Mercosul: além da incerteza de como será concretizado o Brexit, o bloco sul-americano também perde o apoio do Reino Unido nas negociações com a UE (Norberto Duarte/AFP)
Da Redação
Publicado em 28 de junho de 2016 às 17h27.
A saída do Reino Unido da União Europeia (UE) deve atrasar as negociações do acordo de livre comércio entre o Mercosul e o bloco europeu, na avaliação de especialistas ouvidos pela Agência Brasil.
Além da incerteza de como será concretizado o Brexit (termo em inglês para "saída britânica"), o bloco sul-americano também perde o apoio do Reino Unido nas negociações com a UE.
“Ainda é muito difícil prever o que vai acontecer e como será essa saída do Reino Unido da UE. O Reino Unido é importante mercado para produtos agrícolas e tem uma bandeira bastante liberal quanto ao comércio.
Sai um grande aliado nas negociações e abre espaço para países mais conservadores, mais protecionistas [na agricultura], como a França. Os produtos agrícolas do Mercosul são muito competitivos e o grande x da negociação é a questão agrícola”, disse a coordenadora de comércio internacional da Barral MJorge Consultoria, Renata Amaral.
Em maio, em Bruxelas, representantes dos dois blocos trocaram ofertas de acesso a seus respectivos mercados de bens, serviços e compras governamentais.
As negociações para um acordo entre Mercosul e UE acontecem desde o início dos anos 2000 e a etapa ocorrida em maio foi considerada um avanço por ser a primeira troca de ofertas entre os blocos desde 2004.
Segundo Renata Amaral, a negociação entre o Mercosul e a UE ainda deve durar anos. “O acordo em si ainda vai demorar muito a acontecer, mas o primeiro passo para retomar as negociações que estavam paradas foi essa troca de ofertas que ocorreu em maio. Tem que ver se não vai crescer um discurso de renegociar a cota agrícola para o Mercosul. A saída [do Reino Unido] preocupa e tem que ser observado com atenção o que vai acontecer daqui para frente. Não é um mercado qualquer saindo do bloco. Pode retardar ainda mais [a negociação].”
O professor e coordenador do curso de relações internacionais das Faculdades Rio Branco, em São Paulo, Gunther Rudzit, também acredita que o Brexit vai trazer incerteza às negociações entre Mercosul e UE.
“O maior empecilho para os interesses brasileiros e, principalmente argentinos, sempre foram os franceses. Nós queremos abertura do mercado agrícola e fim dos subsídios agrícolas e os franceses são os maiores opositores a isso. Enquanto não se decidir os termos de como vai ficar essa relação entre Reino Unido e UE, com base no que vamos negociar? As negociações vão ser arrastar mais. Se os próprios europeus estão sem saber direito para onde ir, como eles vão perder tempo ainda em negociar conosco?”, ponderou.
Negociação
Na semana passada, negociadores-chefe do acordo Mercosul-União Europeia reuniram-se em Montevidéu e, segundo o Itamaraty, confirmaram interesse em levar adiante as tratativas.
“Na ocasião, os dois blocos responderam a perguntas técnicas sobre as ofertas intercambiadas em 11 de maio último, de bens, serviços, investimentos e compras governamentais, e passaram em revista os textos normativos do acordo. Trataram, ainda, do cronograma negociador do segundo semestre, que incluirá reunião do Comitê de Negociações Birregionais em outubro, em Bruxelas. Os resultados da reunião confirmam o interesse dos dois blocos em avançar nas negociações, com vistas à conclusão de um acordo abrangente e equilibrado”, informou, em nota, o governo brasileiro.
O ministro das Relações Exteriores, José Serra, lamentou, na última sexta-feira (24), a saída do Reino Unido da União Europeia e disse que o Brasil manterá boas relações com as duas partes.
“Agora, tendo acontecido, nós vamos manter o nosso entendimento, inclusive a ideia de um acordo de livre comércio com a Europa Continental e vamos abrir também com a Inglaterra isoladamente. A Inglaterra é um país aberto. Dentro da Europa, ela é dos menos protecionistas. Vamos procurar um entendimento direto com o Reino Unido que vai ser mais fácil do que era com a União Europeia no seu conjunto”, disse o ministro, em entrevista à Rádio Bandeirantes.