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Inovações e parcerias que vêm melhorando o País

O Brasil dispõe de uma base legal bem consolidada em parcerias público-privadas. O momento que o país vive é de diversificação na área de parcerias

Porto Digital, no Recife: reconhecido como o mais importante parque tecnológico urbano do país (WikimediaCommons/Américo Nunes/Wikimedia Commons)
Porto Digital, no Recife: reconhecido como o mais importante parque tecnológico urbano do país (WikimediaCommons/Américo Nunes/Wikimedia Commons)

Por Regina Esteves e Fernando Schuler

Geraldo é aposentado, morador do Recife, tem pouco mais de 70 anos e deseja muito manter uma vida ativa. Ele não tem recursos para pagar uma academia, mas a verdade é que isso não é um problema. Em uma manhã qualquer, ele entra no aplicativo da “Academias Recife” e agenda uma aula. Sem custo algum. Simples assim. Escolhe o horário, a modalidade e a academia que deseja frequentar, dentre as 27 opções disponíveis. Ele terá um professor ou professora à sua disposição e a chance de um novo estilo de vida.

Este é apenas um exemplo. A Prefeitura do Recife gerencia o seu programa de academias sem aumentar o tamanho da máquina pública. Há uma Organização Social contratada para gerenciar o projeto, via um contrato de gestão, com metas bem definidas e um contrato com remuneração variável.

A Organização, inteiramente privada, tem incentivos para buscar parcerias com empresas, oferecer uma carteira com descontos para os usuários das academias, criar novos cursos e atividades. A prefeitura, por seu turno, pode monitorar a atividade física dos usuários e verificar o impacto que a atividade física tem na saúde pública. Uma vida mais ativa melhora a saúde dos cidadãos e ajuda a desafogar o sistema de saúde. Além, é claro, de melhorar a qualidade de vida das pessoas.

Do Recife podemos ir até mais ao sul, em Porto Alegre. Lá encontramos a Isabel, uma aluna do ensino fundamental, residente em um bairro periférico da região sul da cidade. Sem custo algum, ela tem a chance de estudar em uma escola com a metodologia Lumiar. A escola é inteiramente privada, há um professor e um assistente em cada sala de aula, e o ensino se dá por meio de projetos, uma metodologia inovadora, com forte envolvimento dos alunos.

As escolas Lumiar foram criadas por Ricardo Semler no início dos anos 2000, a partir de uma intensa discussão sobre como romper com o modo tradicional de ensino, pautado pela hierarquia e pelo primado do conteúdo abstrato e descontextualizado, que acaba por engajar muito pouco o aluno. São escolas, em regra, apenas acessíveis a quem pode pagar uma mensalidade de valor elevado no mercado privado. É exatamente aí que surge o modelo contratualizado.

A Prefeitura de Porto Alegre criou uma parceria tripartite. Utilizando a Lei 13.019/14, estabeleceu um termo de fomento com uma organização civil com larga experiência e credibilidade em Porto Alegre e o Instituto Lumiar. Dessa forma, Isabel e muitos alunos da rede pública do município agora têm acesso a uma escola antes apenas disponível a seus pares de classe média e maior renda. E isto no ensino fundamental regular.

Amanda e Pedro estudam engenharia da computação na Universidade e estão desenvolvendo uma startup na área da inteligência artificial. Seu projeto integra uma das incubadoras empresariais do Porto Digital, em Recife, hoje reconhecido como o mais importante parque tecnológico urbano do país.

Na incubadora, eles têm acesso a instalações, mentorias, treinamento e outras facilidades. Mas o mais importante é integrar o ecossistema que envolve o Porto Digital. Uma iniciativa que já completou duas décadas foi responsável pela revitalização de uma parte relevante do centro do Recife e hoje abriga perto de 415 empresas e 18,5 mil colaboradores. No ano passado, o faturamento do parque cresceu 14%, com uma receita agregada de R$ 5,4 bilhões.

Movimento grassroots

Tudo isso viabilizado por um contrato de gestão entre o poder público e uma Organização Social especializada, que faz a gestão do parque. Com um detalhe: já há alguns anos, o projeto é autossustentável. Isto é, o contrato de gestão não demanda aportes orçamentários por parte do poder público. O próprio giro econômico produzido pelas empresas, bem como um amplo leque de parcerias, garante a viabilidade do projeto. No futuro, é perfeitamente possível que Amanda e Pedro tenham o mesmo sucesso que vem tendo empresas como a Neurotech, uma das tantas empresas de alta tecnologia e de sucesso nascidas no Recife e cujo desenvolvimento é estreitamente associado ao ecossistema criado pelo Porto Digital.

Os exemplos são muitos. Os gestores públicos devem estar atentos. 2024 é um ano para se pensar no desenvolvimento sustentável das cidades, e é este o foco da nova edição do Mapa da Contratualização, em sua terceira edição. Um projeto de pesquisa desenvolvido já há três anos pela Comunitas. São projetos em onze diferentes áreas, desde a gestão de unidades prisionais até o setor de energias renováveis e tratamento de resíduos sólidos.

Com um foco bastante claro: compreender como o setor público e o setor privado podem colaborar produzindo soluções inovadoras para melhorar a vida das pessoas em nossas cidades. Com este foco, selecionamos treze projetos exemplares. Em todos eles, o governo atua como regulador, deixando o setor privado, com ou sem fins lucrativos, fazer a gestão na ponta.

Trata-se de um processo de especialização: o governo faz o que sabe fazer melhor, isto é, definir prioridades, fazer o planejamento estratégico da cidade, estruturar contratos e supervisionar o cumprimento de metas pré-definidas; deixando as empresas e organizações da sociedade civil realizarem a gestão, com menos burocracia e maior capacidade de investimento, na ponta.

O Brasil é hoje um país que dispõe de uma base legal bem consolidada na área de parcerias público-privadas. Temos a Lei das Concessões, a Lei das PPPs, as leis de Organizações Sociais e o Marco Regulatório da Sociedade Civil, de 2014. O momento que o país vive é de diversificação na área de parcerias. O trabalho com com idosos, a gestão de parques ambientais, escolas e uma ampla gama de serviços urbanos.

É um movimento grassroots, isto é, que nasce da própria experiência dos gestores públicos, nas cidades e nos Estados brasileiros, buscando resolver problemas bastante práticos, na vida dos cidadãos. É um lado positivo da experiência brasileira, que não pertence a este ou aquele partido, nem a esta ou aquela ideologia. E mesmo por isso, merece ser conhecido e estudado, pela sociedade.