BANCO CENTRAL: há espaço para mais cortes na Selic? (Adriano Machado/Reuters)
Agência O Globo
Publicado em 11 de fevereiro de 2021 às 11h55.
A aprovação pela Câmara dos Deputados, na quarta-feira, do projeto de lei que determina a autonomia do Banco Central (BC) era uma das propostas da lista de prioridades entregue pelo governo ao novo presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), e foi escolhido para sinalizar o apoio do Legislativo à agenda liberal defendida pelo ministro da Economia, Paulo Guedes.
A medida tem como principal objetivo blindar a autoridade monetária de eventuais interferências políticas ao estabelecer, entre outros pontos, mandato fixo para o seu presidente.
O projeto foi aprovado na Câmara por 339 votos a favor, 114 contrários e uma abstenção. Como foi analisado pelo Senado no ano passado, segue para sanção presidencial.
No entanto, segundo analistas, mesmo com a aprovação de sua autonomia, o Banco Central brasileiro não será o Federal Reserve (Fed, o banco central americano), que opera com total independência do governo na condução da política monetária para manter preços estáveis e nível de emprego.
Para eles, a autonomia do BC dá mais segurança ao mercado, pois não vai haver interferência a todo momento na política monetária. O Banco Central do Brasil é o único, entre os países que fixam meta de inflação, cuja diretoria não tem mandato fixo.
- Não acredito que vai ter a mesma liberdade (que o FED). Aqui a instituição sempre esteve sob a tutela do Ministério da Economia. Então não vai ser muito diferente do que temos hoje", disse Sidnei Nehme, economista e diretor executivo da NGO corretora de câmbio.
O mandato fixo do presidente da instituição em quatro anos evita que haja coincidência com o presidente eleito do país, impedindo que possa haver controle direto sobre a política econômica, observa Nehme.
- O mandato definido é ideal para não dar a impressão de subordinação ao governo. Mas trata-se de uma situação nova e será um desafio na prática. Como o presidente do BC vai enfrentar o ministro da Economia e o presidente da República em suas decisões? Será um processo de adaptação - disse o especialista.
Segundo ele, o BC autônomo terá, além da inflação, o foco mais fechado também no nível de emprego.
Fabrizio Velloni, economista-chefe da Frente Corretora de câmbio, observa que atualmente o governo coloca na presidência do BC pessoas com o mesmo alinhamento político-econômico.
- Um presidente do BC que não seja alinhado com o governo pode gerar algum tipo de atrito, aumentando a incerteza do mercado de como serão as políticas econômicas - afirma Velloni.
Ele observa que a indicação de um presidente com perfil técnico poderia reduzir esse risco.
- É difícil encaixar um BC autônomo num país com o nosso sistema político, que prevê indicações de cargos. Então, o processo de escolha do presidente do BC autônomo também pode se tornar mais um ponto de incerteza para o mercado financeiro - pondera Velloni.
Mesmo assim, ele avalia que um BC independente ganha poder para tentar reduzir tentativas de influência política na instituição.
A economista Juliana Inahz, professora do Insper, afirma que a atuação do BC muda pouco com a aprovação de sua autonomia. Para ela, as pessoas confundem autonomia com independência.
- A autoridade monetária já tem certa autonomia para tomar decisões de política monetária. A autonomia não significa que o presidente do BC fará o que quer. A diferença é que o texto joga para o BC a responsabilidade das políticas de pleno emprego. O BC pelas condições de política monetária controla a inflação. E o emprego deve ser consequência dessa boa política monetária - afirma Inhaz.
Para ela, a desvinculação formal do BC da Presidência da República dá ao mercado o sinal de que interferências políticas não vão acontecer, o que reduz incertezas. A professora do Insper afirma que a atual gestão do BC já fez avanços importantes em tornar o sistema financeiro menos concentrado e este pode ser o caminho da transição daqui para a frente.
- Este é um caminho para um BC autônomo, com um certo frescor de independência. Isso pode significar taxas de juros mais baixas para o consumidor e ampliação da oferta de crédito no futuro.