. (AndreyPopov/Thinkstock)
Redação Exame
Publicado em 22 de fevereiro de 2025 às 06h01.
Por José Eustáquio Diniz Alves*
O Brasil está passando por um profundo e rápido processo de mudança da sua estrutura etária. A sociedade brasileira teve uma base populacional rejuvenescida durante cerca de 500 anos. Mas a dinâmica demográfica já está mudando e terá uma inversão completa ao longo do século XXI, como mostrei no artigo “Os desafios e oportunidades do envelhecimento populacional brasileiro”, publicado aqui na EXAME.
No passado, a grande maioria da população brasileira tinha menos de 50 anos de idade, mas, em um futuro não muito distante, o conjunto das diversas gerações prateadas (50+) serão maioria da população. Na segunda metade do século XX, o Brasil tinha uma oferta quase ilimitada de mão-de-obra jovem, o que possibilitou o aproveitamento parcial do 1º bônus demográfico.
De fato, como mostra o gráfico abaixo, com dados da Divisão de População da ONU (revisão 2024), a população brasileira de 0-49 anos era de 48,6 milhões de pessoas em 1950 e subiu até o pico de 155,4 milhões em 2015, mais do que triplicando em 65 anos.
Porém, a população de 0-49 anos já está decrescendo (atingiu 152 milhões de pessoas em 2025) e deve ser reduzida por cerca da metade do valor máximo da série, ou seja, caindo para 78,4 milhões de pessoas em 2100.
Desta forma, atualmente, o Brasil vive a dupla realidade de uma diminuição absoluta da quantidade de “jovens” (com menos de 50 anos) e um crescimento acelerado, absoluto e relativo da população “idosa” (50+).
O número total de pessoas com 50 anos e mais de idade era de 4,8 milhões de pessoas em 1950, alcançou 26,3 milhões no ano 2000, chegou a 60,7 milhões de pessoas em 2025, deve atingir o pico de 98,8 milhões em 2067 e, acompanhando a tendência do total da população brasileira, deve apresentar uma redução para 85 milhões de pessoas em 2100.
Considerando os 150 anos entre 1950 e 2100, a população total do Brasil deve crescer 3,1 vezes, a população de 0-49 anos deve crescer 1,6 vezes — e a população de 50 anos e mais de idade deve crescer impressionantes 17,6 vezes, com destaque para os grupos mais idosos. O Brasil passa não só por um processo de envelhecimento, mas também por um envelhecimento do envelhecimento.
A população de 50-59 anos era de 2,7 milhões de pessoas em 1950 e deve atingir 19,8 milhões em 2100, um aumento de 7,3 vezes.
No mesmo período, a população de 60-69 anos era de 1,4 milhões e deve atingir 20,7 milhões, um crescimento de 14,8 vezes.
A população de 70-79 anos era de 541 mil pessoas e deve chegar a 20,5 milhões, um crescimento de 37,8 vezes.
E a população de 80 anos e mais de idade era de somente 184 mil pessoas em 1950 e deve chegar a 23,9 milhões de pessoas em 2100, um crescimento de estonteantes 131 vezes.
O gráfico abaixo, também com dados da Divisão de População da ONU, mostra que o grupo etário 0-49 anos representava mais de 90% da população brasileira entre 1950 e 1970, mas diminuiu nas últimas décadas, chegou a 71% em 2025 e deve ficar abaixo de 50% nos últimos 25 anos do século XXI.
Em rota inversa o grupo etário de 50 anos e mais de idade representava menos de 10% da população brasileira entre 1950 e 1970, subiu para 29% em 2025 e deve ultrapassar 50% a partir da década de 2070.
A análise da mudança da estrutura etária brasileira indica que a economia brasileira, progressivamente, passará a contar cada vez mais com a produção e o consumo da população de 50 anos e mais de idade. A combinação de uma população mais madura e mais escolarizada possibilitará o aproveitamento do 2º bônus demográfico (ou bônus da produtividade).
O aumento da proporção da população do topo da pirâmide etária e o aumento da idade média da força de trabalho indicam que o progresso do Brasil dependerá cada vez mais do aporte das gerações prateadas para o aproveitamento de um 3º bônus demográfico, também chamado de dividendo da longevidade.
A economia prateada – que ganha crescente relevância nos países avançados na transição demográfica – consiste no desenvolvimento de um sistema de produção e consumo no qual pessoas com 50 anos ou mais se inserem no mercado de trabalho, colaboram com o sistema produtivo, se envolvem em projetos inovadores, impulsionam o desenvolvimento socioeconômico e ampliam os mercados de trabalho e consumo.
Essa economia é vista como uma oportunidade crescente para a iniciativa privada e para o avanço das políticas públicas, uma vez que uma população mais longeva tende a possuir maior experiência, poder aquisitivo e demanda por produtos e serviços que atendam às suas necessidades específicas.
Simultaneamente, a economia prateada representa uma chance de conectar diferentes gerações, reduzindo o isolamento e a solidão entre os idosos, além de aumentar as oportunidades de diversidade etária e de maior intergeracionalidade nas organizações econômicas e sociais.
Ao promover um envelhecimento saudável e múltiplas conexões sociais, livres de discriminação etária, o Brasil poderá contar com um contingente significativo de pessoas maduras, capazes de construir uma velhice ativa, inovadora, produtiva e colaborativa. Isso, de forma plena, contribuirá para o bem-estar de toda a população, em um ambiente de solidariedade intergeracional.
*Doutor em demografia e diretor da Decifra consultoria em Demografia