Padaria em Caracas: venezuelanos zombaram dado, e o ceticismo é compreensível, dada a pouca credibilidade do regime de Nicolás Maduro no momento. (Wil Riera/Bloomberg)
Ligia Tuon
Publicado em 31 de maio de 2019 às 06h00.
Última atualização em 31 de maio de 2019 às 06h00.
Quando a Venezuela repentinamente despejou anos de dados econômicos não publicados no site do banco central do país na noite de terça-feira, a tendência mais evidente observada foi a desaceleração da hiperinflação este ano.
Os venezuelanos zombaram imediatamente do dado, e o ceticismo é compreensível, dada a pouca credibilidade do regime de Nicolás Maduro no momento.
Mas o mais curioso é que o relatório do banco central parece estar certo sobre os dados gerais: a inflação está desacelerando. Não é só o índice Bloomberg Cafe Con Leche que mostra isso - a taxa anual caiu para 99.900% de 224.900% no fim do ano passado -, mas também o mercado de câmbio, onde o ritmo de desvalorização do bolívar em relação ao dólar diminuiu acentuadamente.
Economistas do mercado doméstico que acompanham a inflação venezuelana de perto dizem que o regime de Maduro, em grande parte, levou a essa desaceleração, forçando bancos a depositarem enormes quantidades de dinheiro no banco central. Isso impediu credores de conceder empréstimos a pessoas que normalmente usam o dinheiro para comprar dólares no mercado negro e, no processo, aumentam a espiral hiperinflacionária.
"A brutal restrição monetária, na verdade, moderou a inflação", disse Omar Zambrano, um economista de Caracas que presta serviços de consultoria.
Quase ninguém previa que isso pudesse acontecer na Venezuela este ano. A maioria das previsões, na verdade, apontava para uma aceleração estratosférica da inflação, marcando o sexto ano de colapso econômico. A previsão do Fundo Monetário Internacional, por exemplo, indica que o índice deve atingir 10.000.000% até dezembro. A Fitch Ratings tem a mesma projeção.
O que levou o governo a divulgar vários anos de dados na terça-feira ainda é um mistério. Existem teorias - como a ideia de que o movimento é uma tentativa das autoridades de evitar as sanções do FMI -, mas o governo não disse uma palavra sobre o assunto. Há alguns anos Maduro começou a interromper gradualmente a publicação de dados quando a economia despencou depois do colapso do petróleo, principal produto de exportação do país.
Os novos dados do governo colocam o índice mensal de inflação em 34% em abril, em relação à alta de 197% em janeiro. Os dados também mostram que a economia encolheu por 19 trimestres consecutivos. No terceiro trimestre do ano passado, o último período com dados disponíveis antes do relatório da terça-feira, o PIB havia encolhido a uma impressionante taxa de 23%, tendência que provavelmente só deve ter piorado desde então.