Análise: Resposta do governo à queda de aprovação de Lula dita dimensão do "Risco Brasil"
OPINIÃO | Pressionado por números negativos de pesquisas, Planalto ensaia medidas controversas para reverter tendência
Publicado em 15 de março de 2024 às, 13h49.
Última atualização em 15 de março de 2024 às, 13h52.
É consenso: todas as pesquisas realizadas após o Carnaval mostram queda nos índices de aprovação do governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Ainda que o presidente detenha o apoio de pouco mais da metade da população, quadro semelhante ao das urnas de 2022, a consolidação da polarização política deixa o petista distante dos números exuberantes da sua primeira passagem pelo Planalto, quando deixou o posto com mais de 80% de respaldo popular.
A conduta de Lula diante dos obstáculos para reverter a sólida oposição nas ruas e no Congresso, tendo em vista o processo sucessório de 2026, se transformou no principal risco monitorado por agentes financeiros e segmentos graúdos do empresariado.
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O percurso para a recuperação de respaldo da população passa por entraves internos da máquina administrativa, mas também depende da renovação do pacto de governabilidade com os poderes, vencida a etapa de “defesa das instituições” diante de investidas golpistas.
Se no Supremo Tribunal Federal existe um formidável colchão de boa vontade com o governo, em especial na seara econômica, o outro lado da Praça dos Três Poderes está menos alinhado à agenda lulista.
Como é habitual em momentos de queda na avaliação positiva do Executivo, a primeira trincheira a ser enfrentada é a do Congresso Nacional. De maioria de centro-direita, o Legislativo tradicionalmente se ancora em turbulências no Planalto para apresentar demandas represadas e valorizar seu cacife.
É nesse contexto que renasce em Brasília o debate sobre a necessidade de uma reforma ministerial que contemple os partidos da base centrista mais pragmática, liderada pelo presidente da Câmara, Arthur Lira.
Com o calendário espremido pelas eleições municipais de outubro e a agenda legislativa menos ambiciosa do Executivo, a ocupação de posições com acesso ao Orçamento na Esplanada dos Ministérios passa a ser um ativo de relevo para as bases territoriais dos parlamentares.
Lula, contudo, não gostaria de mexer agora no primeiro escalão, pois vem planejando postergar mudanças no atacado para a segunda metade do mandato, sobretudo com a definição do substituto de Lira no comando da Mesa, que só ocorrerá em fevereiro de 2025.
Interlocutores do presidente discordam por entender que o ambiente político na volta dos trabalhos legislativos piorou bastante juntamente com o humor do eleitoral, impondo já na largada derrotas ao PT e siglas satélites — como no caso das comissões da Câmara e a recente aprovação da PEC das drogas no Senado —, acendendo o alerta para recomposição da base governista.
Ordem unida
Em outra frente, Lula encomendou aos seus auxiliares diretos que tirem da gaveta com urgência programas de apelo popular que possam projetar uma agenda positiva de curto prazo.
A estratégia para conter a depreciação de sua imagem no eleitorado lulista envolve bancos e empresas ligadas ao governo —o que remete ao intervencionismo estatal temido por fatia substantiva do mercado financeiro.
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Sem espaço orçamentário para incrementar gastos imediatamente, o Planalto monitora com cautela os fundamentos econômicos que estariam colaborando para a perda de apoio presidencial.
Depois que o preço dos alimentos entrou no radar de preocupações, aliados de Lula esboçam no núcleo-duro do governo uma força-tarefa para reconstruir pontes com o agronegócio, segmento que puxou o PIB do ano passado, mas não deve repetir o desempenho neste ano.
Ainda que exista desconforto pontual, a economia, na visão dos assessores mais influentes do presidente, não tende a oferecer risco expressivo à sua aceitação popular no transcorrer de 2024, sobretudo em razão do aquecimento da atividade em patamares um pouco superiores aos previstos.
O que se debate no governo, como trunfo para eventual solavanco, é uma antecipação de instrumentos indutores do crescimento que vinham sendo preservados para a reta final da gestão — e que também causam paúra no sistema financeiro.
A adoção de aditivos econômicos reforçará o antagonismo entre o QG político do Planalto e a equipe de Fernando Haddad, refratária a fórmulas que afetem a percepção de risco fiscal e tornem mais inseguro o ambiente para investimentos.
O ministro da Fazenda tem se empenhado em criar vínculos com os grãopetistas que gravitam no entorno de Lula e chegou a comparecer ao jantar oferecido pelo ex-ministro da Casa Civil José Dirceu na última quarta-feira na capital federal.
No episódio da queda-de-braço pelos dividendos da Petrobras, Haddad também endossou o discurso lulista do papel social da empresa e do ativismo da União no controle da estatal petrolífera.
Nos bastidores, contudo, Haddad não demonstra o mesmo entusiasmo político do ano passado que o consagrou como “superministro” e faz chegar ao presidente que deseja cumprir um papel mais estratégico na organização da agenda político-eleitoral para 2026.
Onde mora o perigo
Popularidade é um tema caro a Lula, mas o pânico alardeado com a recente queda de aprovação do mandato pode estar superdimensionado. Ao mesmo tempo em que a oposição se mostra sólida e com forte presença no debate público, também os apoiadores do governo têm exibido consistência e capacidade de reação política até agora. Se a economia não produzir notícias negativas além do esperado, dificilmente o presidente sofrerá novas e significativas perdas de apoio do eleitorado num ambiente polarizado e histriônico.
Entretanto, os remédios a serem aplicados para tratar uma enfermidade de causas difusas e de diagnóstico complexo podem afetar a saúde do paciente.
Em suma, a depender das medidas que saírem da cartola de Lula para fazer frente à instabilidade aferida pelas pesquisas, a imagem do chefe do Executivo pode piorar. Sempre é bom lembrar que o perigo mora nos detalhes, ou seja, na estreita maioria conquistada pelo presidente no segundo turno. O centro não tem votos para ganhar eleições, mas tem os suficientes para decidi-las.