Gado em uma fazenda em Barretos: setor depende de um bom regime de chuvas para recuperar as pastagens (Dado Galdieri/Bloomberg)
Da Redação
Publicado em 7 de fevereiro de 2014 às 15h50.
São Paulo - O tempo quente e seco na maior parte do Brasil inviabiliza a recuperação de pastagens e a oferta de bovinos para abate, elevando o valor da arroba ao maior nível em mais de três anos, em movimento que trará reflexos em toda a cadeia ao longo deste ano, avaliaram especialistas.
Sem pastagens adequadas, os animais poderão ser abatidos abaixo do peso ideal ou mantidos por mais tempo no campo, implicando em custos maiores ou perdas de rentabilidade.
No Brasil, maior exportador de carne bovina do mundo, 70 por cento do gado é criado no pasto, e o setor depende de um bom regime de chuvas para recuperar as pastagens.
"A quantidade de água que caiu e o calor foi tão intenso que houve um déficit hídrico no solo neste período. Isso é totalmente atípico, e se torna mais drástico porque tem muita gente enfrentando dificuldade para alimentar os animais", disse o professor da Esalq/USP (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz), Sérgio de Zen, referindo-se à busca por ração.
Os preços da arroba vêm sendo sustentados desde o final do ano passado, devido à irregularidade das chuvas. Um janeiro quente e com precipitações abaixo da média histórica colaborou para impulsionar ainda mais as cotações.
O indicador Cepea/Esalq do boi gordo encerrou a quinta-feira a 116,08 reais, no maior valor desde novembro de 2010 (nominal), um preço alto para esta época que deve ter impacto no desempenho dos grandes frigoríficos este ano.
"O preço real (da arroba) em janeiro é assustador para esta época. A cada dia que passa a preocupação não é só com o pasto, mas com a água para o animal beber", alertou.
A analista da INTL FCStone, Lygia Pimentel, considera que o valor médio da arroba bovina deve ficar mais alto neste ano, por conta deste atraso nas chuvas, impactando a margem bruta dos frigoríficos.
"A oferta de animais para abate está mais curta, e os frigoríficos já estão pagando mais. Parece que estou na entressafra. Isso é uma coisa rara de acontecer." CONSUMO Para os especialistas, a questão agora será acompanhar a reação do consumidor, porque é isso que vai indicar até que ponto será possível repassar os custos maiores.
O professor da Esalq observou que 75 por cento da produção total de carne bovina fica no mercado interno. Por isso, o preço dependerá em grande parte da situação macroeconômica do país e da relação de preços com outras proteínas.
Tradicionalmente, a carne bovina tem a preferência do consumidor, mas se os preços sobem, ela tende a ser substituída por produtos relativamente mais baratos, como a carne de frango.
A analista da INTL FCStone ressaltou que a inflação em alta e o nível de endividamento do brasileiro também devem influenciar na decisão do consumidor.
"Internamente, o consumo dá sinais de estabilização. E o endividamento está em nível recorde. Isso preocupa", disse.
A inflação brasileira iniciou o ano com desaceleração em janeiro para 0,55 por cento, mas o cenário é de pressão. A carne foi o item que exerceu o maior impacto individual de alta no indicador do mês, uma vez que, segundo o IBGE, a atual falta de chuvas tem prejudicado a produção pecuária.
Do lado externo, o cenário é mais favorável com demanda crescente e perspectiva de novos mercados, além do câmbio que favorece exportações.
A expectativa da associação que reúne os exportadores (Abiec) é bater recorde nas vendas em 2014, com volume de 1,8 milhão de toneladas.
"A demanda externa vai aumentar ainda mais e sustentar o preço. Com a expectativa que a Abiec tem para receita, precisará ter muito mais carne para atender esta expectativa", disse o analista da área de pecuária da Agroconsult, Maurício Nogueira.
O setor exportou 1,5 milhão de toneladas de carne bovina em 2013, alta de quase 20 por cento sobre o ano anterior, e perto do recorde de 2007.