O principal fator por trás dessa retração é o aumento do preço final dos veículos, estimado entre US$ 3 mil e US$ 12 mil por unidade (REUTERS/Laurent Dubrule)
Repórter
Publicado em 9 de abril de 2025 às 06h02.
As tarifas de 25% que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, impôs sobre o setor de autopeças e na importação de automóveis podem provocar, no curto prazo, o encolhimento em 1 milhão de veículos, passando de 15,9 milhões para 14,9 milhões o total de automóveis vendidos ao ano, indica a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea).
O principal fator por trás dessa retração é o aumento do preço final dos veículos, estimado entre US$ 3 mil e US$ 12 mil por unidade. Márcio de Lima Leite, presidente da Anfavea que deixa o cargo no dia 15 de março, explica que com a elevação das tarifas de importação na área o custo de produção sobe e é repassado ao consumidor.
Além da queda nas vendas, a Anfavea projeta redução no nível de emprego e na produção local. "Ainda é cedo pra dizer se isso vai acontecer também no mundo ou só nos Estados Unidos. Mas há um estudo, ainda em andamento, que aponta que o crescimento que iria ocorrer de 4% no mercado mundial não será mais [nesse patamar]. Mas de quanto será? Ainda é cedo para poder dizer", afirmou Leite na divulgação do levantamento nesta terça-feira, 8.
O tarifaço de Trump no setor também deve ter um efeito direto na transição da frota para veículos eletrificados.
Como boa parte da tecnologia e dos componentes para carros e ônibus elétricos, por exemplo, é importada, a imposição de tarifas entre 25% e, em alguns casos de 50% sobre esses itens, encarece ainda mais a produção e freia o avanço desse segmento, de acordo com a associação representantes da montadoras.
O presidente da Anfavea também destaca que o governo norte-americano retirou estímulos fiscais e financeiros de US$ 7,5 mil por carro elétrico comprado e reduziu investimentos em infraestrutura voltada à mobilidade elétrica.
A perspectiva, segundo a entidade, é que os Estados Unidos fiquem para trás na corrida pela eletrificação automotiva, num momento em que outros países intensificam seus investimentos e políticas públicas na área.
No médio prazo, as tarifas também devem provocar um redirecionamento de investimentos pelo mundo, criando capacidade ociosa em outros países produtores, como México, Coreia do Sul e Canadá que exportam principalmente para os EUA.
O levantamento mostra que, em 2024, o México vendeu 3,2 milhões de veículos ao país. Embora aparentemente pequeno, o número representa 76% da produção mexicana. "A indústria automotiva do México é uma indústria que destina à exportação para os Estados Unidos. E isso terá uma redução que vai impactar os principais mercados da América Latina", afirma Leite.
O Canadá exportou 900 mil unidades para os EUA, o que representa 69% da produção local. Já a Coreia do Sul produziu no ano passado 1,6 milhão de unidades, 38% de sua capacidade. Apesar desses serem as nações mais impactadas pelo tarifaço – a China pouco exporta nesse setor para os EUA –, o presidente da Anfavea chama atenção para os efeitos indiretos que as tarifas terão sobre outros países.
Um dos principais pontos de atenção é o México, que tende a se beneficiar com a necessidade das montadoras de investir mais nos EUA. Isso pode gerar capacidade ociosa nas fábricas mexicanas — atualmente são 37 plantas automotivas e mais de mil fabricantes de autopeças —, que poderá ser usada para abastecer outros mercados, incluindo o Mercosul, com quem o México mantém acordo de livre comércio.
Por essa lógica, a associação projeta que o mercado latino-americano, em especial o Brasil, poderá enfrentar maior concorrência dos produtos mexicanos – que têm livre comércio com o país e menor custo de produção.
"Quando um executivo brasileiro for negociar com a matriz global investimentos para o Brasil, ele vai ter que fazer um esforço muito maior para convencer os acionistas. Eles vão questionar: por que investir no Brasil se há capacidade ociosa em outros países?", afirma Leite.
Apesar disso, a entidade avalia que o Brasil pode se beneficiar se souber aproveitar o momento para ampliar suas exportações. "Existem também oportunidades. O Brasil tem que se valer desse momento para aumentar suas exportações", diz a Anfavea.
As distorções criadas pelas tarifas impactam ainda a cadeia global do setor automotivo. Entre os efeitos esperados estão a queda da demanda mundial, o redirecionamento das exportações para outros mercados, o aumento da capacidade ociosa no mundo e uma crescente falta de previsibilidade, o que dificulta a tomada de decisão sobre novos investimentos.