do BNDES. Também atuou no governo Juscelino Kubitschek, na elaboração do Plano de Metas. No governo Castello Branco, foi ministro do Planejamento", lembrou Campos Neto.

"Com o Programa de Ação Econômica do Governo, o famoso PAEG, contribuiu para a estabilização da inflação e para a realização de importantes reformas estruturais, como a reforma tributária e a do sistema financeiro, que incluiu uma reforma bancária e a criação do Banco Central do Brasil", disse o atual chefe do BC.

Também foi embaixador do Brasil em Washington e em Londres, deputado federal e senador. Como senador, Roberto Campos participou da Assembleia Nacional Constituinte atuando principalmente na defesa das liberdades individuais e econômicas, da redução da intervenção do Estado na economia, do intercâmbio tecnológico entre Brasil e outros países e do tratamento homogêneo ao capital.

"No entanto, pode-se dizer nas discussões sobre o texto da Constituição que ele obteve muito mais derrotas do que vitórias. Desse total de 186 emendas propostas por ele, apenas 24 foram aprovadas e 28 parcialmente aprovadas", afirmou Neto.

Campos Neto lembrou que seu avô fez duras críticas ao texto constitucional.

"Para ele, a Constituição de 1988 estabeleceu um amplo conjunto de direitos nem sempre compatíveis com as fontes de receita, atribuiu ao Estado o papel fundamental em empreendimentos estratégicos e apresentou em sua forma final um caráter anacrônico, muitas vezes não aliado com o avanço da globalização e do livre mercado, o que dificultava a criação de um ambiente favorável à livre iniciativa, à acumulação de capital e ao progresso tecnológico", recorda.

Além disso, Roberto Campos discordava do modelo tributário e previdenciário contido no texto constitucional.

"Suas previsões quanto às dificuldades de gerenciamento das finanças públicas impostas pela nova Constituição tornaram-se logo reais", disse o chefe do BC.

Para Campos Neto, seu avô ficaria contente em saber da aprovação da Reforma Previdenciária, da Lei de Autonomia do Banco Central e, mais recentemente, da modernização cambial.

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