Economia

BRICs enfrentam a ressaca do crescimento

Com o agravamento da crise internacional, emergentes lançam mão de suas armas para conter a desaceleração econômica – e evitar o declínio do apogeu que não aconteceu

Desde o final de 2011, Brasil, Rússia, Índia, China e a novata África do Sul assistiram a um esfriamento de sua pujança, puxado pela crise na Europa e pela recuperação americana (Roberto Stuckert Filho/Presidência da República)

Desde o final de 2011, Brasil, Rússia, Índia, China e a novata África do Sul assistiram a um esfriamento de sua pujança, puxado pela crise na Europa e pela recuperação americana (Roberto Stuckert Filho/Presidência da República)

DR

Da Redação

Publicado em 11 de junho de 2012 às 14h00.

Consta no capítulo número um de qualquer obra ou estudo econômico que, sempre após uma fase de explosão de crescimento de um país, é inevitável um período de desaceleração – ou até mesmo de contração da economia, em alguns casos. Essa “ressaca” ocorre com mais força quando, durante o período de extrema bonança, os países não fazem as mudanças necessárias para permitir um crescimento sustentável da economia no futuro. Esse destino implacável (e recorrente na história) parece ter sido esquecido por boa parte dos governantes dos BRICs - e também pelo mercado global. Mas, ao que tudo indica, é chegada a hora de os mercados emergentes pagarem a fatura pelos problemas que não solucionaram ao longo dos últimos anos.

Desde o final de 2011, Brasil, Rússia, Índia, China e a novata África do Sul assistiram a um esfriamento de sua pujança, puxado pela crise na Europa e pela dificuldade de recuperação da economia americana. Com exceção da Rússia, que manteve em 2011 o mesmo crescimento do ano anterior, todos os países do grupo tiveram desaceleração. O primeiro trimestre deste ano não foi melhor, sobretudo para o Brasil, que, a despeito de inúmeras medidas de estímulo à indústria e ao consumo, cresceu apenas 0,2% no período – número abaixo das estimativas mais pessimistas.

Se, durante a crise financeira de 2008, os BRICs eram vistos como a tábua de salvação da economia mundial, o economista Jim O’Neill, do Goldman Sachs, e criador do termo BRIC, acredita que o cenário mudou. Em uma carta enviada aos investidores do banco no início da semana, O’Neill externou sua preocupação. “É inegável que, com exceção da Rússia, os dados do primeiro trimestre dos BRICs foram desanimadores. O crescimento do Brasil e da Índia foi particularmente fraco e os dados de inflação na China acentuam a sensação de que as coisas não estão tão bem quanto os otimistas esperavam”, afirmou.

Economia chinesa em xeque - A China, apesar de apresentar o melhor desempenho entre todos, é também a maior fonte de preocupação. Ainda que o país caminhe a passos lentos para reduzir a desigualdade social e aumentar a abertura de mercado, seu ritmo de crescimento (considerado insatisfatório) ultrapassa 8% e impulsiona o avanço não só da economia americana, como também dos demais BRICs. Contudo, o banco Credit Suisse estima que o país não cresça mais que 7% em 2012, enquanto a China International Capital afirma que o PIB chinês não avançará mais de 6,4% se a Grécia for expulsa da zona do euro. Esse número, que mais parece um sonho para qualquer país europeu, é considerado muito preocupante para a economia chinesa.

Em um movimento de precaução, o Banco Central da China cortou a taxa de juros em 0,25 ponto porcentual na última semana, enquanto o governo chinês anunciou um plano de estímulo para a indústria e setor imobiliário com o objetivo de manter o nível de investimentos no país. Segundo informações da Economist Intelligence Unit, os investimentos têm um peso de mais de 50% no crescimento do PIB chinês. “A redução de juros é o primeiro passo correto. Aparentemente, há uma intenção modesta de intensificar o investimento público, ainda que o governo chinês não tenha sido claro sobre isso. Mas, de qualquer forma, eles estão fazendo a coisa certa dentro das circunstâncias atuais”, afirma Barry Eichengreen, economista e cientista político da Universidade da Califórnia, em Berkeley.


Brasil voa baixo - As medidas tomadas pelo governo brasileiro para estimular o crescimento (como a redução dos juros e do Imposto sobre Produtos Industrializados) também têm sido elogiadas por estudiosos, ainda que seus resultados não tenham se refletido nos últimos dados econômicos divulgados. Contudo, há um sentimento de desapontamento generalizado em relação à resolução de problemas estruturais no Brasil. A piora da crise fez ainda com que as estimativas para o aumento dos investimentos no país em 2012 desacelerassem de 3,4% para 1,5%, segundo dados da Tendências Consultoria.

A avaliação é de que o governo não fez as reformas necessárias e, por essa razão, o país está mais sujeito às intempéries da crise internacional. “Em períodos de stress, os investidores se preocupam mais com a falta de reformas estruturais e com a volatilidade dos ciclos de crescimento. No caso do Brasil, ainda há a preocupação adicional com a questão da abertura econômica”, afirma Robert Wood, da Economist Intelligence Unit (EIU).

Economias dependentes - Rússia e África do Sul enfrentam desafios similares. Ambos são extremamente dependentes de uma única indústria. Enquanto o petróleo comanda a economia russa, a exploração de minério sustenta o PIB do país africano. Apesar de serem economias relativamente menores que as dos demais BRICs, contribuem de maneira extraordinária para a percepção de que o grupo deixou de ser o novo Eldorado. Devido à falta de diversificação de sua economia, a África do Sul possui atualmente uma das maiores taxas de desemprego do mundo - 25,2% da população economicamente ativa - enquanto os investimentos totais no país estão estagnados na casa dos 19% do PIB.

A democracia titubeante russa e as poucas mudanças no aspecto político ocorridas ao longo dos anos fazem com que poucos economistas acreditem que o país mereça ser chamado de BRICs. Seu crescimento estável nos últimos dois anos deveu-se, sobretudo, ao aumento do preço do barril de petróleo. “Para justificar sua posição, a Rússia precisa crescer entre 4% e 5% ao longo de toda a década. Isso significa que sua contribuição para o PIB mundial será maior do a de toda a zona do euro, durante o mesmo período. E para conseguir esse feito, ela precisa apenas não entrar em crise”, diz O’Neill, do Goldman Sachs.

Preocupação indiana - A Índia, que não tem o PIB tão robusto quanto China e Brasil, passa por um momento delicado. Com um alto nível de endividamento público e desaceleração econômica mais fugaz do que qualquer outro país do grupo, ela precisa (desesperadamente) crescer a um patamar anual próximo de dois dígitos para conseguir acomodar economicamente sua população. Estima-se que, anualmente, 10 milhões de indianos entram no mercado de trabalho. Para conseguir suprir essa demanda por emprego, o país precisa avançar em reformas sociais, políticas e econômicas.

Corrupção, falta de investimentos em infraestrutura e uma indústria que não consegue prosperar a uma velocidade satisfatória são problemas que ficaram em segundo plano durante o milagre do crescimento, mas que são descortinados com a desaceleração. A Índia consegue estar em uma colocação pior que a do Brasil no ranking de produtividade do Goldman Sachs. Em uma escala de 0 a 10, a economia indiana está em 3,9, enquanto Brasil e China estão em 5,4.

Acompanhe tudo sobre:América LatinaBricsCrise econômicaCrises em empresasDados de BrasilPaíses emergentes

Mais de Economia

BNDES vai repassar R$ 25 bilhões ao Tesouro para contribuir com meta fiscal

Eleição de Trump elevou custo financeiro para países emergentes, afirma Galípolo

Estímulo da China impulsiona consumo doméstico antes do 'choque tarifário' prometido por Trump

'Quanto mais demorar o ajuste fiscal, maior é o choque', diz Campos Neto