Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central: "O alívio nas condições financeiras internacionais tem se mostrado uma janela de oportunidade para países que seguem o caminho das reformas" (Ueslei Marcelino/Reuters)
Reuters
Publicado em 27 de agosto de 2019 às 11h27.
Última atualização em 27 de agosto de 2019 às 14h48.
São Paulo — O Banco Central estima que o Produto Interno Bruto (PIB) tenha ficado estável ou crescido ligeiramente no segundo trimestre, reiterou o presidente da autarquia, Roberto Campos Neto, nesta terça-feira, acrescentando que a expectativa é de "alguma aceleração" nos trimestres seguintes.
Em audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, Campos Neto disse que nos próximos trimestres o crescimento deve acelerar, puxado pela liberação do FGTS e PIS-PASEP.
"Com base nos dados disponíveis, estimamos que o PIB tenha ficado estável ou crescido ligeiramente. Para os trimestres seguintes, esperamos alguma aceleração, que deve ser reforçada pelo efeito da liberação de recursos do FGTS e PIS-Pasep", afirmou.
O resultado oficial do PIB do segundo trimestre, que será divulgado na próxima quinta-feira (29) pelo IBGE, é aguardado porque ele deve definir se o país entrou em recessão técnica, se vier com valor negativo. O termo é utilizado para enquadrar uma economia que esteja a dois trimestres seguidos com encolhimento do PIB.
De janeiro a março de 2018, a economia brasileira recuou 0,2%, comparada ao quarto trimestre de 2018.
Para o segundo trimestre, o monitor do PIB da FGV indica um crescimento de 0,2%. Mesmo que o resultado seja positivo, é possível que o crescimento no primeiro semestre feche com um valor estável.
Aos senadores, Campos Neto afirmou também que o grau de risco da economia brasileira percebido por agentes de mercado já é compatível com uma melhoria da nota do país pelas agências de avaliação de risco.
Campos Neto defendeu a continuidade de reformas na economia brasileira. "Em um contexto de pouco espaço fiscal para investimentos públicos, reiteramos a importância da continuidade do processo de reformas e ajustes que gerem sustentabilidade da trajetória fiscal futura. Ao reduzirem incertezas fundamentais sobre a economia brasileira, as reformas tendem a estimular o investimento privado", destacou.
Ele acrescentou que "uma retomada mais robusta da economia depende também da agenda microeconômica, que inclui iniciativas que visam ao aumento de produtividade, ganhos de eficiência, maior flexibilidade da economia e melhoria do ambiente de negócios".
Segundo Campos Neto, a consolidação da inflação em torno da meta definida pelo Conselho Monetário Nacional e a ancoragem das expectativas de inflação têm permitido a redução consistente da taxa de juros. Ele lembrou que a taxa básica de juros, a Selic, que estava em 14,25% ao ano em outubro de 2016, está atualmente em 6% ao ano.
Campos Neto disse ainda que o nível de ociosidade elevado da produção no país pode continuar reduzindo as expectativas de inflação. "Por outro lado, uma eventual frustração das expectativas sobre a continuidade das reformas pode afetar prêmios de risco e elevar a trajetória da inflação."
"A consolidação do cenário benigno para a inflação prospectiva deverá permitir ajuste adicional no grau de estímulo monetário [redução da taxa Selic]. É fundamental enfatizar que a comunicação não restringe a próxima decisão do Copom [Comitê de Política Monetária] e que os próximos passos da política monetária continuarão dependendo da evolução da atividade econômica, do balanço de riscos e das projeções e expectativas de inflação", destacou.
O presidente do Banco Central também disse que as expectativas de retomada da economia têm se refletido no mercado de crédito e no mercado de capitais. Ele reforçou a necessidade de ações focadas no crédito imobiliário e no financiamento à infraestrutura.
Campos Neto voltou a listar medidas no crédito de imóveis como aumentar o alcance das ferramentas de securitização; viabilizar a expansão do mercado de home equity, desmobilizando um amplo estoque de capital para dinamizar a atividade econômica; e também criar ferramentas adequadas de hipoteca reversa.
No financiamento à infraestrutura, ele citou a necessidade de reformar o marco legal, buscando reduzir seu risco jurídico; fomentar o desenvolvimento de um mercado privado de hedge cambial de longo prazo; e garantir acesso do capital privado a projetos de saneamento, para reduzirmos o déficit do setor.
O presidente do BC voltou a dizer ainda que a instituição está empenhada na busca por soluções que levem a reduções adicionais do custo do crédito. Ele repetiu que a inadimplência é o fator que responde pela maior parcela do spread bancário, respondendo por 37% do total.
"O que buscamos é fomentar um ambiente competitivo, transparente e que produza como resultado crédito mais barato, abundante e consumido de forma sustentável", afirmou Campos Neto. "O Banco Central tem estudado em mais detalhes as linhas emergenciais, como o rotativo do cartão de crédito e o cheque especial. A educação financeira e a transparência do produto são peças chave para tratar desse problema.", repetiu.
Campos Neto também voltou a citar avanços na competição no setor de cartões de crédito. "Continuamos avançando tanto no diagnóstico quanto na formulação de soluções para as ineficiências do mercado de crédito no Brasil, tarefa na qual conto com o apoio desta Comissão", completou.
Campos Neto disse ainda que não existe nenhuma intenção de que a Unidade de Inteligência Financeira (UIF) - que substituirá o antigo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) - tenha apenas funcionários do BC ou de fora do governo.
"É preciso um conjunto de pessoas de diferentes origens para se realizar os relatórios de inteligência financeira", em audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado.
Ele repetiu que a ideia de abrir o Coaf para pessoas de fora do governo foi dele, com o objetivo de trazer quadros de tecnologia. "A intenção não e politizar o Coaf, pelo contrário, é deixa-lo mais técnico", completou.
O presidente do Banco Central repetiu que a ideia do ministro da Economia, Paulo Guedes, ao colocar a UIF no BC foi blindar o órgão. "Grande parte dos procedimentos realizados pelo Coaf foram criados pelo BC. Então o BC conhece bem o tema e tem funcionários a bastante tempo no Coaf", respondeu.
Ainda sobre a citação da ideia dele de abrir a UIF para pessoas de fora do governo, ele comentou: "Talvez a redação da MP não tenha sido a ideal, mas eu queria trazer pessoas de tecnologia."
E completou: "O governo inclusive foi contra. A ideia foi minha. Não tem nada a ver a possibilidade de indicações políticas, atém mesmo porque eu não tenho capacidade de fazer indicações políticas."
O presidente do BC esclareceu ainda que o regulamento do Grupo de Ação Financeira Internacional (Gafi) não obriga o Coaf a estar abaixo de um ou outro órgão específico. "O Gafi diz que Coaf tem que ter a maior autonomia possível", concluiu.
(Com Reuters e Estadão Conteúdo)