Angela Merkel e Xi Jinping: governo alemão usou pela primeira vez uma lei de 2004 (Axel Schmidt/Reuters)
João Pedro Caleiro
Publicado em 1 de agosto de 2018 às 15h58.
Última atualização em 6 de abril de 2020 às 21h57.
O governo da chanceler Angela Merkel vetou pela primeira vez uma possível aquisição chinesa de uma empresa alemã, sinalizando que o país adota uma postura mais dura em relação aos investimentos da China.
O gabinete de Merkel decidiu em uma votação nesta quarta-feira barrar a potencial compra da fabricante alemã de máquinas-ferramenta Leifeld Metal Spinning por uma investidora chinesa. O governo tomou a medida de precaução, embora a Yantai Taihai Group tenha indicado no último minuto que retiraria sua oferta.
A decisão foi tomada depois que o Ministério da Economia examinou os possíveis impactos negativos da venda e concluiu que uma compra aumentaria as preocupações de segurança nacional. A Leifeld – que tem sede na cidade de Ahlen, no estado Renânia do Norte-Vestfália – é um dos principais produtores de metais de alta resistência para as indústrias automotiva, espacial e nuclear.
"A Leifeld produz máquinas realmente de alto nível", disse Mikko Huotari, vice-diretor do Instituto Mercator de Estudos sobre a China, em Berlim. "A Alemanha está bem ciente da ameaça" apresentada pela meta do país asiático de se tornar líder em manufatura avançada com o programa Made in China 2025.
A Alemanha está se juntando aos EUA e ao Canadá, que já adotaram uma postura mais linha-dura em relação à China. O governo de Merkel liderou iniciativas para levar a cabo a análise de investimentos estrangeiros em toda a União Europeia depois de ter sido alvo de aquisições chinesas nos últimos anos.
Os formuladores de políticas estão preocupados com o fato de a China estar buscando acesso à tecnologia sensível ou querer aumentar sua influência global adquirindo infraestrutura importante, como portos e redes de eletricidade.
Desde que a Alemanha endureceu suas medidas para impedir aquisições indesejadas em julho de 2017, mais de 80 acordos foram sondados, e mais de um terço deles envolviam, de forma direta ou indireta, investidores chineses, disse uma porta-voz do Ministério da Economia. O governo nunca usou a lei para barrar um investimento desde que ela foi estabelecida em 2004.
Como parte da postura mais rigorosa, o governo de Merkel interveio na semana passada para conseguir uma participação em uma das maiores operadoras de rede elétrica do país, frustrando uma tentativa de uma empresa chinesa de comprar a holding. O Ministério da Economia também considera endurecer as regras relativas aos investimentos estrangeiros de fora da UE no país.
O Ministério da Economia alemão estuda reduzir o patamar de análise de aquisições estrangeiras para compras de participações inferiores a 25 por cento. O serviço de inteligência do país afirmou em julho que as aquisições chinesas de empresas de alta tecnologia na Alemanha representam uma ameaça potencial à segurança nacional.
A profundidade da preocupação alemã é evidente na medida tomada pelo governo para impedir a venda de uma empresa relativamente pequena. A Leifeld, de propriedade da holding de um ex-executivo de mídia alemão, teve 33 milhões de euros (US$ 39 milhões) em receita e 5,2 milhões de euros em lucros antes de juros, impostos, depreciação e amortização em 2016, os últimos dados disponíveis no diário federal da Alemanha. Neste ano, a companhia recebeu 13,3 milhões de euros em novos pedidos vindos da China.