Esforços do Banco Central não foram suficientes para segurar temor de investidores com o futuro do Brasil (Ueslei Marcelino/Reuters)
Talita Abrantes
Publicado em 17 de julho de 2018 às 10h27.
A moeda brasileira está trazendo de volta algumas lembranças ruins.
O real tem ficado para trás de seus pares, com o dólar aproximando-se cada vez mais de R$ 4,00 - um nível visto pela última vez em meio à crise política que culminou com o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff em 2016. E pode ser que a depreciação não pare por aí: alguns analistas acreditam que o dólar pode chegar a R$ 5,00 - ou até mais.
Embora o ritmo de depreciação do real tenha diminuído depois que o Banco Central intensificou a intervenção no mercado de câmbio em maio, os investidores ainda estão encontrando razões para vender ativos brasileiros. As previsões de crescimento caíram depois da greve de 10 dias dos caminhoneiros, a incerteza sobre o resultado com as eleições presidenciais de outubro permanece e o cenário externo continua desafiador para os mercados emergentes mesmo após os ativos desses países terem passado pelo seu pior trimestre desde 2015.
"Pode chegar a R$ 4,00", disse You-Na Park, analista do Commerzbank em Frankfurt. “Um misto de incerteza em relação às eleições presidenciais e o risk-off global devido a preocupações com a guerra comercial” são os fatores que levarão o dólar para este preço no quarto trimestre, diz ela.
A intervenção intensa do BC empurrou a moeda para perto de R$ 3,70 no início de junho, mas desde então o dólar retomou a alta e a cotação tem oscilado em torno de R$ 3,90 nas últimas semanas. O real se desvalorizou cerca de 14% em relação ao dólar neste ano, o pior desempenho entre as 16 principais moedas globais. Se o dólar quebrar a marca de R$ 3,9660, o próximo nível técnico a ser observado é de R$ 4,24, a máxima histórica atingida em setembro de 2015.
E enquanto os R$ 4,00 podem parecer ruins, o Bank of America Merrill Lynch diz que o dólar pode chegar a R$ 5,5 se a agenda econômica do próximo presidente não agradar ao mercado e se houver dúvidas sobre sua governabilidade. Esse cenário também causaria uma contração no PIB no próximo ano que vem e devolveria a taxa Selic para o patamar de dois dígitos, deixando para trás a atual mínima histórica de 6,5%.
“O ruído político associado ao ciclo eleitoral deve se intensificar nos próximos meses, aumentando os riscos para o processo de recuperação econômica”, escreveram os economistas David Beker e Ana Madeira em um relatório neste mês. No melhor cenário desenhado pelo banco, o dólar cairia para R$ 3,30 no próximo ano.
Candidatos pró-mercado, como o ex-governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, e o ex-ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, continuam com baixas intenções de voto em pesquisas eleitorais recentes, nas quais candidatos cujos planos econômicos são menos claros aparecem na liderança. O parlamentar de extrema direita Jair Bolsonaro tem liderado as sondagens que excluem o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva - cuja candidatura é improvável - seguido pela ex-ministra Marina Silva e pelo ex-governador do Ceará, Ciro Gomes.
Gustavo Rangel, economista-chefe para a América Latina da ING Financial Markets, em Nova York, diz que o atual nível de incerteza política faz com que seja "razoável" ver o dólar entre R$ 4,00 e R$ 4,20. É improvável, no entanto, que a cotação vá para níveis em torno de R$ 5,00, diz ele, já que acima de R$ 4,00 o dólar deve começar a ser percebido como caro e atrair vendedores.